Edição de domingo, 6.9.09, página 10A
Mais de 100 mil trabalhadores em SP cumprem carga de 40 horas semanais antes mesmo da mudança na lei
Luciele Velluto, luciele.velluto@grupoestado.com.br
Enquanto se discute a redução da jornada de trabalho de 44 horas semanais para 40 na Câmara dos Deputados, em Brasília, essa carga não é novidade para pelo menos 100 mil trabalhadores no Estado de São Paulo. Os metalúrgicos das montadoras de veículos e os químicos do setor farmacêutico são duas categorias que já têm a jornada menor assegurada por convenção coletiva.
Desde 2000, os trabalhadores das montadoras têm jornada reduzida e, segundo os sindicatos da categoria, as contratações na área aumentaram 12% após a adoção da nova carga horária. São cerca de 60 mil trabalhadores nesta situação no Estado.
No setor farmacêutico, que emprega 40 mil pessoas em São Paulo, a jornada de trabalho em 40 horas foi adotada este ano. As empresas com 100 trabalhadores ou mais estão no novo regime desde janeiro. Já as micro e pequenas empresas desse setor começaram a cumprir a carga reduzida no dia 1º deste mês. Segundo os dirigentes sindicais da área, os impactos da mudança ainda não foram mensurados. Mas garantem: a redução da jornada não resultou em demissões.
Além dos acordos por categoria, existem vários casos de empresas que negociaram individualmente a redução da jornada com os sindicatos. No setor de tintas, por exemplo, boa parte das empresas já trabalha no regime de 40 a 42 horas. No setor de autopeças algumas empresas adotam a jornada das montadoras.
E há expedientes ainda menores, como no caso dos bancários em funções de caixa e escriturário,que cumprem 30 horas semanais – nas outras funções, a jornada é de 44 horas. Mas os trabalhadores do ramo financeiro – 450 mil no País, com mais de 50% desse total em São Paulo – querem reduzir a jornada para todos os empregados do setor para 25 horas por semana.
Os deputados federais da bancada trabalhista articulam para 7 de outubro – dia mundial do Trabalho Decente – a votação em plenário da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 231/95, que reduz a jornada legal de trabalho de 44 para 40 horas semanais para todos os trabalhadores no País.
A proposta, que já foi aprovada na Comissão Especial da Câmara, também eleva o valor da hora extra dos atuais 50% de adicional sobre a hora normal para 75%, uma tentativa de inibir as empresas de esticarem a jornada além do período legal. Segundo levantamento da empresa de recursos humanos Catho, a jornada média efetiva (jornada legal mais hora extra) do brasileiro é de 45,6 horas por semana, sendo 44 para mulheres e 47,2 para homens.
Nesse debate, os empregadores não se posicionam contra a redução de jornada, mas não a querem definida em lei. Já os trabalhadores querem a mudança na Constituição Federal de 1988, que reduziu na época de 48 para 44 horas semanais. Nesta página, veja os argumentos dos dois lados.
Brasil está entre os que mais trabalham
A jornada de 44 horas semanais coloca o Brasil entre os países com maior carga horária, apontam dados da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Na China, por exemplo, a lei permite 40 horas semanais. Contudo, o país não tem controle rígido sobre as horas extras, o que faz a jornada efetiva ser muito maior.
Um dos países nos quais os trabalhadores brasileiros mais se espelham quando o assunto é a jornada é a França, que hoje tem uma carga de 35 horas semanais. O presidente global da consultoria de gestão de recursos humanos Great Place to Work, José Tolovi Junior, conta que, quando o tempo semanal de trabalho foi reduzido, a economia da França melhorou visivelmente. “Com mais tempo livre, as pessoas passaram a consumir mais produtos e serviços, o que movimentou a economia. O aumento de demanda, acabou gerando mais empregos.”
No entanto, houve perda de competitividade das empresas francesas e hoje há quem defenda naquele país a volta das 39 horas que eram praticadas no fim da década de 90. Atualmente, a França permite a negociação entre empresas e sindicatos de jornadas além da legal por meio das horas extras, que têm 10% de adicional sobre uma hora normal. A jornada efetiva no país é de 38,4 horas semanais, segundo a Fundação Europeia para a Melhoria das Condições de Vida e de Trabalho (Eurofound).
Para Tolovi, a jornada no Brasil é excessiva. “É um exagero o que se trabalha no Brasil. De seis a oito horas por dia seria razoável, mas em muitos cargos e setores se trabalha mais que isso”, afirma.
Entre os países europeus, a Alemanha lidera entre aqueles com maior carga horária efetiva de trabalho, com 41,2 horas semanais. Isso porque grande parte dos alemães fazem hora extra, já que a jornada legal no país é de 38 horas por semana.