Confederação Nacional dos Trabalhadores Metalúrgicos

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Na crise, classes D e E terão o maior ganho real na renda

Cibelle Bouças, de São Paulo

As classes D e E terão em 2009 ganho real mais expressivo na massa de rendimentos que as demais classes, aponta estudo realizado pela LCA Consultores. Pelo cálculo, baseado nos dados de renda média real individual relativos a outubro divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), as classes D e E terão em 2009 incremento real de 7,8% – o maior entre as classes e superior em um ponto percentual ao ganho obtido no ano passado.

A classe C terá crescimento menor, de 4,7%, que também é inferior aos 5,5% de aumento real obtidos em 2008. As classes A e B terão o incremento mais baixo, de 3,4%, também abaixo do ganho real obtido no ano passado (4,9%). Na média, a massa real de rendimentos no país terá crescimento de 4,5% em 2009, ante 5,4% em 2008.

A massa real de rendimentos é calculada a partir do número de trabalhadores empregados e do seu ganho mensal. A LCA considerou como parte das classes D e E o trabalhador com ganho mensal médio de R$ 430; para a classe C, renda mensal per capita média de R$ 725 e, para as classes A e B, renda individual de R$ 2.113 ao mês. “As classes D e E têm uma renda muito próxima à do salário mínimo, por isso ela terá crescimento superior ao das demais classes”, afirma o economista responsável pelo estudo, Fábio Romão.

A previsão para este ano é de que o salário mínimo seja reajustado em 12%, para R$ 465, considerando o PIB de 2007 (que cresceu 5,7%) e a inflação acumulada em 12 meses até fevereiro. O aumento acima da inflação é superior ao obtido no ano passado, de 3,6%. Outro ponto favorável é a previsão de inflação de alimentos mais baixa, estimada em 5,5%, contra 11,1% em 2008. “A inflação de alimentos tem impacto mais forte sobre a renda das classes D e E, que comprometem mais o seu ganho mensal com esse grupo de produtos.”

Romão diz ainda que os trabalhadores das classes D e E sofrerão menos o impacto do desaquecimento da economia por se concentrarem nos setores de comércio e serviços, que apresentam uma desaceleração mais suave que os setores da indústria e da construção civil. Já no caso das classes A, B e C, o principal fator responsável pelo menor aumento na renda é a queda no nível do emprego formal, que tem afetado sobretudo o setor industrial. “O emprego industrial é o primeiro a sofrer os efeitos da crise e é o setor que concentra as classes A, B e C em função dos salários mais altos”, observa. Outro segmento em que se situam essas classes é o financeiro, que já vinha reduzindo vagas de trabalho com as fusões e aquisições.

Marcio Pochmann, presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), prevê cenários diferenciados para as regiões. “Regiões agrícolas circunscritas à agricultura familiar não sofrerão tanto os efeitos da crise internacional como as áreas voltadas à agricultura comercial. Regiões que dependem fortemente de previdência e transferência de renda intragovernamental também tendem a ser menos afetadas”, afirma.

Famílias cujos membros trabalham no setor privado também sofrerão impacto mais forte da crise, diz. “Tudo indica que as decisões de investimento de governos no plano do desenvolvimento produtivo não devem ser afetadas. A manutenção do nível de emprego no país ficará mais ligada a decisões de investimento público, principalmente as decorrentes do PAC [Programa de Aceleração do Crescimento]”, afirma. Para Pochmann, se o efeito da crise externa sobre a economia brasileira for apenas um crescimento mais fraco do PIB, ainda assim a expansão do nível de emprego formal não será suficiente para atender ao aumento de pessoas que entram no mercado de trabalho. “Os mais jovens também terão mais dificuldades de se empregar no próximo ano” diz.

No plano regional, Pochmann estima que as regiões Nordeste e Norte terão a renda menos afetada pela crise que as regiões Sudeste, Centro-Oeste e Sul. A maioria das empresas exportadoras, tanto de manufaturados como de commodities, está sediada no centro-sul, por isso a dificuldade de exportar já provoca um processo de cortes de mão-de-obra, diz. “O real desvalorizado vai estimular mais o turismo no país e menos o turismo no exterior, o que também terá um impacto positivo para o Nordeste”, acrescenta.

