Confederação Nacional dos Trabalhadores Metalúrgicos

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Montadoras terão R$ 4 bi do governo de SP

Nossa Caixa anuncia linha de crédito com valor igual à do Banco do Brasil para ajudar financeiras de fabricantes de veículos

Para montadoras, os R$ 8 bi disponíveis nos bancos públicos paulista e federal devem ser “suficientes para os próximos meses”

TATIANA RESENDE – DA REDAÇÃO

O governo de São Paulo lançou ontem uma linha de crédito de R$ 4 bilhões para as financeiras das montadoras de veículos de todo o país, o mesmo valor anunciado na semana passada pelo governo federal para minimizar os efeitos da crise internacional no setor.

Os empréstimos oferecidos pela Nossa Caixa para as financeiras poderão ser pagos em até 18 meses. As garantias serão as carteiras de crédito dos bancos das montadoras e as taxas de juros, definidas em cada negociação. “Estamos somando esforços com o governo federal no sentido de fornecer crédito para manter o nível de emprego na economia”, afirmou o governador José Serra (PSDB) na assinatura do acordo.

O presidenciável tucano afirmou ainda que o impacto desses recursos no mercado, “sem dúvida, é significativo, basta dizer que é semelhante ao do Banco do Brasil”. Segundo a assessoria de imprensa do banco federal, mais de R$ 1 bilhão já foi liberado até agora para oito financeiras de montadoras.

Para o ministro da Fazenda, Guido Mantega, presente ao evento, para garantir a continuidade do crescimento da economia brasileira, “é preciso que os governos tomem iniciativas como essa”.

A Nossa Caixa e o BB, os dois bancos com linhas especiais para os fabricantes de veículos, estão em processo de negociação. Serra, no entanto, negou que tenha tratado da venda do banco estadual com Mantega.

“Por incrível que pareça, não conversamos. Esse é um assunto que não está concluído”, disse, acrescentando que o projeto de lei que vai permitir a aquisição do banco será enviado à Assembléia Legislativa “assim que se conclua a negociação”, sem estipular prazos.

O governador de São Paulo rechaçou a avaliação de que, com a possível venda do banco estadual, é o governo federal que assumirá o financiamento.

Lembrando que o processo de venda da instituição pode consumir meses, Serra disse que adotaria a medida independentemente da negociação. “A Nossa Caixa não pára pelo fato de existir um processo de negociação”, afirmou, acrescentando que a abertura da linha não provoca prejuízo para o banco.

Recursos suficientes

Para o presidente da Anfavea (associação das montadoras), Jackson Schneider, os R$ 8 bilhões disponíveis nos bancos públicos paulista e federal devem ser “suficientes para os próximos meses”. “Houve retração de crédito em linhas importantes. O consumidor ia à loja, não encontrava o crédito ou não encontrava nas condições que precisava para adquirir o produto”, afirmou.

Em outubro, as vendas de veículos caíram 11% em relação a setembro e tiveram a primeira retração na comparação com o mesmo mês do ano passado, de -2,1%.

O recuo, que gerou férias coletivas de milhares de trabalhadores das montadoras, ocorre após o setor bater sucessivos recordes. No acumulado do ano até outubro, ainda tem alta de 23,4% em emplacamentos, com a marca histórica de 2,45 milhões de unidades. A expectativa de Schneider é que, com o dinheiro extra, “já neste mês comece a haver uma reversão positiva” nos licenciamentos.

Como “os recursos dos bancos privados tendem a se normalizar”, acrescentou, “acreditamos que a falta de liquidez no mercado está superada”.

Segundo o presidente da Anfavea, estão confirmados os investimentos no país de US$ 23 bilhões entre 2008 e 2011 que já haviam sido anunciados pelas montadoras.

Luiz Montenegro, presidente da Anef (associação das financeiras das montadoras), prevê que os R$ 8 bilhões serão tomados pelas empresas até dezembro. Segundo a entidade, neste ano, até setembro, foram liberados R$ 42,4 bilhões em financiamentos (CDC), 11,7% a menos do que no mesmo período de 2007. As operações com leasing totalizaram R$ 64,9 bilhões -alta de 81,3%.

Colaborou CATIA SEABRA, da Reportagem Local

Consumidor devolve carro em revendas

Receio de não arcar com prestação leva clientes às lojas para tentar trocar carro ou entregar veículo para zerar dívida

Associação de revendas de carros usados afirma que 40% dos clientes que procuram lojas têm dívida maior que valor do carro

FÁTIMA FERNANDES – CLAUDIA ROLLI – DA REPORTAGEM LOCAL

O medo de não conseguir pagar a prestação do carro já leva alguns consumidores a procurarem as revendas de usados para fazer a troca por modelos mais baratos com o objetivo de reduzir o valor financiado e mesmo entregar o automóvel para se livrar da dívida.

A procura pela chamada “troca com troco” e a devolução de veículos pelo receio de não conseguir quitar o financiamento foram constatadas pela Folha no comércio de veículos usados em São Paulo e no interior.

“O que vemos hoje é o efeito do erro das concessionárias de vender carro em 80 meses para consumidores totalmente despreparados financeiramente”, afirmou George Chahade, presidente da Associação dos Revendedores de Veículos Automotores do Estado de São Paulo e do Sindicato do Comércio de Veículos Automotores Usados do Estado de São Paulo.

Assim que o carro sai da concessionária, segundo ele, o veículo já perde 15% do seu valor. “Significa que o consumidor que comprou um carro que custa 10, saiu da loja com um carro que vale 8,5 e com uma dívida de 25. Olha o tamanho do problema que vamos ter de enfrentar agora com a crise que atinge o mercado de veículos.”

