Confederação Nacional dos Trabalhadores Metalúrgicos

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Quilombolas recorrem à OIT

Lideranças dos quilombos acusam governo de ignorar Convenção 169

Roldão Arruda

O processo de demarcação de terras de remanescentes de quilombos no País está paralisado há quase um ano. Irritados com a situação, líderes de dez organizações de quilombolas acabam de encaminhar à sede da Organização Internacional do Trabalho (OIT), em Genebra, uma comunicação na qual afirmam que o governo federal não tem respeitado os termos da Convenção 169 – documento que trata das questões dos povos indígenas e tribais e do qual o Brasil é signatário.

“Existem mais de 500 processos de demarcação já abertos e à espera de uma solução”, diz Jô Brandão, da Coordenação Nacional de Quilombos.

O impasse surgiu em setembro do ano passado. Após uma série de conflitos entre instituições do próprio governo federal, com pontos de vista diferentes sobre as demarcações, o Gabinete de Segurança Institucional (GSI), vinculado à Presidência da República, criou um grupo interministerial para analisar o assunto.

A coordenação ficou com a Advocacia-Geral da União (AGU), que logo apontou a origem dos conflitos: a Instrução Normativa nº 20, do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), encarregado de definir e titular as terras. Ela dava excessivos poderes ao órgão, segundo a AGU.

Em dezembro ficou pronta a minuta com o texto de uma nova instrução. Para entrar em vigor, porém, ela precisava ser submetida à apreciação dos quilombolas – conforme a Convenção 169. “Ela determina a realização de consultas todas as vezes que forem tomadas medidas que afetem nossas vidas”, explica Jô Brandão.

De acordo com o consultor-geral da União, Ronaldo Araújo Vieira Júnior, os quilombolas já foram ouvidos. “Em abril, um grupo de 300 líderes reuniu-se com representantes do governo e do Ministério Público Federal para discutir o texto.”

Em maio, uma comissão paritária, com representantes do governo e dos quilombolas, preparou dois textos, enviados ao advogado-geral da União, José Antonio Dias Toffoli. Um deles reunia os pontos de comum acordo; e o outro sinalizava as divergências que persistiam.

Os textos continuam até hoje no gabinete do advogado-geral. Espera-se que ele redija uma versão final e envie para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que poderá sancioná-la ou não.

Na comunicação encaminhada à OIT, os quilombolas afirmam que seus direitos foram atropelados. “Queríamos que as consultas fossem regionais e que o texto usado nas discussões fosse escrito de comum acordo entre governo e quilombolas”, diz Jô Brandão. “Na prática, houve uma reunião nacional e um texto do governo. Fomos ignorados.”

As demarcações enfrentam resistência na bancada ruralista, no Congresso, e também em instituições governamentais. Entre estas últimas encontra-se o Comando da Marinha, que teme perder uma de suas bases no litoral fluminense, na Restinga de Marambaia. 

Outra ameaça contra as demarcações está na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3239, proposta no Supremo Tribunal Federal (STF) pelo DEM. Os antigos pefelistas querem que seja anulado o Decreto Federal nº 4887, com o qual o presidente Lula regulamentou, em 2003, o dispositivo transitório da Constituição de 1988 que trata da demarcação de terras de quilombos. Alegam que o presidente não teria poderes para tal ato.

Na opinião do consultor-geral, o novo texto da instrução corrige distorções e pode frear a ação no STF.