O Estado de SP
Dados da OCDE revelam que no Brasil os mais ricos detêm renda 50 vezes superior às classes mais pobres, mas que país avança na redução da desigualdade
JAMIL CHADE, CORRESPONDENTE/ GENEBRA
A desigualdade social nos países ricos atingiu seu ponto mais alto em mais de três décadas. O alerta é da OCDE que revela ainda que o Brasil foi o único país dos Brics a começar a reduzir sua desigualdade. Em proporção a seu PIB, o País gasta já mais em política social que os EUA. Ainda assim, os mais ricos no Brasil têm renda 50 vezes superior à classe mais pobre e uma diferença social cinco vezes superior à média dos países ricos.
Os dados avaliam apenas a situação social dos países ricos até 2008, quando a crise econômica eclodiu, e a percepção é de que ela seria ainda pior hoje. Mas, segundo a OCDE, os dados disponíveis já mostram a fadiga do sistema de bem-estar social, mesmo durante anos em que a economia mundial crescia e havia um sentimento de euforia nos mercados.
Em média, a renda dos 10% mais ricos da população é nove vezes superior à média dos 10% mais pobres. Mas o que mais surpreende a OCDE é que a desigualdade também aumentou na Alemanha, Dinamarca e Suécia. Em 1980, a parcela mais rica da população ganhava cinco vezes mais que os mais pobres. Hoje, essa proporção é de seis vezes.
Dos 22 países considerados como ricos, 17 sofreram uma alta de sua taxa de desigualdade social. Em 30 anos, a elevação atingiu até mesmo a Alemanha, Finlândia e Suécia, com alta de 4%.
No Japão, Itália e Reino Unido, a proporção da renda dos ricos é de dez vezes mais que a da camada mais pobre, enquanto Israel e Estados Unidos tem uma taxa de 14 vezes superior. Nos últimos 20 anos, o 1% mais rico da população americana dobrou seu peso no PIB do país, atingindo hoje 17%. Ao mesmo tempo, a camada dos 20% mais pobres passou a representar apenas 5% do PIB americano, contra 7% há 20 anos.
Na Espanha, com a elite com renda 11 vezes superior à classe pobre, a disparidade foi reduzida, assim como ocorreu na Grécia. Mas dados da UE de 2010 e que não fazem parte do relatório da OCDE apontam para uma explosão na desigualdade diante de um desemprego de 22% entre os espanhóis e 17% entre os gregos.
” O contrato social está começando a ser desfeito em muitos países”, alertou o secretário-geral da OCDE, Angel Gurria. Segundo ele, é a desigualdade cada vez maior entre salários que tem gerado essa situação, além de uma crise na capacidade do Estado de bancar a diferença para a classe menos favorecida.
Outro problema seria a carga tributária. A OCDE pede que países ricos aumentem impostos sobre a classe mais rica, justamente para conseguir promover maior equilíbrio nas sociedades. “Não há nada de inevitável nessas taxas”, alertou Gurria.
Além de impostos, a OCDE pede que trabalhadores sejam melhor formados para permitir melhores salários.
Brasil e Brics. Se a desigualdade aumenta na Europa, Estados Unidos e Japão, a OCDE faz amplos elogios aos esforços do Brasil para reduzir as disparidades. Segundo a entidade, nos últimos 30 anos, o Brasil foi o único país dos Brics que viu uma queda da diferença de renda.
Na Índia, 47% da população ainda ganha menos de US$ 1,25 por dia, realidade que já foi praticamente erradicada na Argentina e Rússia. Na China, apesar da explosão da renda, a constatação foi um aumento exponencial das diferenças sociais em um país comunista.
O Brasil não deixa de ser o segundo país mais desigual entre os Brics, superado apenas pela África do Sul. Em meados da década, a parcela dos 20% mais ricos ainda tinham 60% do PIB nacional. Os mais ricos tem uma renda 50 vezes superior aos mais pobres.
Gastos sociais. Mas o Brasil é o único que amplia de forma importante seus gastos sociais. Hoje, o Brasil destina à área social 75% do que um país rico reserva para esses objetivos. Na China, os gastos sociais são de quatro a cinco vezes inferior.
O Brasil destina cerca de 16% de seu PIB a gastos sociais, abaixo da média de 19% dos países da OCDE e bem inferior ainda aos 25% destinados pelos governos escandinavos à área social. Mas os gastos brasileiros já estariam acima dos gastos dos Estados Unidos. O Brasil ainda empata com a Irlanda e fica perto do Canadá.
O maior beneficiário desses gastos sociais tem sido a classe média e mais baixa, inclusive com o incremento do salário mínimo para níveis equivalente a dos países ricos em comparação a seu PIB.
Entre os Brics, a população rural brasileira é a única que teve ganhos, de cerca de 40% desde os anos 90. A situação é bem diferente na China e Índia, onde as desigualdades aumentaram e o acesso a serviços não seguiu o crescimento da economia.
No Brasil, porém, só 30% dos desempregados têm direito a benefícios sociais, ante média de 48% nos países ricos (quase 100% na Alemanha). O Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) é de fato “generoso”, diz a OCDE. Mas, para atingir um número maior de pessoas, o sistema teria de ser refeito.