Queda do consumo pode tirar R$ 200 bi da economia este ano

Sergio Lamucci, de São Paulo

A perda de fôlego do consumo e do investimento em 2009 deve provocar uma queda abrupta na contribuição da demanda doméstica para o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB). Se no ano passado a combinação do consumo das famílias, consumo do governo, investimento e variação de estoques colaborou com quase 8 pontos percentuais para a expansão de cerca de 5,5% da economia, neste ano o número pode cair para o intervalo de 1 a 2 pontos, segundo os analistas mais pessimistas. As previsões para o PIB variam bastante, de um crescimento zero a um avanço próximo a 3%. O governo tem 4% como meta.

Como contrapartida da forte desaceleração da demanda interna, as importações de bens e serviços deverão sofrer um forte abalo, passando de uma alta na casa de 20% no ano passado para o terreno negativo em 2009. Nesse cenário, o setor externo poderá ter contribuição neutra ou levemente positiva para o PIB, o que não ocorre desde 2005 – no ano passado, ele “tirou” de 2,2 a 2,5 pontos do crescimento, de acordo com as estimativas. Isso vai ocorrer não por causa de um cenário favorável para as vendas externas, mas devido à expectativa de um recuo das importações.

Com a contração do crédito, a queda da confiança de empresários e trabalhadores e a perspectiva de piora do mercado de trabalho, uma forte desaceleração da demanda interna neste ano é inevitável, segundo o economista Júlio Callegari, do JP Morgan. Ele estima que a contribuição da demanda doméstica para o PIB ficará em 1,1 ponto percentual em 2009, muito abaixo dos 7,7 pontos esperados para 2008. A projeção de 1,1 ponto significa que uma riqueza de cerca de R$ 200 bilhões deixará de ser gerada em 2009, quando se compara à que seria criada se houvesse uma repetição da colaboração de 7,7 pontos do ano passado, calcula Callegari. “Essa forte desaceleração da demanda interna deverá refletir melhor a ´sensação térmica´ da atividade econômica do que os próprios números do PIB”, afirma ele, que projeta crescimento do PIB de 5,5% em 2008, e 1,5% em 2009.

Para Callegari, o consumo das famílias deve desacelerar de 6,2% em 2008 para 2% neste ano. Um dos grandes problemas é que o impacto da crise global sobre o emprego foi muito abrupto. As demissões já começaram e tendem a aumentar nos próximos meses, diz ele. Condições ruins do mercado de trabalho, somadas à cautela dos bancos na hora de conceder crédito, prenunciam um quadro pouco animador para o consumo das famílias, como lembra o economista Juan Jensen, da Tendências Consultoria Integrada. Ele projeta um crescimento para o consumo das famílias de 2,1% neste ano. A estimativa para o PIB é de uma alta de 2,6%, número em revisão, provavelmente para a casa de 2%.

A formação bruta de capital fixo (FBCF, que mede o investimento na construção civil e em máquinas e equipamentos) deve sofrer uma desaceleração ainda mais significativa. A economista Thaís Marzola Zara, da Rosenberg & Associados, acredita que a taxa de expansão do investimento vai cair de 16,2% em 2008 para 3% em 2009. A contração do crédito e as perspectivas de esfriamento da demanda reduzem o apetite das empresas por investir. Callegari é mais pessimista, acreditando que a FBCF ficará estável em 2009.

Destacando o impacto negativo da crise sobre o mercado de trabalho, Thaís projeta um crescimento do PIB de 1,5% em 2009, número idêntico ao de Callegari. A diferença é que, para ela, a expansão se deverá integralmente à demanda doméstica – o setor externo, para Thaís, terá contribuição zero para o crescimento neste ano, enquanto Callegari acredita que haverá colaboração positiva de 0,4 ponto. Jensen estima que a a diferença entre exportações e importações entrará com 0,1 ponto.

