Por João Guilherme Vargas Netto
Refletindo sobre a inacreditável ausência do tema sindical no simpósio internacional da USP sobre os 100 anos da revolução russa constato que tal desprezo é uma deformação presente nas produções acadêmicas aqui no Brasil e no mundo.
A categoria “trabalho” foi evacuada no dia-a-dia do pensamento neoliberal hegemônico, seja nas pesquisas acadêmicas, seja na cobertura midiática, seja na literatura e nas artes e, sobretudo, no mundo econômico. O trabalho perdeu a centralidade nas teorias correntes e na ideologia dominante.
Uma consequência disso é o abandono dos sindicatos como entidades fundamentais no arranjo societário capitalista. O pensamento hegemônico culturalista e individualista despreza a ação coletiva dos sindicatos, organizações históricas de resistência dos trabalhadores.
Há muitas razões justificativas de tal alienação, mas seus efeitos convergem para uma visão deformada da vida em sociedade ofuscando o papel dos trabalhadores e de suas organizações. O descaso com os sindicatos, sua subestimação e até mesmo o ódio a eles é a contrapartida do abandono do trabalho, principalmente do trabalho industrial, como categoria estruturante de pensamento pós-moderno.
Em 2007, John Womack Jr editou em espanhol pelo Fundo de Cultura Econômica do México o seu importante livro sobre a posição estratégica e a força dos trabalhadores. Ao descrever nele as formas de fazer a história dos trabalhadores, Womack registra que “os historiadores acadêmicos se interessam agora em quase qualquer coisa que não seja o trabalho industrial”.
Para demonstrar isto recorre às aquisições da biblioteca da universidade de Harvard nos últimos dez anos: mais de duas vezes sobre gênero que sobre trabalho, 18 vezes mais sobre sexo que sobre trabalho industrial e um terço mais sobre pornografia que sobre trabalho industrial.
Provocadoramente afirma que “resulta absurdo que careça de interesse estudar a história da atividade necessária para que ocorra qualquer outra história humana. É histórica e materialmente interessante o fato de que a espécie se extinguiria muito mais rapidamente sem trabalho do que sem copulação”.