“Em 1º de abril de 1964, o povo e os trabalhadores brasileiros foram assolados pelo golpe de Estado civil-militar contra a incipiente democracia e as possibilidades de transformação geradas pelas reformas preconizadas pelo presidente João Goulart. O Brasil vivia um processo de efervescência política e cultural. A classe trabalhadora brasileira e os sindicatos alcançaram naquele período um dos seus momentos de mais intensa atividade.
Nas cidades o Comando Geral dos Trabalhadores (CGT), apesar de proibido pela legislação sindical de então, avançava decisivamente na luta e na afirmação dos interesses de classe dos trabalhadores, na defesa das suas reivindicações econômicas e políticas que se materializavam no âmbito da organização sindical nas empresas até a realização de greves políticas. No campo era inconteste o fortalecimento da luta dos trabalhadores rurais pela reforma agrária, que unia as Ligas Camponesas aos milhares de sindicatos de trabalhadores rurais que foram organizados no período. A demanda pelas Reformas de Base (reforma fiscal, bancária, agrária, urbana, trabalhista e política) estabeleceu um programa que unia os trabalhadores do campo e das cidades na luta pela superação da crise econômica que o país enfrentava pela via da conquista de mais direitos e mais democracia política.
Para estancar as aspirações democráticas do povo e dos trabalhadores o golpe de Estado instalou no poder a ditadura militar que perdurou por 21 anos, que submeteu o país ao mais longo período de exceção de sua história republicana, que suprimiu, com base na violência institucionalizada, os direitos democráticos e civis. Os partidos políticos foram extintos, o Congresso Nacional manietado, sindicatos submetidos à intervenção e controle. Foram milhares os cidadãos perseguidos, ameaçados, presos e submetidos à tortura. Muitos foram assassinados, sendo que o terror se abateu especialmente sobre os trabalhadores, pré-condição à implantação da política econômica nociva aos trabalhadores e à nação característica dos consecutivos governos militares, que aprofundou a desigualdade social, a miséria e a violência no país.
Em 1985, por conta da resistência democrática e da luta popular pela redemocratização, marcada pela luta pela anistia, pela Constituinte e pelas eleições diretas, chega ao fim a ditadura militar e reconquistamos um regime de ampla liberdade. Todavia, a transição negociada que prevaleceu no país fez com que os crimes contra os direitos humanos praticados pelos governos militares e seus agentes não fossem punidos até o presente momento. Sobrevive o entulho autoritário da ditadura, como é o caso da Lei de Segurança Nacional. É necessário reconhecer o enorme déficit que o Estado brasileiro acumula para com a sociedade civil no que diz respeito ao estabelecimento da verdade, da memória, da justiça e da reparação relativos ao período ditatorial.
Passados 50 anos do golpe de Estado de 1964, a sociedade brasileira vem se esforçando em divulgar as atrocidades cometidas pela ditadura contra o povo e contra os trabalhadores e para superar seu triste legado. A Força Sindical, junto com as demais centrais sindicais, tem atuado no sentido de reforçar a atividade da Comissão Nacional da Verdade, unidos às seguintes reivindicações:
• Identificação, julgamento e responsabilização de agentes públicos e civis envolvidos em perseguições e torturas;
• Identificação das formas de colaboração publica e privada na repressão aos trabalhadores e ao movimento sindical, julgamento e reparação quando tais fatos forem comprovados, mesmo prescritas em leis trabalhistas;
• Adoção de interpretação da Lei 6683/79 (Lei de Anistia) que seja compatível com a proteção e defesa dos direitos humanos;
• Provimento de recursos necessários do Estado para a execução de sentenças baseadas na Lei 10.559/02 (Lei de Reparação), o que inclui o provimento de recursos à Comissão de Anistia do Ministério da Justiça visando garantir seu pleno funcionamento;
• Revogação imediata da Lei de Segurança Nacional;
• Identificação e supressão da legislação antidemocrática remanescente, inclusive a relacionada à organização sindical;
• Promoção dos valores democráticos no ensino brasileiro, em especial nas escolas e academias militares, e valorização de conteúdos curriculares que expressem o verdadeiro papel da classe trabalhadora na historia do golpe de 64 e da ditadura;
• Desmilitarização das polícias militares;
• Extinção da Justiça Militar;
• Valorização da memória das graves violações dos direitos humanos com ênfase na memória e verdade dos trabalhadores;
• Abertura e concessão das indispensáveis condições que permitam o livre e eficiente acesso a todos os arquivos referentes ao período indicado no artigo 8º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição de 88.
Os trabalhadores continuam na luta por mais democracia e mais direitos. Ditadura nunca mais!”.
Miguel Torres
Presidente da Força Sindical e da CNTM