SÃO PAULO – O desemprego deverá ser um dos pontos centrais nos debates das eleições presidenciais de 2010, avaliam cientistas políticos. Se não há incertezas em relação ao crescimento do desemprego nos próximos meses, a dúvida reside na percepção da população sobre a quem cabe a responsabilidade desses resultados ruins.
Independentemente do fato de a crise ter sido gerada nos países desenvolvidos, para o sociólogo e cientista político Carlos Melo, do Ibmec São Paulo, a responsabilidade pelo avanço do desemprego recairá sobre a administração do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e, consequentemente, sobre a candidatura do governo federal, provavelmente personificada pela ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff.
“A ministra Dilma não só é do governo, como é das pessoas mais importantes do governo. Hoje é certamente o segundo nome do governo em termos de importância política e poder.”
A opinião é compartilhada pelo cientista político e integrante do Movimento Voto Consciente Humberto Dantas. “A Dilma é uma candidata absolutamente associada ao governo”, apontou.
Mesmo que o desemprego se concentre no Estado de São Paulo, governado pelo presidenciável tucano José Serra, não haverá uma partilha da culpa entre o governo federal e o estadual. Para Melo, a população tem clareza de que política econômica é responsabilidade do governo federal, embora a ação dos governos estaduais possa ser importante neste momento. Neste cenário, o sociólogo da Ibmec acredita que Serra ficará numa situação “conveniente”. “O ônus tende a ficar todo com o governo federal, e o bônus de ter feito algo, de ter tentado combater com os recursos de que dispõe, como as obras que Serra tem prometido, fica com ele.”
A despeito desse fato, Humberto Dantas avalia que o debate tem tudo para ficar pesado. Ele acredita que o governo federal não ficará parado e tentará culpar o governo de São Paulo pelo aumento do desemprego no estado. “O aumento do desemprego em São Paulo não pode ser vinculado ao Serra, mas certamente este será um dos pontos que farão parte do discurso da candidatura do governo federal”, pontuou.
A favor do governo federal estão a gestão econômica e o poder “assustador” de comunicação de Lula, que explicam seus altos índices de aprovação. Para Dantas, o governo federal tem muito mais facilidade do que a oposição para transmitir à população os efeitos da crise sobre o País, o que dificulta um debate técnico.
Por outro lado, se a oposição não tem, nos quadros de PSDB e DEM, um candidato que detenha o “discurso da simplicidade”, o aumento do desemprego facilita o trabalho de tucanos e democratas. “A oposição teria aí uma bandeira bastante popular para empunhar”, pontuou Melo.
Mercado de trabalho
O desempenho do mercado de trabalho promete ser um desafio para a popularidade de Lula. Analistas avaliam que a taxa de desemprego e a informalidade tendem a prosseguir em elevação, ainda que os efeitos da recessão em curso não sejam tão devastadores como em 2003. O consenso é que o cenário favorável do ano passado foi deixado definitivamente para trás no governo atual.
“O ano de 2008 pode ter sido o ano de ouro do emprego e da renda no governo Lula”, observa o economista-chefe da MB Associados, Sérgio Vale.
“Vai haver aumento da informalidade e do desemprego”, acrescenta o professor e economista da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) e da Opus Gestão de Recursos, José Márcio Camargo.
Ariadne Vitoriano, analista da Tendências Consultoria, acredita que os dados do mercado de trabalho serão “muito ruins” no primeiro trimestre deste ano, deixando “resquícios” para o segundo trimestre, mas, apesar da perspectiva de desaceleração dos bons resultados do ano passado, os efeitos da crise “não devem ser tão devastadores” como os observados em 2003.
No primeiro ano do governo Lula, a taxa de desemprego disparou, a informalidade aumentou e a renda caiu significativamente. Na divulgação dos dados do mercado de trabalho de janeiro de 2009, o gerente da pesquisa mensal de emprego do IBGE, Cimar Azeredo, chegou a comparar o cenário atual com 2003 e assinalou que nem mesmo naquele momento recessivo houve um salto tão forte na taxa de desemprego quanto o de janeiro deste ano.
O alerta é para o perigo de que o governo, temendo os impactos da crise no mercado de trabalho e, em consequência, na avaliação presidencial, possa tomar medidas “inadequadas, como a de aumentar o seguro-desemprego para alguns setores apenas”.