Falta de crédito e perdas de companhias com proteção cambial assustam governo
Para o BC, governo tem de atuar para garantir liquidez aos mercados e estimular a economia não-financeira com política de crédito
SHEILA D´AMORIM
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
A dificuldade de quantificar as perdas das empresas com operações cambiais está gerando desencontros dentro da equipe do presidente Lula sobre soluções que podem ser adotadas para socorrer o setor privado. O debate inicial sobre como reagir a reflexos pontuais da crise financeira se tornou uma grande polêmica no governo sobre as conseqüências do cenário externo nos dois últimos anos da gestão Lula.
O problema começou com a falta de linhas para os exportadores, expandiu para restrição geral ao crédito pelos bancos, passou para as perdas com operações no mercado de derivativos de dólar e chegou a financiamentos com cláusulas de correção a partir de dois indexadores, um deles cambial.
A estratégia do BC é separar duas linhas de atuação: uma que trata de garantir liquidez para o mercado financeiro e outra que cuida do lado real da economia, o que inclui crédito, inflação e política de juros.
Segundo a Folha apurou, mesmo ficando cada vez mais difícil fazer essa dissociação, o BC insiste que é preciso separar o joio do trigo e tem se mostrado contra a socorro direto a empresas. Por outro lado, assessores diretos do presidente estão cada vez mais assustados com a repercussão da crise no setor produtivo, como a falta de financiamento à exportação, contração do crédito e perdas das empresas com o câmbio.
As previsões são de que o tombo no crescimento da economia em 2009 e 2010 poderá ser maior do que estimado até agora. E isso, seria um desastre para sucessão presidencial.
Por isso, cresce no Palácio do Planalto a pressão por algum sinal da área econômica de socorro direto às empresas. O máximo que se conseguiu, até agora, foi um alívio para os agricultores que precisam de dinheiro para o plantio da safra 2008/2009.
O BC segue na tese de que é preciso dar liquidez, em reais e dólares, para o mercado sem direcionar medidas para setor específico e resiste até mesmo em fazer o leilão de linhas de crédito em dólar vinculado a exportação. A medida chegou a ser anunciada numa entrevista do ministro Guido Mantega (Fazenda) e do presidente do BC, Henrique Meirelles.
Fontes ouvidas pela Folha argumentam que esse “não é o melhor caminho”. A Fazenda, apesar de ser favorável à medida, até agora cedeu às argumentações do BC de que o instrumento, que já foi usado na crise de confiança vivida pelo país em 2002, gerou questionamentos do TCU (Tribunal de Contas da União).
Apesar de o problema ter se resolvido na época, o BC acredita que há alternativas mais efetivas para se trabalhar. Recentemente em reunião com banqueiros, Meirelles ouviu que, depois de secarem, cerca de 20% das linhas de comércio exterior estão sendo renovadas e a aposta é que com menos volatilidade no câmbio, os bancos voltarão a operar rapidamente.
Segundo avaliações da equipe econômica, o mercado de exportação segue o padrão de momentos de grande turbulência: há uma retração para ver onde o dólar se estabilizará.
Já com relação às perdas de empresas no mercado de derivativo de dólar, operações de risco feitas aqui no Brasil e muitas no exterior por meio de subsidiárias, a avaliação de parte da equipe econômica é que as empresas têm que assumir o prejuízo pela exposição ao risco que assumiu. Isso não pode ser assumido como um problema de governo porque não se sabe o tamanho do problema e, uma vez socorrida uma, outras deverão vir na seqüência.