Rendimentos provenientes do Estado crescem 36% de 2003 a 2009, ante 9% dos ganhos obtidos com o trabalho
Distância entre os gastos dos mais ricos e dos mais pobres recua, revela POF (Pesquisa de Orçamentos Familiares)
PEDRO SOARES
DO RIO
O Estado brasileiro ampliou, por meio do pagamento de aposentadorias e benefícios sociais, de 15% para 18,5% seu peso no rendimento das famílias entre os períodos de 2002-2003 e 2008-2009, revela a POF (Pesquisa de Orçamentos Familiares), divulgada ontem pelo IBGE.
A mão do Estado cresceu na esteira do reajuste real do salário mínimo (que indexa aposentadorias), de mais benefícios pagos por causa do envelhecimento populacional e da extensão de programas como o Bolsa Família.
As transferências são a segunda mais importante fonte de renda familiar e avançaram sobre a parcela vinda do trabalho -cujo peso caiu para 61,1% do rendimento total em 2009, ante 62% em 2003.
Ocupou também parte do espaço do rendimento não monetário (trocas, produção própria e doações).
A parcela desse lado menos visível da economia alcançou 12,8% do rendimento das famílias -nas de menor renda (até dois salários), supera um quarto do rendimento total.
Ao detalhar o consumo, a POF serve para atualizar as ponderações de itens e grupos de produtos pesquisados pelos índices de preços do IBGE, aproximando-os do seu real peso no orçamento.
Diferentemente da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), a pesquisa investiga todas as fontes de despesa (mesmo as não monetárias), e não apenas os rendimentos.
”Só a POF revela essa economia primitiva, que se desenvolve sem troca de moeda, sem Estado e sem mercado, muito importante entre os mais pobres e nas áreas rurais”, diz Marcelo Neri, economista da FGV.
PONTO NEGATIVO
Segundo Sônia Rocha, economista do Iets (Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade), o “desejável” é sempre o crescimento da renda pela via do trabalho.
Para Neri, o fato de a renda de transferências crescer mais que a do trabalho (36% ante 9%, de 2003 a 2009) é o ponto negativo da pesquisa.
O economista diz que o intervalo entre 2003 e 2009 foi marcado pela alta da renda e do emprego formal e pela consolidação da estabilidade dos preços, o que permitiu a redução da desigualdade e o maior acesso ao consumo.
Segundo o IBGE, caiu a distância entre os gastos dos mais ricos e dos mais pobres -que era de 10,1 vezes e passou para 9,6 vezes.
Apesar da melhora, o presidente do IBGE, Eduardo Pereira Nunes, considera que o Brasil está distante de uma condição de equidade.
”Há uma persistência da desigualdade.
As distâncias estão diminuindo, mas numa velocidade que não é compatível com o desenvolvimento da economia brasileira nos últimos anos.”
Um dado ilustra tal realidade: as famílias que têm mais de uma pessoa com ensino superior gastam, em média, 389% mais do que aquelas sem graduados.