Em ato inédito na Auditoria Fiscal do Trabalho, o Superintendente Regional do Trabalho e Emprego no Rio de Janeiro revogou a autorização para que Auditores Fiscais do Trabalho lotados naquele estado embarguem obras ou interditem máquinas durante as ações fiscais quando constatarem a necessidade urgente de fazê-lo.
Pelo artigo 161 da CLT é delegada ao Superintendente a competência para embargar obras ou interditar equipamentos, porém, o Ministério do Trabalho e Emprego admite que os AFTs realizem o embargo ou interdição diretamente, no momento da ação fiscal, quando é constatada a urgência para preservar a integridade física e a vida dos trabalhadores. É o que está disposto na Portaria nº 40/2011, assinada pelo ministro Carlos Lupi:
“Seção II
Da competência
Art. 3º Quando a competência prevista no caput do art. 161 da CLT e no seu §5º for delegada pelo Superintendente Regional do Trabalho e Emprego aos Auditores Fiscais do Trabalho, com vistas a garantir a agilidade e efetividade da medida, deverá a portaria de delegação destinar-se a todos os Auditores Fiscais do Trabalho em exercício na circunscrição da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego, inclusive aos integrantes dos grupos móveis de fiscalização.
Parágrafo único. A portaria de delegação de competência, suas alterações ou revogação devem ser encaminhadas à Secretaria de Inspeção do Trabalho – SIT, para ciência e adequação ao previsto nesta Portaria.”
Ao assinar esta Portaria, o Ministro do Trabalho e Emprego foi coerente com o disposto na Constituição Federal em seu artigo 7º: “são direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: inciso XXII: “redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança;”; e também com a Convenção 81 da Organização Internacional do Trabalho em seu artigo 13, itens 1 e 2-b:
“Artigo 13
1. Os inspetores do trabalho estarão autorizados a tomar medidas a fim de que se eliminem os defeitos observados na instalação, na montagem ou nos métodos de trabalho que, segundo eles, constituam razoavelmente um perigo para a saúde ou segurança dos trabalhadores.
2. A fim de permitir a adoção de tais medidas, os inspetores do trabalho estarão autorizados a reservar qualquer recurso judicial ou administrativo que possa prescrever a legislação nacional, a ordenar ou mandar ordenar:
a) … ou
b) a adoção de medidas de aplicação imediata, em caso de perigo iminente para a saúde ou segurança dos trabalhadores.”
Graves irregularidades
A ação fiscal, organizada pela SRTE-RJ, ocorreu entre os dias 12 e 15 de abril de 2011, no município de Santo Antônio de Pádua, contando com a presença de 6 AFTs, acompanhados ainda de 2 agentes da Polícia Federal.
Foram fiscalizados 10 estabelecimentos, entre locais de extração de blocos de pedras e de beneficiamento. Todas as áreas de extração foram interditadas, por falta de proteções contra quedas de altura, presença de indicadores de instabilidade dos maciços rochosos e falta de umidificação dos processos de perfuração das rochas com utilização de marteletes pneumáticos.
Nas serrarias de pedras, as máquinas utilizadas para cortar as “lajes” de pedras em pequenos blocos também foram interditadas, pois o disco de corte encontrava-se totalmente exposto e os operadores seguravam as pedras a serem cortadas com as próprias mãos, que passavam muito próximas aos discos constituindo elevado risco de acidentes.
Foram resgatados 8 trabalhadores encontrados em situação de degradância, sem água potável suficiente, sem banheiros, sem locais para refeição, sem EPIs, etc.). As situações encontradas levaram à interdição de todas elas, pois, anteriormente, já havia sido realizado um trabalho de palestras orientadoras e notificações à maioria das empresas da região, além de outras fiscalizações em que também houve interdições.
A Portaria que revogou a competência dos AFTs do Rio de Janeiro para realizar embargos e interdições foi publicada no dia 18 de abril, uma segunda-feira, logo depois da ação fiscal em Santo Antônio de Pádua.
