Confederação Nacional dos Trabalhadores Metalúrgicos

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Dói mais no bolso do trabalhador

Na França, alta dos combustíveis atinge todas as classes, mas pobres são mais afetados

Deborah Berlinck

Correspondente PARIS

O motorista de táxi Adama Fofana, de 23 anos, está com menos dinheiro no bolso no fim do mês. Jerôme Desbos, alto uncionário de um banco na França, de 42 anos, também. O que há de comum entre esses dois franceses? Ambos dependem de carro para trabalhar e enfrentam a disparada no preço do petróleo. Com esses retratos, O GLOBO prossegue hoje a série iniciada ontem, sobre como cidadãos de dez países estão enfrentando a alta dos preços dos combustíveis.

Desbos, que dirige 150 quilômetros por dia, em um carro a diesel, para trabalhar em Valence, na região RhôneAlpes, está perdendo dinheiro. Mas a distância foi opção: ele prefere morar no campo. Desbos ainda não alterou sua rotina. Embarcou sexta-feira para 15 dias de férias na Córsega.

Taxista tem de trabalhar dobrado

Já para Fofana, filho de imigrantes de Mali, na África, a disparada nos preços do petróleo é um drama. – Estou perdendo ? 10 por dia. É muito! – reclama.

Ele mora com a mãe, faxineira, em Ivry sur Seine, na periferia de Paris. É quem mais ganha na casa: ? 1.400, contra os ? 800 de sua mãe. Em um ano, Fofana viu seu dinheiro minguar, no ritmo da alta do preço do petróleo. Ele, que paga ? 92 pela diária de dez horas do táxi, viu seus gastos em gasolina aumentarem de ? 17 para ? 24 por dia. Amanhã, Fofana se unirá a centenas de taxistas em Paris, num protesto de várias categorias contra a alta do petróleo.

– Para compensar, estou trabalhando dobrado. Teve mês em que só tirei um dia de folga. Com o preço do petróleo do jeito que está, não posso mais descansar – conta.

A rotina da casa também mudou: a quantidade de comida diminuiu, e os produtos de marca saíram da lista do mercados. Mesmo problema de MarieClaire, 41 anos, recepcionista de museu, que dirige dez quilômetros por dia para ir ao trabalho:

– Eu vou voltar para o ônibus.Tudo aumenta, menos o salário.

O governo francês está propondo, entre outras medidas, que as empresas ajudem seus empregados nos gastos com transporte público. Ou com o combustível do carro, para os que não têm outra opção. Em meio à polêmica de sobretaxar ou não o lucro das petrolíferas, o grupo francês Total, que teve ganho recorde de ? 12,2 bilhões em 2007, anunciou que vai continuar a financiar, no próximo inverno, o aquecimento nas casas de 700 mil franceses que têm isenção do Imposto de Renda. O óleo de calefação subiu quase 40% em cerca de um ano. Na sexta-feira, o primeiroministro, François Fillon, reconheceu que a única solução é a França depender menos do petróleo:

– A alta não é um fenômeno transitório. Não haverá, como outras vezes, um contrachoque do petróleo. Encorajar o consumo de combustíveis é um contra-senso histórico.

Teme-se migração para grandes cidades

Para os habitantes de vilarejos como Saint Agrève, onde vive Desbos, a opção do transporte público não existe. Desbos pode arcar com a alta, e os outros? Para ele, essa é a conseqüência nefasta: levar muitos franceses a trocarem vilarejos e campo pelas grandes cidades.

Bernard Bourgeat, dono de uma auto-escola em Arlebosc, que tem apenas 321 habitantes, está perdendo ? 100 a ? 200 por mês. E diz que, se reajustar o preço da hora-aula, hoje em ? 33, perde clientela. Como as auto-escolas na França não têm o peso político de agricultores ou pescadores, terão de engolir a perda.

– Não há nada a fazer – afirma.

Ruralistas argentinos iniciam sua quarta greve nacional em três meses

Bloqueios continuarão enquanto conflito com governo não for resolvido

Janaína Figueiredo

Correspondente

BUENOS AIRES. A repressão aos produtores rurais da cidade de Gualeguaychú, província de Entre Rios, ordenada pelo governo Cristina Kirchner no sábado, levou a cúpula agropecuária argentina a convocar a quarta greve nacional do setor desde que começou o conflito, em meados de março passado. A paralisação começou ontem e, a princípio, terminará na próxima quarta-feira. Os líderes ruralistas argentinos se comprometeram a permitir a passagem de caminhões com alimentos nas principais estradas argentinas, mas voltaram a suspender a comercialização e a exportação de grãos.

– Convocamos todos os setores. Os argentinos devem entender que, se o campo estiver mal, todos estaremos mal – disse o presidente da Federação Agrária Argentina (FAA), Eduardo Buzzi, na noite de sábado.

Horas antes, o principal líder da FAA em Entre Rios, Alfredo De Angeli, fora preso com outros 18 produtores rurais, que estavam participando de um bloqueio na estrada 14. Todos foram levados para um quartel militar na cidade de Concepción del Uruguai e libertados no fim da tarde de sábado. A saída de De Angeli foi comparada, por analistas políticos, à liberação de Juan Domingo Perón, em 17 de outubro de 1945, quando o general se consagrou o homem mais popular e poderoso do país.

– Se pretendiam nos enfraquecer, enganaram-se. Estamos mais fortes do que nunca – assegurou o líder ruralista.

A decisão da cúpula agropecuária provocou a reação imediata da principal câmara de transportadores do país, comandada por

Rubén Agugliaro:

– Os bloqueios continuarão até que seja solucionado o conflito entre governo e campo.

Com os produtores rurais paralisados e as estradas bloqueadas, o risco de desabastecimento é cada vez maior. Ontem, acentuou-se a escassez de alimentos básicos, como carne, leite e óleo, e de combustível, sobretudo no interior do país.

Em meio à disputa com os produtores rurais, o governo Kirchner foi alvo de uma gravíssima denúncia de corrupção.

Segundo revelaram meios de comunicação locais, entre eles a revista “Notícias”, o empresário espanhol Antonio Mata acusou funcionários da Secretaria de Transporte, comandada por Ricardo Jaime, homem de confiança do ex-presidente Néstor Kirchner, de terem exigido US$ 6 milhões para dar sinal verde ao início de operações da companhia aérea Air Pampas. Esta foi a primeira vez em que um empresário confirmou um caso de corrupção no governo Kirchner.