Os consumidores que procuram as revendas, segundo ele, são aqueles que possuem carros financiados que não estão mais na garantia e precisam de manutenção. E cerca de 40% desses clientes, segundo Chahade, têm dívida maior do que o valor do carro no mercado.

“Só que as revendas não querem hoje esses carros, que se transformaram em um mico para o mercado. Até as financeiras estão evitando pegar esses veículos porque não sabem o que fazer com eles”, diz. A troca com troco só está ocorrendo, segundo ele, no caso de veículos com dívida de no máximo 30% do valor do bem.

A Marrese Veículos, revenda de carros usados da rua do Oratório, em São Paulo, afirma que desde o mês passado recebe de oito a dez clientes por dia com interesse em trocar o carro por modelo mais barato ou simplesmente entregar o veículo para que o restante das prestações seja quitado pela loja.

“É a primeira vez que vejo uma situação como essa”, afirma Victor Marrese, sócio-proprietário da Marrese Veículos, que tem família que atua no mercado de usados há quase 40 anos. A Marrese, que costuma vender até 15 carros por mês, só vendeu um carro do começo de outubro até ontem.

Uma revenda da região de Americana (SP), que preferiu não se identificar, informa que no último mês tem sido procurada por cerca de três clientes por dia que tentam trocar seus veículos financiados por outro mais barato porque não sabem se conseguirão quitar a dívida.

Segundo a loja, o que o cliente mais quer é trocar um carro que tem prestação de R$ 700 por mês por um que tem prestação de R$ 400 por mês ou apenas devolver o veículo.

As revendas informam que a virada no mercado de veículos ocorreu por causa da restrição ao crédito. Os bancos e as financeiras não aceitam mais financiamento sem entrada, que agora chega a ser de, no mínimo, 30% do valor do carro, e também não falam mais em prazos de 80 meses. Além disso, os juros estão mais altos.

Levantamento da associação de revendas de veículos usados mostra que, em setembro, 82% dos negócios do setor foram feitos com uso de financiamento e, em outubro, 49%.

Vinícius Marcus Garcia, dono de uma das lojas Bruno Motors, diz que reduziu os preços dos carros em até R$ 5.000 para não demitir funcionários e contornar a queda nas vendas.

“Meu faturamento neste mês foi negativo em R$ 20 mil. Porque quem estava comprando era o consumidor que não tem holerite e não conseguia comprovar renda”, afirma.

Na tentativa de evitar os prejuízos no mercado de carros usados, 14 shoppings paulistas de veículos vão fazer o primeiro “Liquida Auto-Shopping”, entre a última semana de novembro e a primeira de dezembro, e oferecer descontos e juros diferenciados para atrair clientes. “Negociamos com os bancos descontos para incrementar as vendas que caíram entre 40% e 50%, em média, nos auto-shoppings paulistas”, afirma Karla Arana, presidente da Anauto-SP (associação nacional dos auto-shoppings do Estado de São Paulo) e administradora do Auto-Shopping Anhaia Mello.

Para Octavio Vallejo, presidente do Sincodiv-SP (Sindicato dos Concessionários e Distribuidores de Veículos no Estado de São Paulo), a entrega de carros recém-adquiridos para quitar os financiamentos, quando ocorre, é algo pontual e não deve se acentuar.

Frase

“O que vemos hoje é o efeito do erro das concessionárias de vender carro para consumidores despreparados financeiramente. O consumidor que comprou um carro que custa 10, saiu da loja com um carro que vale 8,5 e com uma dívida de 25. Olha o tamanho do problema que vamos ter de enfrentar agora com a crise que atinge o mercado de veículos”

GEORGE CHAHADE – presidente da Associação dos Revendedores de Veículos Automotores do Estado de São Paulo

Efeitos de medidas serão mais políticos

KENNEDY ALENCAR – DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Terá mais efeito político que econômico a decisão do governador de São Paulo, José Serra (PSDB), de anunciar R$ 4 bilhões de financiamento da Nossa Caixa para vitaminar as montadoras de carros.

O Banco do Brasil já colocou R$ 4 bilhões à disposição das montadoras -cerca de R$ 1,5 bilhão foi utilizado até agora. Provavelmente, os recursos da Nossa Caixa não serão usados na íntegra. E as razões são simples.

Os consumidores estão deixando de comprar carros, como mostram dados de queda nas vendas. Não adianta fabricar mais, se não há demanda. Mais: consumidores que compraram veículos começam a ter dificuldade de honrar o financiamento. Há sinais de aumento de inadimplência no setor.

Do ponto de vista político, a medida anunciada por Serra ajuda a manter o discurso otimista do governo federal. E também serve para o governador, que já acertou a venda da Nossa Caixa para o Banco do Brasil, fazer um pouco de política eleitoral com uma instituição financeira que em breve não será mais do governo paulista.

Um dos pré-candidatos do PSDB à Presidência em 2010, Serra é um crítico da política econômica de Lula. No entanto, evita aparecer como alguém que torce contra -impressão que poderia passar com um discurso agressivo.

O tucano atua no sentido contrário. Aparece como alguém afinado com Lula, disposto a adotar medidas para manter a economia brasileira aquecida. Nesse sentido, é conveniente o anúncio das medidas em benefício das montadoras de automóveis, um setor da economia com uma cadeia produtiva longa. Ou seja, altamente empregador. O setor é também uma espécie de termômetro da economia, e os sinais que vem dando são preocupantes.

No mesmo dia, o concorrente de Serra no PSDB, Aécio Neves, também lançou seu pacote para Minas Gerais, Estado dependente de produtos mais afetados pelos humores da crise, como a mineração. Para Aécio, é importante firmar a imagem de bom gestor, característica já associada a Serra.