A desaceleração da economia brasileira, amplificada pelo agravamento da crise internacional, retardou as negociações de reajuste salarial das categorias que têm data-base entre dezembro e fevereiro. Sindicatos representativos dos setores calçadista, químico, metalúrgico e de construção civil encontram dificuldades para fechar acordo com empregadores.
Já categorias que encerraram as negociações no prazo das data-bases conseguiram ganhos acima da inflação, embora a expectativa para este ano seja de uma drástica redução no número de acordos com ganhos reais devido ao cenário econômico.
O melhor acordo nesses três meses foi alcançado pelos mineiros do Sul de Santa Catarina e pelos metalúrgicos de Jaraguá do Sul. A negociação, contudo, foi difícil. Os mineiros chegaram a realizar três dias de greve. No dia 3, a categoria conseguiu reajuste nominal de 9% e um ganho real de 2,52%, acima do aumento de 1% do ano passado.
A presidente do sindicato, Leonor Rampinelli, diz que muitos empresários alegaram problemas com a crise, mas os trabalhadores usaram como argumento o aumento das vendas de carvão para as térmicas nos últimos meses. O sindicato representa 1,4 mil trabalhadores.
Em Jaraguá do Sul, os metalúrgicos negociaram em janeiro reajuste nominal de 8%, obtendo um ganho real de 1,52%. De acordo com o diretor financeiro do sindicato, Silvino Völz, ainda não é possível saber se a crise diminuiu e se as empresas vão parar com as demissões. Em fevereiro, ainda houve um alto volume de dispensas: 700 pessoas foram demitidas no setor.
Ganhos reais
Em São Paulo, o Sindicato dos Trabalhadores em Processamento de Dados e Empregados de Empresas de Processamento de Dados do Estado do Estado (Sindpd) obteve ganhos reais de 1,7 ponto a 8,8 pontos percentuais.
O reajuste da categoria foi de 7,1%, para um Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) acumulado em 12 meses até fevereiro de 5,43%. Os aumentos foram maiores para o piso de digitadores (reajustado em 7,48%), técnicos (7,69%), funcionários administrativos (12,15%) e office boys (14,24%).
Não tiveram a mesma sorte os trabalhadores dos setores calçadista, telefônicos e da construção civil que tinham data-base entre janeiro e fevereiro. Nenhum conseguiu fechar acordo no prazo. O Sindicato dos Trabalhadores da Indústria Calçadista de Franca enviou ao Tribunal Regional do Trabalho 2ª Região na semana passada um pedido de mudança na data-base da categoria, que é fevereiro.
“O sindicato só conseguiu estabelecer o processo de negociação com as empresas no dia 22 de janeiro. Nossa meta é mudar definitivamente a data-base para negociar com as empresas com mais prazo. Muitas ainda estão em férias”, afirma o presidente do sindicato, Paulo Afonso Ribeiro. Com o deferimento pelo tribunal, o sindicato terá mais 60 dias para negociar. A meta é obter reajuste de 5%.
Sem sucesso
Os prestadores de serviço à Telefónica, que tinham data-base em janeiro, também não tiveram sucesso nas negociações, afirma o presidente do Sindicato dos Trabalhadores em Telecomunicações (Sintetel), Almir Munhoz. “Fazemos o nosso papel, entregamos as pautas com antecedência, mas não há recíproca das empresas”, critica.
O sindicato, diz, vai pedir reajuste equivalente ao INPC. O setor reúne 180 mil trabalhadores, entre empresas de call center, prestadoras e operadoras de telefonia.
Em Salvador, também não houve acordo entre sindicato e empresas de construção. A data-base era janeiro e o Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil Cidade do Salvador negocia reajuste de 7% para prático e de 9% para servente de pedreiro, compensando a inflação de 12 meses de 6,48% medida pelo Índice de Custo de Vida (ICV-Dieese).
As empresas ofereceram reajuste nominal de 5%. “Os patrões querem alegar crise no setor. No ano passado o setor cresceu 8% e teve uma lucratividade enorme. Se não houver avanço, vamos fazer greve”, afirma o presidente do sindicato, Raimundo Brito.
Acima da inflação
Já no Rio Grande do Sul, 20 mil trabalhadores de indústrias calçadistas de Sapiranga, Araricá e Nova Hartz e 5,5 mil funcionários de fábricas de móveis de Bento Gonçalves tocam as negociações sem enfrentar pressões por redução de jornada, demissões massivas ou suspensões de contrato de trabalho.
Segundo o presidente do Sindicato dos Sapateiros de Sapiranga, Júlio Cavalheiro Neto, a categoria deve aprovar reajuste de 7,4%, quase um ponto acima do INPC acumulado até janeiro.
Atualmente, 1,7 mil trabalhadores estão em férias nas três cidades, a maior parte empregados da Paquetá, que transferiu para este mês a parada de fim de ano. “A situação é de estabilidade”, afirma Cavalheiro, observando que a melhora da demanda no país tem permitido às indústrias retomar a produção.
O Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias do Mobiliário de Bento Gonçalves, por sua vez, pediu reajuste equivalente ao INPC mais 3% de ganho real, disse o tesoureiro Arcelo Rossini. Em 2008, o ganho real foi de 1,5%.
A maior parte das empresas locais não deu férias coletivas além das paradas tradicionais de fim de ano e nesta semana de Carnaval interrompeu a produção apenas de segunda a quarta-feira.
“A situação está de estável para boa”, afirmou. Além das questões econômicas, ficaram acordadas melhorias em 14 itens da convenção coletiva, como: a gestante será liberada pelo menos 9 vezes para consultas médicas durante gestação; estabilidade de 30 dias para o pai após o nascimento do filho; pagamento obrigatório da primeira parcela do 13º salário até 1º de julho; pagamento de 60% da diferença entre o salário e o valor do auxílio doença pago pelo INSS por 180 dias. (Fonte: Valor Econômico)