Por Sérgio Ruck Bueno | De Porto Alegre
Valor Econômico
De La Rosa, presidente, tenta contornar as restrições do governo argentino
A Marcopolo pretende iniciar, até o fim deste semestre, a importação de componentes da Argentina para a produção de carrocerias de ônibus no Brasil. A medida é uma adequação à exigência do governo argentino de que as exportações de uma empresa estrangeira para o país sejam compensadas por importações do mesmo valor, conhecida como a política do “uno por uno”.
A informação foi dada ontem pelo diretor-presidente José Rubens de La Rosa, que também calculou em R$ 40 milhões anuais o ganho potencial da empresa com a desoneração da folha de pagamento a partir de julho. O benefício, incluído no pacote de estímulo à indústria anunciado pela presidente Dilma Rousseff em abril, dará mais competitividade e “musculatura” para a companhia competir no exterior, disse o executivo.
Originário da substituição da contribuição previdenciária patronal sobre a folha por uma taxa de 1% sobre o faturamento no mercado interno, o ganho não será apropriado como resultado pela Marcopolo, acrescentou o diretor-presidente. Segundo ele, a economia ainda vai ajudar a compensar o impacto dos reajustes salariais dos metalúrgicos que serão negociados em maio no Rio de Janeiro e em junho, em Caxias do Sul (RS).
Na Argentina, conforme De La Rosa, representantes da Marcopolo pretendem conversar, nos próximos dias, com integrantes do governo da presidente Cristina Kirchner para ver o que é possível trazer do país para incorporar às linhas de produção no Brasil. A ideia é estabelecer um processo “mais definitivo” de aquisições de peças produzidas pelos fornecedores da subsidiária Metalpar, que fabrica ônibus urbanos na província de Buenos Aires com 100% de conteúdo local, explicou.
Em teleconferência com analistas, o executivo disse que as vendas para a Argentina foram o “destaque negativo” das exportações a partir do Brasil no primeiro trimestre. Apesar disso, classificou de “irrelevante” a influência do país vizinho na queda de 43% nos embarques totais ante igual período de 2011, para 372 unidades, mas afirmou que a empresa estuda “alternativas para fazer frentes às restrições” do governo de Buenos Aires. Dos 2,2 mil ônibus exportados pela Marcopolo em 2011, os argentinos absorveram cerca de 300, basicamente modelos rodoviários.
Também no exterior, a Marcopolo deve definir em até quatro meses um plano de investimento para ampliar de 15 mil para 20 mil carrocerias por ano a capacidade de produção na Índia, onde tem uma joint venture com a Tata Motors desde 2008. Depois disso, mas ainda em 2012, começarão os estudos para elevar a capacidade no país a 40 mil unidades anuais num prazo ainda não definido, em linha com as projeções de crescimento do mercado local.
Segundo De La Rosa, as duas fábricas na Índia estão operando à plena capacidade de 15 mil unidades por ano. A primeira etapa da expansão exigirá apenas investimentos em equipamentos, mas para a segunda fase será necessário ampliar o principal complexo industrial no país, em Dharward (o segundo fica em Lucknow). No primeiro trimestre, a produção local consolidada pela Marcopolo (equivalente a 49% do total), somou 2,1 mil unidades, ante 1,3 mil em igual período de 2011.
O executivo confirmou ainda para o segundo semestre o início da produção de carrocerias na unidade da China (dedicada até agora apenas à fabricação de componentes). Os produtos serão enviados desmontados à Rússia, para montagem final sobre chassis pela OJSC Nefaz, subsidiária do grupo OJSC Kamaz, com quem a fabricante brasileira formalizou uma joint venture comercial em setembro de 2011.
Também no segundo semestre devem iniciar as operações da joint venture com a Twice Investimentos, controladora da concorrente Caio Induscar, programada para produzir componente para o mercado interno e carrocerias para exportação. A unidade deverá ficar na região de Joinville (SC).
No Brasil, a Marcopolo está com a carteira de pedidos preenchida até agosto, patamar semelhante ao observado nesta mesma época do ano passado. Mesmo assim, a empresa ainda pode suportar eventuais novos pedidos com horas-extras na produção, disse De La Rosa.
Segundo ele, as medidas governamentais de apoio à indústria, especialmente a redução dos juros e o aumento do prazo e da cobertura dos financiamentos do BNDES, já estão ampliando a demanda por ônibus com motorização do novo padrão “Euro 5”, com menores níveis de emissões atmosféricas.
Além disso, as obras para a Copa do Mundo de 2014 abrem perspectivas otimistas para o mercado nos próximos anos, especialmente no segmento dos BRT (ônibus de trânsito rápido, na sigla em inglês). “Já fechamos R$ 50 milhões em contratos nesta linha. É um bom início”, comentou De La Rosa.
No primeiro trimestre, o lucro líquido consolidado cresceu 3,4% ante igual período de 2011, para R$ 78,4 milhões. A receita líquida consolidada avançou 15,7%, para R$ 880,7 milhões, mas as receitas financeiras líquidas recuaram de R$ 20,1 milhões para R$ 15,9 milhões no período e comprometeram o resultado.