João Guilherme Vargas Netto
A motivação do deputado Marcelo Ramos (PL-AM) encarregado de apresentar sua PEC 161 que emascula o artigo 8º da Constituição (sem levar em conta as “contribuições” dos dirigentes sindicais que estavam discutindo o tema) é um sofisma que pode ser apresentado da seguinte forma:
- O movimento sindical brasileiro está estruturalmente em crise;
- O artigo 8º da Constituição é o que determina a estrutura sindical;
- Logo, o artigo 8º precisa ser modificado.
O encadeamento acima peca pela lógica e o sofisma se evidencia como uma mentira. As causas da crise estrutural do sindicalismo brasileiro não passam pelo artigo 8º.
Do ponto de vista da massa de associados a crise do movimento sindical é decorrente da recessão prolongada e renitente que trava a economia brasileira, agravada pelos efeitos da lei trabalhista celerada e pelas iniciativas patronais casando o desemprego alto com os baixos salários; o desencanto e o individualismo fazem estragos na base sindical dos trabalhadores que estranha os dirigentes.
Do ponto de vista das direções sindicais a crise é decorrente da lei trabalhista celerada e, principalmente, da extinção abrupta da contribuição sindical obrigatória e dos obstáculos legais às contribuições coletivas dos trabalhadores para a sustentação das entidades; as direções estão perplexas, temerosas das bases e sem representatividade.
Em ambos os pontos de vista, que se completam, o artigo 8º não é causa da crise, decorrente das legislações infraconstitucionais, posturas judiciais, práticas patronais, agressões bolsonaristas e pela recessão. O artigo 8º tem sido, pelo contrário, um obstáculo ao desmanche e uma garantia da existência, ainda, de um movimento sindical organizado.
Duas observações ainda devem ser feitas.
É ingênua a concepção de que, para atalhar o ataque liberal ao artigo 8º, o movimento sindical deve apresentar, como uma carta ao Papai Noel, suas propostas de mudança que também desconstitucionalizariam direitos sindicais sem nenhuma garantia de que as soluções serão as melhores.
Para enfrentar os resultados do GAET (que podem ser os piores possíveis, ou não, dependendo da habilidade de Rogério Marinho) não precisamos da PEC 161 do deputado Marcelo Ramos e não podemos, para começo de conversa, aceitar a demolição do artigo 8º que, junto aos artigos 6º, 7º, 9º, 10º e 11º configuram o rol dos direitos sociais, trabalhistas e sindicais da Constituição que devemos preservar.
João Guilherme Vargas Netto
consultor sindical de entidades de trabalhadores