Confederação Nacional dos Trabalhadores Metalúrgicos

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Mais de 300 grandes obras podem atrasar por falta de crédito no País


Segundo a Abdib, serão necessários R$ 90 bilhões para concluir os empreendimentos de infra-estrutura

Renée Pereira

Hoje o País tem 324 grandes obras de infra-estrutura em construção ou já contratadas (mas não iniciadas) correndo sério risco de atraso por causa da escassez de crédito que assola o mundo. Para serem concluídos nos próximos anos, os empreendimentos vão demandar cerca de R$ 90 bilhões. “Estamos agora concentrados na criação de soluções para evitar que haja descontinuidade das obras e atraso nos cronogramas”, afirma o presidente da Associação Brasileira da Infra-Estrutura e Indústrias de Base (Abdib), Paulo Godoy, responsável pelo levantamento sobre a necessidade de financiamento nas áreas de energia elétrica, ferrovias, rodovias e portos.

Godoy disse que cerca de 70% do volume de recursos deverá sair do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). “Mas esse dinheiro pode ser liberado no início, no meio ou no fim do projeto. Até porque, diante dessa crise, todo mundo passa a contar com o banco para tudo e não tem dinheiro para todos.”

Ele explicou que, para cobrir essa lacuna, os investidores normalmente recorrem a outras fontes de recursos para iniciar obras. Antes, além dos empréstimos bancários, as empresas faziam emissões no mercado de capitais por meio de debêntures, notas promissórias, entre outras modalidades. “Hoje, quem tem capacidade está usando o caixa próprio. Outros estão tentando, com muita dificuldade, fazer empréstimo-ponte. Há ainda aqueles que já fizeram esse tipo de empréstimo e agora precisam repactuar o contrato vencido”, comenta Godoy. Segundo o levantamento da Abdib, dos R$ 90 bilhões, cerca de R$ 57 bilhões ainda não tiveram as obras iniciadas. O restante já está em construção, o que não significa que está livre de limitações.

A espanhola OHL, por exemplo, decidiu recorrer às subsidiárias para garantir os investimentos iniciais nas cinco rodovias federais arrematadas no ano passado. Desde o início, a empresa tenta conseguir financiamento para cumprir o cronograma de obras, que só no primeiro ano soma mais de R$ 700 milhões. Para 2009, será necessário mais R$ 1,2 bilhão.

Segundo fontes, diante das dificuldades do grupo para conseguir crédito no mercado, o BNDES teria dado sinais de uma concessão de empréstimo-ponte no início de 2009. A empresa tem de investir R$ 4,1 bilhões nos primeiros cinco anos de concessão dos 2.078 km de estradas. Mais: por causa dos altos deságios oferecidos no leilão, que chegaram a 60%, a empresa teria de conseguir um financiamento com custo menor para não comprometer a rentabilidade do investimento.

CAUTELA

Quem conseguiu fazer captações antes da crise tem tentado controlar as finanças até que o crédito seja restabelecido. A Eletrobrás, por exemplo, suspendeu a emissão de US$ 400 milhões que faria no mercado externo no mês passado. O dinheiro seria usado para financiar os investimentos das empresas do grupo, como a construção das hidrelétricas de Santo Antonio e Jirau e a Usina de Angra 3.

Outra empresa que preferiu a cautela é a Sabesp. No mês passado, o conselho de administração da empresa aprovou apenas uma das captações planejadas. Antes da crise, a intenção era fazer duas emissões de debêntures, uma de R$ 220 milhões e outra de R$ 300 milhões. Prevaleceu a oferta mais conservadora, que deverá ser concluída em breve. Os recursos serão usados para refinanciar uma emissão que vencerá nos próximos meses.

“Não temos ilusão, essa é uma crise prolongada”, destacou o presidente da Sabesp, Gesner de Oliveira. Embora tenha a garantia de financiamento de alguns organismos multilaterais, ele afirma que o momento exige austeridade. O plano de investimento da empresa referente ao período 2007/2010 é de R$ 6 bilhões.

No setor portuário, os empreendimentos estão ameaçados não só pela falta de crédito, mas também pela expectativa de redução no comércio exterior, afirma o professor da Coppead/UFRJ, Paulo Fleury. Segundo ele, alguns empreendedores estão segurando os projetos para ver se o cenário econômico clareia um pouco.

De acordo com os dados da Abdib, hoje há três portos em construção, no valor de R$ 3,5 bilhões. Mas há planos de mais de R$ 9 bilhões que estão apenas no papel, completa o presidente da Associação Brasileira de Terminais Portuários (ABTP), Wilen Manteli.

FUNDO

Para evitar que a crise comece a afetar de forma irreversível os investimentos, o presidente da Abdib tem conversado com o governo, até mesmo com o presidente Lula, para criar alternativas de financiamento.

Uma das propostas é montar um fundo de investimento de R$ 10 bilhões com recursos da Caixa Econômica Federal, fundos de pensão, fundos de investimentos e bancos. Com o dinheiro levantado, o fundo compraria papel lançado por projetos, como debêntures, notas promissórias, por prazos entre 12 a 18 meses.

Ele explica que, até o momento, as empresas têm conseguido manter as obras. “Mas tudo tem um limite, especialmente porque esse é um setor intensivo em capital. Uma hora as empresas não vão ter mais caixa para levar a obra adiante. Precisamos nos prevenir.”