DA ENVIADA ESPECIAL A BELÉM
Diretor de pesquisas emérito do Centro de Pesquisa da França, o franco-brasileiro Michael Löwy, 70, radicado há 40 anos no país europeu, defende que a crise do capitalismo fez aumentar o impacto do Fórum Social Mundial e comemora a esquerda política da América Latina.
FOLHA – O Fórum Social Mundial se revitalizou?
MICHAEL LÖWY – Havia a ideia de que o Fórum tinha esgotado seu papel, estava em crise e não tinha mais o que dizer, que o movimento altermundialista [antiglobalização] já tinha acabado e era preciso passar para uma outra. Hoje em dia esse discurso acabou. Está muito clara a vitalidade extraordinária do processo do Fórum, sua capacidade de se reinventar e de avançar em ideias e propostas. Acho que o impacto do Fórum aumentou. Quem está em crise agora é o outro fórum, o de Davos. Seus dogmas foram por água abaixo. O que o Fórum Social Mundial sempre disse, que se precisa de outro mundo, se revelou verdadeiro.
FOLHA – A crise econômica roubou espaço do temas original desse FSM, a Amazônia?
LÖWY – Pelo contrário. Há uma relação entre a crise econômica, a alimentar, a ecológica. Há uma convergência das crises, uma mesma raiz que é um modelo de civilização industrial, capitalista e ocidental em que vivemos.
FOLHA – O FSM não devia propor uma saída?
LÖWY – O fórum é um movimento de protesto. Gente que se reúne para dizer “não”, “não queremos o mundo em que tudo virou mercadoria”, “não queremos um mundo dominado pelo capital”. Há um “não!”, e isso é muito importante, algo precioso e não deve ser minimizado.Mas insatisfação apenas não é suficiente. Há quem diga que o fórum só critica e não propõe nada. Não é verdade.
FOLHA – Um fórum que foge da interferência de governos traz cinco presidentes…
LÖWY – O fórum nunca negou a política, ela está presente. Não queremos é que o fórum seja aparelhado ou instrumentalizado por partidos políticos ou governos. Se a participação de presidentes e políticos acaba sendo o ponto alto, é a ponta visível do iceberg. Lá embaixo é muito maior.
FOLHA – A volta para a América Latina e o contato com suas esquerdas renova o fórum?
LÖWY – A América Latina é onde a tentativa de romper as amarras do neoliberalismo está indo mais longe. Nós temos não só movimentos sociais e forças políticas que colocam essa exigência, mas ao menos três experiências novas -Venezuela, Bolívia e Equador- de governos com grande apoio popular tentando buscar uma alternativa ao Liberalismo e colocando a necessidade de superar o sistema capitalista. Infelizmente não é o caso do Brasil.
FOLHA – O que faltou aqui?
LÖWY – O Brasil deveria ter estado na vanguarda desse processo, porque é o único que tem um grande partido dos trabalhadores e com um dirigente que foi um grande operário e dirigente sindical. É um governo melhor do que os anteriores, mas comparado ao que havia sido a trajetória e histórico do PT, é decepcionante.