“Dizem que Carlos Lacerda não ia a velório porque o morto era sempre a figura de destaque e não ele.
Minhas razões para não ir são outras: os que partem são como se me traíssem.
Não fui ao velório do Gushiken, mas senti muito a sua morte.
E preferi lembrar-me dele como o conheci, com dúvidas a respeito da acentuação do seu nome, presidente do Sindicato dos Bancários de São Paulo e grande estrategista- junto com o Eriberto, da Federação dos Bancários, que também já se foi- da greve dos bancários de 1985, a maior até então de uma categoria profissional.
Foi uma greve preparada em todos os pormenores e destinada a quebrar a empáfia da bancada patronal e obter vitória. Eram anos impetuosos.
Logo no início os banqueiros firmaram um termo de compromisso em que admitiam negociar lealmente, “até a exaustão”. Este documento foi elaborado pelo Barelli, pelo advogado Tomas de Aquino e pelo jornalista Fred Pessoa e balizou todo o processo de negociação, fortalecendo a tese da legalidade da greve.
Em cada etapa das negociações os jornalistas eram admitidos, e com isso os bancários ganharam a simpatia da mídia, até a histórica edição laudatória da revista Veja.
Gushiken e Eriberto eram obcecados pelos pormenores de um acordo. Estávamos instalados na sede da Federação e os dois passavam a noite a contabilizar todas as cláusulas, extraindo das diversas hipóteses o somatório resultante em termos de valores finais, até que se chegasse ao “número mágico”.
Quando os dois ou três dias de greve nacional provocaram o Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo, que tergiversou sobre a legalidade da greve, mas endossou as reivindicações dos bancários, Gushiken e Eriberto souberam comemorar a vitória juntos, ali mesmo no tribunal e logo em seguida na Praça da Sé.
No ano seguinte, Gushiken tentou novamente. Apoiado pela secretária estadual do Trabalho, Alda Marco Antonio, não conseguiu o sucesso de 1985. Mas lá estava ele- me lembro e o vejo- com aparelho no pescoço para mitigar os incômodos de uma artrite, ou coisa que o valha.
Fomos amigos intermitentes; ele se foi, como homem honrado e deixa saudade”.
Por João Guilherme Vargas Neto, consultor sindical