Dimensão e velocidade inéditas da queda surpreendem IBGE e analistas; produção de 70% dos itens pesquisados recua
Economistas atribuem resultado à retração nas exportações e no crédito e ao temor dos empresários e consumidores com a crise
PEDRO SOARES
DA SUCURSAL DO RIO
Nunca nem de forma tão rápida a indústria sofreu uma derrocada tão forte como no último trimestre de 2008. Em dezembro, o tombo foi de 12,4% na comparação livre de efeitos sazonais com novembro. Foi a maior queda desde o começo da série histórica do IBGE, em 91.
Em novembro, o índice já havia recuado 7,2%. Em outubro, a queda ficara em 1,4%. Em apenas três meses, a indústria acumulou perda de 19,8%, variação negativa sem precedentes no histórico da pesquisa para período tão curto.
A atual crise bateu com mais força e mais rapidamente na indústria do que a do governo Collor, em 1992, a do México, em 1995, a do racionamento de energia, de 2001, e a da eleição de Lula, em 2002.
“Nunca se viu uma queda tão forte num espaço de tempo tão curto. Desse ponto de vista, o resultado de dezembro surpreende. Houve uma mudança abrupta de cenário”, disse Isabella Nunes, do IBGE.
Na comparação com dezembro de 2007, a retração foi mais intensa: 14,5%, também a maior desde 1991. Com isso, o último trimestre fechou com queda de 6,8% ante o terceiro trimestre e de 9,8% em relação a mesmo período de 2007.
Diante de dados tão negativos, a produção da indústria encerrou 2008 com expansão de 3,1%, taxa modesta se comparada com o crescimento de 6,4% acumulado de janeiro a setembro -antes do recrudescimento da crise. Em 2007, a expansão havia sido de 6%.
Com a queda desde outubro, a indústria voltou a produzir no mesmo patamar registrado em março de 2004. E acumulou recordes negativos de produção em diversos setores -só em 7% deles houve expansão, e 70% dos produtos registraram queda em dezembro.
Para Nunes, o movimento de retração “foi intenso e generalizado”, mas afetou mais os ramos ligados às exportações e dependentes do crédito. Entre eles, estão veículos, máquinas e equipamentos, metalurgia e indústria extrativa -com destaque para o minério de ferro.
“O que se viu em dezembro foi uma paralisia total da indústria. Ninguém imaginava uma queda tão forte”, disse Bráulio Borges, economista da LCA.
Tal retração, segundo ele, ocorreu especialmente na esteira do “medo de empresários de investirem e empregarem, de consumidores de se endividarem e de bancos de emprestarem e não receberem”.
Esse efeito subjetivo, avalia, foi mais importante do que a restrição do crédito e a contração da economia global -fatores que também pesaram no fraco desempenho da indústria, segundo ele. “Todo mundo parou, sentou e resolveu esperar para ver.”
“A indústria acusou com força o golpe em dezembro. A queda foi generalizada e abrupta. É impressionante como a indústria encolheu em dezembro”, diz Rogério César Souza, do Iedi (Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial).
Para o economista Leonardo Carvalho, do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), o quadro de dezembro apontou “para uma parada geral da produção da indústria”, sob efeito principalmente de um elevado nível de estoques.
O acúmulo excessivo de estoques, diz, já havia sido verificado -especialmente na indústria automotiva- no momento em que a crise bateu com mais força no setor fabril. “Foi uma triste coincidência, que resultou nessa queda tão forte.”
Essa conjunção já afeta a saúde financeira das empresas. “Algumas fábricas já começam a ter problemas. É só ver o número de recuperações judiciais, que tem aumentado. Não esperávamos um número tão ruim, só comparável com a época do Collor”, diz Sérgio Vale, da MB Associados.