De 2006 a 2008, a contribuição do setor externo para o PIB foi negativa porque as importações cresceram a um volume bem superior ao das importações. Para o ano passado, por exemplo, a estimativa do JP Morgan é de que o volume de compras externas de bens e serviços tenha crescido 18%. No caso das exportações, a aposta é de queda de 1%. Com isso, o setor externo “tirou” 2,2 pontos percentuais do PIB em 2008, estima Callegari. Nas contas da Tendências, o número ficou negativo em 2,5 pontos.

Para 2009, porém, o quadro vai mudar, por conta do impacto da desaceleração da demanda interna sobre as importações. Com menos consumo e menos investimento, deverá haver uma queda das compras de bens e serviços neste ano. Para Callegari, o volume importado vai cair 2,4% em 2009. Jensen acredita que o tombo pode ser até maior, atingindo 5%.

As perspectivas para as exportações, por sua vez, não são positivas, mesmo com a forte desvalorização do câmbio. Com a economia global em recessão, a demanda por produtos brasileiros não será expressiva. Callegari ainda conta com uma alta do volume exportado de 1,2%, um resultado um pouco melhor do que o recuo de 1% esperado para 2008. Jensen é mais pessimista, projetando tombo de 4% das vendas externas. Por preverem que as exportações terão um desempenho um pouco melhor – ou menos pior – que o das importações, esses analistas esperam uma a contribuição neutra ou ligeiramente positiva do setor externo para o crescimento.

Mas há quem veja um cenário diferente, como o economista-chefe da LCA Consultores, Bráulio Borges, que prevê expansão da economia de 2,9% neste ano. Para Borges, a demanda doméstica ainda vai colaborar com 3,9 pontos percentuais para o crescimento do PIB, uma desaceleração expressiva em relação ao ano passado, mas bem acima do projetado por Callegari, por exemplo.

A diferença se deve principalmente à visão de Borges de que o consumo das famílias não vai perder tanto fôlego – ele projeta uma alta de 4,5% para 2009, mais do que o dobro do esperado pelo JP Morgan e pela Tendências. Borges cita vários fatores para justificar sua previsão mais otimista. Ele lembra, em primeiro lugar, que o reajuste médio real do salário mínimo em 2009 será de 6,6%, “o dobro dos 3,3% de 2008”. “Combinado a uma inflação de alimentos bem menos pressionada neste ano, isso deverá dar um gás para o consumo básico nas classes de renda mais baixa.”

Borges ressalta ainda que a política fiscal deverá ser mais expansionista – o superávit primário, por exemplo, deverá cair de 4,2% do PIB em 2008 para 3,3% do PIB em 2009. “Nossas estimativas mostram que a cada 1 ponto percentual de redução do superávit primário incrementa o crescimento do consumo em 0,5 ponto ao longo de um ano.”

Ele cita ainda o fato de que os juros reais de mercado (comparando a taxa privada de um ano com a inflação projetada em 12 meses) está em 6,5%, bem mais baixa do que os 9% a 9,5% registrados entre agosto e meados de novembro. A queda da taxa, que baliza o custo do dinheiro, pode impulsionar a atividade e o consumo, com alguma defasagem. Por fim, prevê que o dólar, hoje na casa de R$ 2,40, cairá para R$ 2,10 no fim do ano. Isso implica o barateamento de vários bens comercializáveis internacionalmente (influenciados diretamente pelo câmbio), como eletroeletrônicos e os produtos de informática. Ele estima que cada 1% de redução da taxa de câmbio gera estímulo de 0,2 ponto percentual no consumo das famílias.

Como espera que a demanda interna, especialmente o consumo, tenha um resultado ainda razoável em 2009, Borges projeta um encolhimento de apenas 0,6% nas importações de bens e serviços. Como acredita que as exportações vão cair 8,2% – um tombo bem maior que o das importações -, o setor externo ainda vai contribuir negativamente para o crescimento, “tirando” 1,1 ponto da expansão do PIB em 2009.