Confederação Nacional dos Trabalhadores Metalúrgicos

Notícias

Incertezas rondam fábricas da GM à beira do fechamento

Concordata deixa sem perspectivas funcionários de unidades nos EUA a serem fechadas

 

Na cidade de Pontiac, que tem o mesmo nome da marca que será vendida pela GM, funcionários esperavam ser poupados

 

ANDREA MURTA

ENVIADA ESPECIAL A DETROIT

 

Na região de Detroit (Michigan), os números da decadência e do desemprego estão estampados nos rostos dos moradores, os mais diretamente afetados pelo definhamento da indústria automobilística dos Estados Unidos.

 

Na face de Cheryl, 50, a marca é a da incerteza: ela acaba de saber que a linha de montagem da marca Pontiac, da General Motors, em que trabalha há 31 anos e hoje é inspetora de produção, vai ser fechada.

 

Às 8h15 da última segunda- -feira, Cheryl (que não quis dar o sobrenome) foi chamada ao pátio com os mais de mil funcionários da fábrica e informada de que “infelizmente a linha vai ser encerrada em outubro”, segundo relatou à Folha um dia depois.

 

“O silêncio foi aterrador. Até a gerência parecia em choque. Muitos jovens simplesmente começaram a chorar. Os mais velhos ainda têm alguma chance de benefícios, mas as novas gerações estão sem saída e sabem disso. Não há mais empregos por aqui.”

 

O anúncio aos trabalhadores foi feito ao mesmo tempo em que, em Nova York, a GM entrava oficialmente com o pedido de concordata. Apesar dos rumores, Cheryl diz que os funcionários da Pontiac Assembly Center, na cidadezinha de Pontiac, arredores de Detroit, acreditavam que seriam poupados. “Nossos produtos são bons. Não consigo acreditar que nos escolheram para o sacrifício.”

 

Ela conta que nem o sindicato dos trabalhadores do setor foi informado do fechamento antes do anúncio oficial da concordata. A fábrica não discutiu o futuro dos funcionários, dizendo apenas que seu destino ficará mais claro nas próximas semanas. “Parece que querem nos forçar a programas de demissões ou aposentadorias, mas não dá para confiar na estabilidade das pensões no meio de uma concordata.”

 

Para a inspetora, a incerteza sobre como vai sustentar os dois filhos universitários, que cria sozinha, continua. Ela cogitou sair do Estado, mas não consegue vender a casa (o preço médio na região de Detroit caiu para apenas US$ 7.000 neste ano). “Estou presa aqui.”

 

Desemprego recorde

Milhares de funcionários deverão se unir à situação de Cheryl nas próximas semanas. Desde 1998, Michigan perdeu cerca de 600 mil empregos em manufaturas. Em um cenário esperado, as concordatas da GM e da concorrente Chrysler deverão eliminar outros 50 mil postos em breve.

 

A General Motors ainda emprega aproximadamente 9.000 trabalhadores assalariados e pagos por hora apenas nas fábricas de Michigan, mas o efeito vai além. Há fornecedores, serviços de alimentação, habitação e centenas de outros que sobrevivem através dos gastos dos empregados das fábricas de veículos.

 

Para Lawrence Mishels, presidente do Instituto de Políticas Econômicas, “think-tank” de Washington D.C., todo o Estado de Michigan vai ter que se transformar para se adaptar à nova realidade. “Esse processo está em curso há mais de 30 anos. E vai requerer grande assistência governamental para ser bem-sucedido.”

 

Nessas três décadas, o umbigo da indústria automobilística se acostumou a recordes negativos. Entre regiões metropolitanas com mais de 1 milhão de habitantes nos EUA, a área denominada Detroit-Warren-Livonia tinha o maior desemprego geral em março (último dado disponível), de 14% -alta de seis pontos em relação ao ano anterior, segundo o governo.

 

A prefeitura de Detroit, no entanto, já trabalha com estimativas de até 23% de desocupados, e o número crescerá após o fechamento anunciado de, além da Pontiac Assembly, ao menos outras seis fábricas da GM em Michigan.

Entre os trabalhadores da Chrysler, o clima está um pouco melhor. Uma funcionária que conversou com a Folha sob a condição de não ter seu nome revelado disse que, “se não fomos demitidos até agora, devemos estar seguros pelo menos por um ano. Mas todos estão esperando para ver. Cresci num ambiente em que trabalhar para as montadoras significava segurança para toda a vida, mas essa era acabou.”

 

 

Senadores nos EUA criticam GM e Chrysler

COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

 

Com suas empresas em processo de concordata, os presidentes da General Motors e Chrysler enfrentaram ontem críticas dos senadores americanos em audiência na Comissão de Comércio do Senado dos Estados Unidos.

 

Eles defenderam a redução de suas redes de concessionários, consideradas inchadas em relação ao tamanho das operações das montadoras. Mas a medida vai gerar desemprego e aumentar a tensão no setor automotivo no país.

 

Os concessionários são parte importante na política americana, pois são contribuintes de campanhas eleitorais -em 2008, por exemplo, doaram US$ 9 milhões a candidatos federais. Também são grandes empregadores e patrocinadores na área de esporte.

 

Ontem, o presidente da GM, Fritz Henderson, disse que o objetivo da montadora agora é ter “menos concessionários, porém mais fortes”. “Esse é um tempo difícil para todos da família GM.”

 

Já o presidente da Chrysler, James Press, disse que o desempenho fraco na rede de distribuição prejudica a montadora. “Concessionários que têm performance fraca nos levam a perder clientes. Se eles não vendem, nós também não vendemos.”

 

As declarações provocaram reação dos senadores. Para o democrata Jay Rockefeller, presidente da comissão, as montadoras estão abandonando seus clientes e distribuidores.

 

“Não acho que essas companhias deveriam receber ajuda de contribuintes e deixar seus concessionários cada um por si, sem um plano real e sem ajuda”, disse Rockefeller aos executivos.

 

Mais de 2.700 concessionárias devem ser fechadas nos EUA, enquanto a Chrysler tenta se livrar da proteção judicial nos próximos dias. A GM, que formalizou a concordata na segunda, deve emergir como uma nova companhia num prazo previsto para até 90 dias.

 

Os parlamentares argumentam que o fechamento das concessionárias deixará milhares de pessoas desempregadas, enquanto a economia das montadoras com a medida será pouca.

 

“Não é nosso papel mudar sua decisão [das montadoras]”, disse a republicana Kay Bailey Hutchison. “Mas é nosso papel garantir que todos sejam tratados tão bem quanto possível nessas circunstâncias.”

 

Os próprios concessionários expressaram preocupação e fizeram protestos ontem. “Eu cumpri com todas as obrigações colocadas pela Chrysler e GM. [Agora] eles querem que eu feche as portas”, disse Peter Lopez.

 

Com agências internacionais