Folha SP
Governo já admite recessão, lança medidas para estimular consumo e reduz Imposto de Renda e tributação de carros e crédito
Mantega afirma que tem “bala na agulha” e promete mais medidas já para a próxima semana e para o início do próximo ano
VALDO CRUZ
SHEILA D´AMORIM
LEANDRA PERES
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
A previsão do próprio governo de que o país corre risco de recessão no início de 2009 levou o Ministério da Fazenda a acelerar a adoção das medidas divulgadas ontem para aumentar a renda do consumidor e reduzir pressões sobre o câmbio.
Ao todo, a Receita vai abrir mão de R$ 8,4 bilhões em impostos para beneficiar os consumidores no próximo ano. O valor é menor do que o gasto com o Bolsa Família neste ano, de R$ 10,7 bilhões.
Das quatro medidas divulgadas, três terão impacto direto no bolso das pessoas e uma vai beneficiar as empresas com dívida externa. O governo pode liberar até US$ 10 bilhões das reservas internacionais para emprestar a empresas com dívida externa vencendo em 2009.
O pacote de estímulo sai um dia após o governo, por meio do Banco Central, manter a taxa de juros em 13,75%, o que em tese desestimula o consumo.
As pessoas físicas serão beneficiadas com a criação de novas alíquotas do Imposto de Renda, diminuição da alíquota de IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) de 3% para 1,5% nas operações de crédito ao consumidor e redução do IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) de automóveis, com o compromisso das montadoras de queda nos preços finais.
O ministro Guido Mantega (Fazenda) disse que as medidas anti-recessão não terminam aí. Novas serão divulgadas, algumas já na próxima semana. “O que já fizemos é uma parte do que o governo pretende fazer para evitar um desaquecimento forte da economia no ano que vem.” Ele não quis adiantar quais são, mas lembrou que o governo pode reduzir mais os depósitos compulsórios e estimular a habitação.
Uma proposta em discussão é usar os bancos oficiais, especialmente Caixa e Banco do Brasil, para estimular financiamentos que embutem prazo de carência no qual o tomador pode deixar de pagar prestações.
Segundo Mantega, a meta é fazer o que for necessário para perseguir crescimento de 4% em 2009 (analistas prevêem 2,5%), destacando que, se necessário, o governo gastará o 0,5% do PIB (R$ 14,2 bilhões) destinado ao Fundo Soberano e que, num primeiro momento, iria engordar o superávit primário (economia para pagamento de juros da dívida).
“O perigo é não fazer nada e cair o nível de atividade. Aí, sim, perderíamos arrecadação. Quando chegar janeiro, provavelmente faremos cortes em custeio e possivelmente um aumento do investimento público.” Nas previsões da Fazenda, o PIB pode encolher até 1% no último trimestre deste ano, na comparação com o terceiro trimestre, e recuar novamente no primeiro trimestre de 2009, registrando dois trimestres negativos seguidos, critério para determinar uma recessão.
Para o secretário de Política Econômica, Nelson Barbosa, a recessão “é possível, mas vamos trabalhar para que não”, acrescentando ainda que as previsões são imprecisas.
Na avaliação de Nelson Barbosa, a economia do país não deve registrar uma “queda muito grande no primeiro trimestre, ficar estável no segundo e iniciar uma recuperação no segundo semestre”.
Para Mantega, o país só vai sofrer uma queda forte no ritmo econômico se o governo ficar na defensiva. “Eu disse aos empresários hoje para confiarem, para não demitirem. Se começarem a demitir, toda a cadeia vai demitir. Eu disse que confiem, porque o governo tem bala na agulha e eu sei que posso chegar a 4% sem causar desequilíbrios na economia.”
A defesa do governo para que as pessoas não deixem de consumir para não paralisar a economia contrasta com a política conservadora do BC, que, apesar da reversão do cenário econômico após o aprofundamento da crise a partir de setembro, mantém a maior taxa de juros reais do planeta.
Apesar da resistência do BC em reduzir a Selic, taxa que serve de referência para a economia, Mantega insiste em que as medidas de redução de IOF farão o custo dos financiamentos aos consumidores cair.
O ministro Miguel Jorge (Desenvolvimento) também aposta que o acordo com as montadoras, que permitiu a redução do IPI, vai se traduzir a partir “de amanhã [hoje]” em redução do valor dos carros assim como a manutenção do emprego. “Isso é fácil de fiscalizar. Se não houver [diminuição dos preços], chamaremos os empresários para conversar.”