Confederação Nacional dos Trabalhadores Metalúrgicos

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Greves ameaçam prazos de obras para a Copa

Valor Econômico

Daniel Rittner e André Borges

De Brasília

A combinação de relações cada vez mais tensas entre sindicatos e empreiteiras começa a formar um barril de pólvora que pode comprometer o andamento das obras dos estádios que servirão de palco para a Copa do Mundo de 2014. Além da greve no Maracanã, que deixou 2,5 mil trabalhadores de braços cruzados e deverá ser julgada pelo Tribunal Regional do Trabalho (TRT) nesta semana, há focos de insatisfação espalhados pelas reformas ou construções das arenas de Belo Horizonte, Recife, Salvador e Cuiabá, e Porto Alegre.

O Valor apurou que, nos dias 22 e 23, lideranças sindicais das 12 cidades-sedes vão se reunir, em Vitória (ES), para elaborar uma pauta conjunta de reivindicações. A ideia é avançar em uma proposta de piso salarial unificado para os operários e um pacote de benefícios comum, segundo Adalberto Galvão, vice-presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores da Indústria de Construção Pesada.

“Mesmo com empreendedores iguais e em localidades próximas, as condições são muito distintas”, afirma Galvão. Ele cita os casos de reforma da Fonte Nova, em Salvador, e a construção da Arena Pernambuco, em Jaboatão dos Guararapes. Na Bahia, um operador de grua ganha R$ 2,3 mil por mês, recebe cesta básica de R$ 130 e é efetivado com 30 dias de experiência. A menos de 900 quilômetros, no estádio pernambucano, o salário é de R$ 1,7 mil para a mesma função, a cesta básica é de R$ 100 e a efetivação ocorre após os 90 dias previstos no contrato de experiência, segundo o relato do líder sindical.

Com o prazo apertado para a conclusão das arenas, o poder de barganha dos trabalhadores tende a aumentar. Há duas semanas, a presidente Dilma Rousseff prometeu a entrega de nove dos 12 estádios da Copa até 31 de dezembro do ano que vem. Outra fonte de preocupação para o governo, principalmente com as obras de infraestrutura relacionadas ao Mundial, é a contestação judicial do Regime Diferenciado de Contratações Públicas, o RDC. Na sexta-feira, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, entrou com ação no Supremo Tribunal Federal (STF) contestando a constitucionalidade da nova lei, argumentando que ela não fixa parâmetros mínimos para identificar obras, serviços e compras que podem dispensar a tradicional Lei de Licitações (8.666/93) e seguir o RDC.

Para o presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT), Ricardo Patah, o problema é que as obras começaram “atrasadas demais” e “não houve tempo hábil sequer para a capacitação dos profissionais pelos consórcios”. Patah acredita que o desfecho da greve no Maracanã será um tipo de balizador para as reivindicações sindicais nas demais cidades-sedes.

A paralisação no estádio carioca foi detonada por vários motivos. Os trabalhadores do turno da noite dizem que são servidas sobras das refeições diurnas, reclamam da falta de lanche durante a madrugada e da ausência de médicos de plantão. Também alegam que houve atraso na entrega de cartões do plano de saúde e no reajuste da cesta básica, que devia ter subido de R$ 110 para R$ 160. Uma audiência no Tribunal Regional do Trabalho (TRT), para apresentação das defesas dos trabalhadores e do consórcio, está marcada para hoje.

Na Bahia, uma greve foi evitada em cima da hora, no início de setembro, graças à concordância dos empreendedores em elevar o valor da cesta básica de R$ 130 para R$ 170. Outra reclamação recorrente é a de que, para dar conta da conclusão das obras no prazo previsto, os trabalhadores precisam cumprir grande quantidade de horas-extras. “Para dar conta do cronograma das obras, há a imposição de um ritmo de trabalho às vezes sobrehumano”, afirma Adalberto Galvão, que faz parte da diretoria da Força Sindical.

Os sindicalistas rejeitam a tese de que os trabalhadores estão se aproveitando do cronograma apertado para aumentar as cobranças. Em Belo Horizonte, os 800 trabalhadores que trabalham nas obras do Mineirão já fizeram uma paralisação em junho. Uma segunda mobilização pode ocorrer, caso a pauta de reivindicações que será apresentada em dez dias não seja atendida, diz José Antônio da Cruz, presidente do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção Pesada de Minas Gerais. “Estamos pedindo aumento salarial de 15%, igualando os salários de Minas com os do Rio de Janeiro. Se as obras e o trabalho nos estádios são iguais, por que os salários não são?”, questiona Cruz.

A cobrança por melhores condições de trabalho também é forte nas obras da Arena do Grêmio, em Porto Alegre (RS), onde já ocorreram três paralisações. O estádio escolhido para sediar os jogos da Copa é o Beira-Rio, do Internacional, mas a arena gremista ainda corre por fora e está com as obras mais avançadas.

“Cerca de 90% dos 700 empregados do estádio são de fora do Estado, a maioria vem do Nordeste. Aqui faz muito frio, é preciso dar condições adequadas de trabalho para essas pessoas”, diz Isabelino Garcia dos Santos, presidente do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção Pesada do Rio Grande do Sul.

Em Cuiabá, um indicativo de greve foi suspenso em março, quando o consórcio responsável pela construção da Arena Pantanal concordou em oferecer um piso de R$ 830 para serventes e de R$ 1,1 mil para os demais profissionais. Antes, pagava-se o valor mínimo de R$ 720, definido em acordo coletivo da categoria.

“A questão é que, com o mercado aquecido, os pedreiros conseguiam um salário bem melhor em outras obras”, explica o presidente do Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Construção Civil de Cuiabá, Joaquim Santana. O acordo fechado entre sindicato e empreiteiras valia até a nova convenção coletiva, homologada em junho. Desde então, negocia-se a renovação do acordo, sem resultado, embora os valores fixados antes estejam sendo respeitados.

Apesar das disputas que têm ocorrido entre as centrais sindicais para definir quem representaria os profissionais da construção civil, o secretário nacional de finanças da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Wagner Freitas, afirma que só um “entendimento nacional” poderá dar fim aos movimentos de greve.

“Os trabalhadores dos estádios e de outras obras do governo ainda estão sujeitos às piores condições e a salários muito baixos. Para resolver esse problema, as centrais sindicais têm que andar juntas”, comenta Freitas. “Estamos trabalhando uma mesa nacional para a construção civil, ao lado do governo e das empreiteiras.” O sindicalista da CUT afirma que, desde as paralisações nas obras da hidrelétrica de Jirau, em Porto Velho (RO), ocorridas em março, sindicatos e empresas conseguiram algum avanço em negociações, mas falta uma padronização do que é oferecido ao trabalhador.