Para ministros, existem avanços, mas há muito a ser feito na melhoria das condições dos trabalhadores
Centrais pedem medidas para melhorar as condições dos cortadores, sob pena de o país se tornar “vulnerável” em fóruns internacionais
MÁRIO MAGALHÃES – DA SUCURSAL DO RIO
Embora reconheça como “penosa” e “extenuante” a atividade do corte da cana-de-açúcar, o governo considera que houve avanço nas condições de trabalho dos canavieiros. A opinião foi manifestada por três ministros e um secretário do Ministério da Agricultura. Luiz Dulci (Secretaria Geral da Presidência) afirma que é preciso “humanizar” a rotina dos cortadores.
Carlos Lupi (Trabalho) defende um “pacto social na área do etanol”. Para Paulo Vannuchi (Direitos Humanos), a situação dos trabalhadores em alguns casos pode tornar o país “vulnerável” em fóruns do comércio internacional.
Dulci é o coordenador da Mesa de Diálogo para Aperfeiçoar as Condições de Trabalho na Cana-de-Açúcar, iniciativa que reúne o Executivo, empresários e trabalhadores.
Ele diz que os três segmentos concordam “que é necessário e possível aperfeiçoar e humanizar as condições de trabalho”. A despeito de progressos, “há muito a ser feito na melhoria das condições desse trabalho, naturalmente penoso e desgastante se comparado a outros”.
Lupi dá a medida do que aponta como evolução: “Há 20 anos, havia senhor feudal [na produção de cana]”. Procurado anteontem por CUT e Força Sindical, Lupi aceitou marcar reunião sobre o tema. “Queremos medidas que acabem com essa vergonha”, disse o presidente da Força, deputado Paulo Pereira da Silva (PDT-SP).
No domingo, a Folha publicou reportagem sobre a vida dos cortadores de cana, em particular no interior paulista.
Em comparação com 1985, ano da greve de maior envergadura de canavieiros em Guariba (SP), hoje os lavradores do Estado cortam mais cana (9,3 toneladas por dia, contra 5,0), mas ganham menos.
Em 2007, um cortador de cana recebeu a média diária de R$ 28,90. Há 23 anos, o valor era de R$ 32,70 (queda de 11,6%), como destacou estudo dos pesquisadores Rodolfo Hoffmann (Unicamp) e Fabíola C. R. de Oliveira (USP). Os valores foram atualizados.
De 2003 a 2007, os fiscais do Trabalho promoveram 3.973 autuações por alegadas irregularidades no setor sucroalcooleiro de São Paulo e 17.655 no Brasil. Em muitos casos, as empresas recorreram.
Uma das opções para os cortadores que deixam a cana são outras culturas, diz Manoel Bertone, secretário nacional de Produção e Agroenergia do Ministério da Agricultura.
“Todos nós reconhecemos que o trabalho do corte manual da cana queimada é realmente extenuante, muito difícil de ser feito”, afirma Bertone.
O ministro Paulo Vannuchi sustenta que “o tema dos direitos humanos aí não é simplesmente ter respeito pelo ser humano, o que já deveria ser motivo mais do que suficiente para os grandes empresários brasileiros e paulistas não permitirem a repetição desse tipo de estado de coisas que a reportagem da Folha descreveu”.
Vannuchi teme que o Brasil possa ser prejudicado em organismos do comércio internacional devido às condições de trabalho na roça da cana.
Ele não se refere apenas aos episódios com denúncia ou mesmo condenação por trabalho análogo à escravidão: “Também o trabalho que não é escravo, mas degradante, desumano, sujeita o Brasil a um desgaste internacional muito preocupante”.
O esforço do trabalho em São Paulo já produziu casos como o do lavrador Valdecir da Silva Reis, 35. Em 2006, ele cortou 52 toneladas de cana em um dia. Hoje, doente, não consegue mais trabalhar.