Confederação Nacional dos Trabalhadores Metalúrgicos

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Força pretende recuperar no segundo semestre a parte do salário que se perdeu


 

 
Davilyn Dourado / Valor
“Não vamos apoiar quem não gosta de sindicato”, afirma Miguel Torres

Valor: A descentralização das festividades do Dia do Trabalhador está mais relacionada ao cenário de crise ou à aproximação das campanhas de sucessão presidencial?

Miguel Torres: Em São Paulo são 14 eventos e em mais 22 Estados, mas sempre houve várias festas, talvez não em um número tão grande. A ideia é mostrar que os sindicatos estão atentos à crise e vão ajudar os trabalhadores. Não vamos perder as bandeiras. A bandeira da redução da jornada continua, está no Congresso o projeto do senador [Paulo] Paim [PT-RS] e estamos fazendo toda a ação necessária para colocar isso em destaque. Continua a pressão para que a Convenção 158 da OIT, que coibe a demissão imotivada, seja ratificada. A bandeira pelo aumento real do salário mínimo também será mantida.

Valor: E em relação à sucessão presidencial?

Miguel Torres: A nossa central é apartidária. Ela tem sindicatos filiados de diversos partidos. Sempre deixamos essa decisão para uma época mais próxima das eleições. Mas com certeza vamos ficar do lado daquele que estiver mais próximo do trabalhador, que seja mais identificado com ele. Tem candidato que não gosta nem de dar a mão para o trabalhador, esse não tem nem como apoiar. A Dilma [Roussef] é uma boa pré-candidata, é muito acessível, mas ainda é prematuro falar. O que posso te dar é um perfil do candidato. Não vamos apoiar quem não gosta de sindicato e não está do lado dos trabalhadores. Não vamos entrar em canoa furada, até porque uma posição errada pode ajudar a eleger um político que pode no próximo governo tirar direitos dos trabalhadores. Serra e Aécio nós conhecemos. São Muito difíceis. Não dá ainda para tecer nominalmente quem vamos apoiar.

Valor: A Força mantém as bandeiras defendidas em anos anteriores, mas pode-se dizer que as demandas não-econômicas perderam força diante do cenário de crise?

Miguel Torres: Temos que avaliar o momento. Este é o momento para garantir emprego. Onde fizemos acordo garantindo estabilidade e emprego do trabalhador nós acertamos. Porque se não tivéssemos feito nada em janeiro, com certeza hoje os trabalhadores estariam desempregados. Garantimos o emprego no primeiro momento. Com a recuperação da economia, vamos buscar o que emprestamos para a empresa, porque trabalhamos a redução da jornada e do salário como um empréstimo. A reivindicação para o segundo semestre é recuperar a parte do salário que se perdeu. E não vamos abrir mão do aumento real de salários nas campanhas salariais.

Valor: Como o sr. avalia a atuação das centrais em relação à crise?

Miguel Torres: O papel das centrais aumentou na crise, porque canalizou para as centrais a defesa do emprego. As centrais buscaram o governo, que sempre esteve aberto aos pleitos. Num jantar com o presidente Lula no fim do ano passado, ele discutiu algumas medidas. Houve demora na implantação dessas medidas. O que havia se falado sobre redução da Selic e do spread bancário, não foi feito no fim do ano, só a partir de janeiro. O papel da central é buscar alternativas a essas questões. Temos feito reuniões com ministros de diferentes áreas para buscar soluções setoriais. A questão das medidas para a linha branca, para o setor automotivo, tudo isso foi discutido.

Valor: O reconhecimento legal das centrais no ano passado mudou essas relações com o governo?

Miguel Torres: Nas relações com o governo não houve mudanças porque as centrais sempre foram reconhecidas. O que melhorou foi a visibilidade e a oportunidade de fazer mais coisas. Com o recurso do FAT, ela pode fazer cursos, formar os dirigentes, atuar mais. A Força vai discutir o que será feito com o recurso deste ano em agosto.

Valor: O projeto para substituir o imposto sindical pela contribuição negocial, previsto na lei que legalizava as centrais, foi abandonado?

Miguel Torres: O projeto está andando, é que o trâmite demora um pouco no Congresso. Essa é uma questão que está pendente. Na realidade as contribuições não eram para a central, a central fica apenas com uma parte. A questão principal é a contribuição dos sindicatos. É uma preocupação maior para os sindicatos que para as centrais.

Valor: O número de sindicatos filiados à Força aumentou consideravelmente de setembro para cá. A crise fortaleceu o movimento sindical?

Miguel Torres: A crise ajudou muito os sindicatos que realmente têm atividades. O Sindicato [dos Metalúrgicos] de São Paulo, por exemplo, enfrentou o momento de peito aberto e isso fortaleceu a categoria. O sindicato que lutou se fortaleceu. No caso das centrais, com a legalização e o momento de crise, os sindicatos que não eram filiados ficaram isolados e começaram a procurar a central com que mais se identificavam. Isso ajudou a Força. Até o fim do ano a Força vai passar de 1,5 mil sindicatos filiados.

Valor: Os efeitos da crise global sobre o mercado de trabalho surpreenderam a central?

Miguel Torres: Na nossa avaliação essa é uma crise setorial, não é como nos Estados Unidos e Europa, que pegou o sistema financeiro e se generalizou. Ainda não dá para saber para que setores a crise ainda vai migrar. Com certeza chegou ao setor de carnes. Há milhares de trabalhadores sendo demitidos. Outro setor que deve ter piora agora é o de máquinas. No setor automotivo, as medidas tomadas pelo governo começaram a surtir efeito. As autopeças também começaram a sair da crise. Os acordos de redução terminaram e não surgiram pedidos de retomada dos acordos, exceto no caso de pequenas empresas. Um setor que estava entrando na crise, que era o setor de linha branca, também deve ter melhora com a redução do IPI.

Valor: No caso do setor de máquinas, já existe procura das empresas para fazer acordos?

Miguel Torres: Quem nos procurou foi Abimaq [Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos]. A entidade patronal nos procurou, trouxe dados sobre o desempenho nacional do setor. Os investimentos no setor ainda estão paralisados, mas o grande problema que havia era uma portaria do Ministério do Desenvolvimento que reduzia a taxação sobre a importação de máquinas usadas. Conseguimos junto com a CUT falar com o ministro [do Desenvolvimento] Miguel Jorge e fazer um acordo para que haja a liberação, mas com controle. Senão, a importação de máquinas vai tirar empregos no Brasil. Para a questão do setor de máquinas usadas, achamos uma saída.

Valor: Na avaliação da Força Sindical, a pior fase da crise para o mercado de trabalho já passou?

Miguel Torres: Acreditamos que o pior já passou. O governo tomou medidas e sinalizou com isso que vai enfrentar a situação. E abriu espaço para setores e centrais definirem junto com o governo alternativas para a crise. Há perspectiva de melhora. Talvez não vamos voltar aos níveis de 2008, mas com certeza a economia não será o desastre que muitos economistas estavam pregando. Nossa política econômica estava sólida e isso ajudou. Mas ainda temos que corrigir algumas coisas, como baixar mais a Selic e o spread bancário, desonerar a folha de pagamento ou dar alívio fiscal a alguns setores para sair logo da crise.