Fundos que no passado permitiram compra de ações da estatal com o FGTS estão proibidos de receber recursos e cotistas
Contrariando sugestão da Fazenda, nem empregando recursos próprios cotistas de fundos de privatização podem elevar participação
SHEILA D´AMORIM
FERNANDA ODILLA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Sem mudança da legislação em vigor, os trabalhadores que usaram seu FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) para investir na Petrobras não poderão participar da nova oferta de ações a ser promovida pela empresa.
A operação, que o governo Luiz Inácio Lula da Silva quer iniciar em 2010, tem o objetivo de atrair recursos para a exploração das novas reservas de petróleo na região do pré-sal e será exclusiva para os atuais acionistas -a União, que pretende ampliar sua fatia na empresa, e os sócios minoritários.
Para esses investidores, é uma oportunidade de ampliar os recursos aplicados na estatal e, consequentemente, as chances de lucro.
Ao contrário dos demais acionistas minoritários da Petrobras, os trabalhadores que compraram ações com dinheiro do FGTS não terão o direito de participar do aumento de capital da empresa nem mesmo usando recursos próprios, alternativa sugerida na semana passada pelo ministro Guido Mantega (Fazenda).
Isso porque eles estão vinculados a fundos de investimento, chamados de fundos mútuos de privatização, criados especificamente para viabilizar a aplicação de parte do FGTS em ações da Petrobras.
Esses fundos não podem receber mais recursos, e muito menos novos cotistas.
Na prática, o acionista da empresa é o fundo de investimento em que o trabalhador aplicou parte do seu FGTS. E são esses fundos que deveriam fazer o aumento de capital para acompanhar o aporte anunciado pelo governo. Para isso, precisariam de novos recursos.
O problema é que, de acordo com a instrução normativa da CVM (Comissão de Valores Mobiliários) que regula o funcionamento desses fundos, a política de investimento é muito restrita.
Segundo Daniel Walter Maeda Bernardo, da gerência de Registros e Autorizações da CVM, isso ocorre porque a normatização desses fundos atendeu a um ciclo de privatizações.
“Agora, os fundos estão em fase de manutenção. Estão sujeitos à saída de recursos, e não à entrada”, diz. “Do jeito que está [a instrução normativa], esses fundos não admitem recursos novos nem cotistas. Não há essa previsão na regulamentação. Eles já cumpriram seu papel”, completa.
O texto da instrução, que data de 1998, é bem específico e diz que os fundos serão destinados “à aquisição de valores mobiliários no âmbito do PND (Programa Nacional de Desestatização)”, mediante aprovação do Conselho Nacional de Desestatização. Só isso já representa uma limitação, na avaliação de especialistas, dado que a nova operação não se trata de privatização, mas de capitalização de empresa.
A regulamentação determina ainda que as cotas dos trabalhadores sejam formadas “exclusivamente” por “recursos provenientes de conversão parcial dos saldos do FGTS”.
Uma forma que poderia ser usada para tentar driblar essa restrição, segundo o ex-presidente da CVM Luiz Leonardo Cantidiano, seria o fundo fazer uma “cessão de direito” para os seus cotistas.
Com isso, em vez de o fundo participar da capitalização, o trabalhador o faria. No entanto, a alternativa é questionada, e sua aplicação prática colocada em dúvida, porque dependeria de uma aprovação dos participantes do fundo em assembleia.
“Mesmo que isso fosse possível na teoria, na prática, é inviável”, avalia Bernardo. “São fundos muito pulverizados, e convocar uma assembleia que seja representativa é muito difícil.”
Em audiência no Congresso, o presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli, foi direto. “Há uma contradição, mas a lei [que regula os fundos] não permite que os fundos aumentem a participação na Petrobras. Não se pode alterar a condição original. O fundo não pode e o cotista também não”, disse aos deputados defensores do uso do FGTS na abertura de capital da companhia.