SÃO PAULO – O aumento de quase 14% no salário mínimo previsto para 2012 deve injetar no consumo das famílias cerca de R$ 9 bilhões adicionais, segundo cálculo da LCA Consultores, e dar mais combustível para a escalada da inflação. Essa montanha de dinheiro pode dificultar o trabalho do Banco Central para trazer a inflação ao centro da meta de 4,5% em 2012, alertam economistas.
Mesmo com essa enorme pedra no caminho do BC para combater a inflação, a autoridade monetária revelou em seu último Relatório Trimestral de Inflação que pretende atingir o centro da meta só em 2012. Para este ano, adota uma estratégia mais gradualista para segurar a alta de preços, elevando em ritmo moderado a taxa básica de juros.
O reajuste do salário mínimo é um preço já contratado na economia pela Lei 12.382, de 25 de fevereiro de 2011. Leva em conta o aumento do PIB de dois anos anteriores (no caso de 2012, o crescimento de 7,5% do PIB de 2010) e a variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) de 12 meses anteriores ao período do reajuste. Para este ano, a projeção para o INPC é algo em torno de 6%. Isso resultará num aumento do salário mínimo em 2012 de cerca de 14%.
Apesar de a preocupação em relação ao reajuste do mínimo em 2012 não transparecer nos relatórios do BC, fontes do mercado dizem que esse foi um dos principais pontos de discussão em reuniões recentes da autoridade monetária com analistas.
“O reajuste do mínimo de 2012 dá rigidez à inflação e deve manter o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) acima do centro da meta em 2012. No ano que vem, a inflação deve ficar em pelo menos 5%”, prevê o diretor da RC Consultores, Fábio Silveira.
Felipe Salto, economista da Tendências, concorda com Silveira. Para ele, com o reajuste do mínimo, “ficará mais difícil atingir o centro da meta de 4,5%em 2012”. Ou pelo menos mais custoso. Isto é, se o ajuste fiscal não for feito pelo governo, será necessária uma elevação maior nos juros para conter a inflação.
“O salário mínimo não é um fator definitivo, mas complica a recondução da inflação à meta em 2012”, confirma Tatiana Pinheiro, economista do Santander. Ela pondera que o impacto do reajuste do salário mínimo na inflação vai depender do grau de aquecimento da economia no início de 2012.
De toda forma, Tatiana, que projeta um IPCA de 6,1% para este ano e de 6% para 2012, diz que essa regra de aumento do mínimo dá resistência à inflação. É que cerca de um quarto dos preços que compõem o IPCA são os serviços livres, fortemente influenciados pelo salário mínimo. Só os gastos com empregados domésticos, que são salário mínimo na veia, pesam 3,53% no IPCA, quase um ponto porcentual a mais que a participação da carne, alimento básico, no indicador (2,58%).
Indexação. Na opinião de Braulio Borges, economista-chefe da LCA Consultores, e responsável pelos cálculos sobre incremento do consumo provocado pelo aumento do salário mínimo, a regra de reajuste fixada em lei é positiva porque elimina as incertezas que rondavam a economia no início de cada ano.
Mas ele ressalta que há um aspecto negativo nessa regra, porque fomenta a indexação dos preços, especialmente dos serviços, nos quais política monetária tem pouca influência.
Nos cálculos de Borges, o reajuste de quase 14% do mínimo previsto para o ano que vem deve aumentar a inflação dos serviços livres em quase um ponto porcentual em relação ao que poderia ser, caso o aumento do salário levasse em conta apenas inflação do período, na casa de 6%.
O economista, que ao contrário de seus pares projeta um IPCA de 4,5% para 2012, ressalta, no entanto, que a rigidez da inflação provocada pela lei do reajuste do mínimo inviabiliza a redução do centro da meta, hoje em 4,5%, para menos de 4% nos próximos anos. Em outros países que usam o sistema de metas de inflação, o alvo a ser atingido é 3% e não 4,5% como o Brasil.
“É um discurso ultrapassado transformar o reajuste do salário mínimo em agente da inflação”, diz o secretário-geral da Força Sindical, João Carlos Gonçalves, o Juruna. Ele argumenta que o ganho real do salário mínimo de 7,5%, referente ao crescimento do PIB, é relativo ao aumento de riqueza na sociedade, que tem de ser distribuído. Para ele, o governo tem de pensar em outras vias para conter a inflação, como, por exemplo, reduzir os seus próprios gastos. “Não vamos aceitar esse discurso.”