Acidentes em pedreiras são cada vez mais freqüentes e graves, embora nem todos sejam divulgados para a população em geral. Neste mês de abril um deles foi divulgado pelo jornal Folha de São Paulo, quando dois operários morreram no município de Santos (SP), soterrados por mais de 50 toneladas de granito.
Link da matéria da Folha de São Paulo.
Em defesa dos AFTs e dos trabalhadores
Diante de riscos iminentes à saúde e segurança dos trabalhadores, constatados durante as fiscalizações, são os Auditores Fiscais do Trabalho que têm condições de avaliar a necessidade de interditar máquinas e equipamentos ou embargar obras. Esta competência, legítima e justificada, já reconhecida pelo Ministério do Trabalho na Portaria nº 40/2011 é acatada em praticamente todas as Superintendências. As ações devem ser bem fundamentadas em relatórios e são levadas ao conhecimento dos Superintendentes Regionais do Trabalho e Emprego e da Secretaria de Inspeção do Trabalho – SIT. É uma ação claramente em defesa da vida dos trabalhadores.
A competência definitiva é reivindicada pelo SINAIT e já foi levada à SIT em abril de 2010 (o documento está disponível na área restrita do site). O assunto está contemplado no anteprojeto de Lei Orgânica do Fisco – LOF no artigo 16, inciso IX, que trata de garantias e prerrogativas dos AFTs: “interditar estabelecimento, setor de serviço, máquina ou equipamento, ou embargar obras, total ou parcialmente, quando constatar situação de grave e iminente risco à saúde ou à segurança do trabalhador”.
“A Fiscalização do Trabalho, em especial a área de saúde e segurança, está sob fogo cruzado por causa do aumento do número de acidentes do trabalho e o Ministério do Trabalho e Emprego vem sendo muito criticado. Para nós era uma situação esperada, que iria explodir a qualquer momento, e não faltaram avisos. O número de AFTs diminui a cada dia em contraste com o número de empregos formais que cresce. O desequilíbrio iria aparecer em algum lugar, mais dia menos dia.
Medidas como essa do Superintendente do Rio de Janeiro só contribuem para agravar a situação, pois os AFTs em campo estarão impedidos de tomar as providências para evitar que mais trabalhadores se acidentem, fiquem afastados do trabalho, fiquem inválidos ou morram, e engrossem as estatísticas negativas para o país em termos de acidentes de trabalho”, denuncia a presidente do SINAIT, Rosângela Rassy, que relembra, ainda, a estatística divulgada recentemente no site do SINAIT: “Em 2009, em média, 43 trabalhadores deixaram de retornar ao trabalho ou para suas casas, a cada dia, devido à morte ou invalidez permanente”.
Por estas razões, a categoria dos Auditores Fiscais do Trabalho questiona-se quanto aos motivos que levaram o Superintendente do RJ a tomar tal atitude. Para resguardar os AFTs é que o artigo 6 da Convenção 81 determina: “O pessoal da inspeção será composto de funcionários públicos cuja situação jurídica e condições de serviço lhes assegurem a estabilidade no seu emprego e os tornem independentes das mudanças de governo ou de qualquer influência externa indevida.”
Rosângela destaca ainda outra preocupação, a de que, de agora em diante, o procedimento de embargo ou interdição será extremamente moroso e pode ser que as providências nem sejam tomadas ou que cheguem tarde demais para os trabalhadores, ou seja, depois que as tragédias ocorrerem.
O SINAIT está encaminhando correspondência ao ministro do Trabalho e Emprego a respeito do caso, posicionando-se contrário à medida adotada no Rio de Janeiro.
CLIQUE AQUI para ler a Portaria nº 200, de 20 de junho de 2008, que foi revogada.
CLIQUE AQUI para ler a Portaria nº 73, de 18 de abril de 2011.
CLIQUE AQUI para ler a Portaria nº 40, de 14 de janeiro de 2011.
Matéria sugerida por
Zuher Handar, médico do trabalho e consultor da OIT (Organização Internacional do Trabalho) e da CNTM