FONTE: Valor
Entre as categorias com data-base em setembro, predomina a impressão de que os patrões não têm pressa para fechar os termos dos acordos e que esperam por uma melhor definição do cenário eleitoral.
Além disso, as contrapropostas feitas nas últimas semanas estão entre as piores dos últimos anos, com índices que não alcançam nem a inflação. As convenções coletivas fechadas nos meses anteriores montam um quadro de reajustes mais heterogêneo, em que há casos sem aumento real e de correções de 2,5% acima da Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC).
As 12 entidades ouvidas pelo Valor representam cerca de 1,3 milhão de trabalhadores do ramo metalúrgico – para efeito de comparação, a cadeia automotiva emprega no país, direta e indiretamente, 1,5 milhão de pessoas, de acordo com o Ministério do Desenvolvimento. Para elas, a conjuntura neste ano, assim como em outros períodos de baixo crescimento, não tem ajudado nas discussões com as empresas.
Para confrontar argumentos usados pelas empresas – estagnação da atividade e queda da produção do ramo automotivo -, os sindicatos recorrem ao saldo de demissões do setor, que já teria aliviado as folhas de pagamento, e os investimentos previstos pelas montadoras para os próximos anos.
Para o presidente da Federação dos Sindicatos Metalúrgicos (FEM) da CUT de São Paulo, Valmir Marques da Silva, o Biro Biro, essa tem sido a negociação salarial mais difícil desde que assumiu a presidência da entidade, em 2007.
“Eles nunca tinham feito uma proposta que não contemplasse pelo menos a inflação”, disse, referindo-se aos 4,5% oferecidos pelo sindicato patronal no fim do mês passado para os dois primeiros grupos de negociação. Entre os sindicatos representados pela FEM, que não divulga o reajuste pedido durante as campanhas salariais, estão o dos metalúrgicos do ABC, Taubaté e São Carlos.
A federação entregou a pauta de reivindicações mais cedo neste ano, no dia 16 de junho, para tentar antecipar o fechamento do acordo e evitar que a campanha se estendesse até o início da disputa eleitoral. Segundo Biro Biro, as entidades patronais adiaram várias rodadas de negociação e parecem não ter pressa em definir os aumentos.
Na tentativa de fechar o acordo até a data prevista para o primeiro turno, 5 de outubro, os sindicatos têm intensificado as mobilizações e preparam uma agenda de paralisações para as próximas semanas.
Também com data-base em setembro, os sindicalistas de Betim (MG) propuseram correção de 11% nos salários, cerca de 4,3% de ganho real. A primeira contraproposta do sindicato patronal veio em patamar bastante inferior, com 4% de aumento nominal em setembro e mais 1% em março.
“Eles estão enrolando para decidir só quando souberem quem vai ser o próximo presidente”, diz João Alves de Almeida, dirigente do sindicato. Aos empresários que se queixam dos pátios cheios, ele lembra o investimento de R$ 7 bilhões que a Fiat prevê realizar em unidade da montadora no interior de Minas Gerais. “Eles não estariam ampliando a fábrica se achassem que não iriam mais crescer”, argumenta.
Os metalúrgicos de Campinas, por sua vez, pedem 12,98% de aumento nominal, com 5,7% de ganho real. A campanha da cidade do interior paulista é unificada com a de São José dos Campos, onde a General Motors anunciou recentemente o “layoff” de 930 pessoas.
Jair dos Santos, presidente do sindicato, afirma que ainda não houve discussão sobre as cláusulas econômicas com as entidades patronais. Segundo ele, algumas empresas tentam arrastar a negociação pelo menos até uma definição mais clara da disputa eleitoral, que deve influenciar as decisões de investimento no médio prazo.
“A Honda [em Sumaré] e a Toyota [em Sorocaba] estão produzindo normalmente, a Chery acabou de abrir as portas em Jacareí. Concordamos com os patrões que o ano é mais difícil, mas não podemos dizer que todo o setor está em crise”, afirma o sindicalista.
Na lista de acordos fechados no primeiro semestre, os maiores reajustes vêm muitas vezes de cláusulas de anos anteriores. No caso dos metalúrgicos de Camaçari (BA), onde funciona uma fábrica da Ford, o reajuste com alta de 2,5% acima da inflação foi fechado em 2013, em acordo de dois anos. “Pulamos essa fogueira”, brinca o presidente do sindicato, Julio Bonfim, referindo-se à conjuntura mais adversa para a negociação.
Os metalúrgicos da região metropolitana de Curitiba, por sua vez, garantiram em 2012 aumento real de 2,8% ao ano até 2014 para os funcionários da Volkswagen de São José dos Pinhais. Com a Renault, o acordo firmado em março deste ano – também válido por três anos – prevê 2,5% de reajuste acima da inflação. A Volvo definiu percentual semelhante em março, mas apenas para 2014.
Os metalúrgicos do Sul Fluminense, por outro lado, não tiveram aumento real neste ano e no ano passado. Em maio, quando os sindicalistas estiveram na PSA Peugeot Citröen, na cidade de Porto Real, para uma das etapas de negociação da campanha salarial, a multinacional anunciou a abertura de um plano de demissão voluntária que cortaria 622 vagas, o equivalente a um dos turnos da unidade.
“Ficou difícil pedir aumento real”, diz André Aquino, membro do sindicato. O presidente da entidade, Renato Soares, afirma que as dificuldades, além das restrições argentinas à importação de automóveis, vêm também da baixa participação das marcas da montadora no mercado nacional, entre 4% e 5%, contrariando as expectativas postas quando a fábrica foi inaugurada, em 2001, de 9%.
O PIB negativo do segundo trimestre, para o presidente da Força Sindical, Miguel Torres, deve aparecer com frequência nas reuniões das próximas semanas. “Vamos lutar pelos aumentos reais, mas um cenário como esse cria um clima ruim.” A central reúne 54 sindicatos de metalúrgicos – inclusive o de São Paulo e Mogi das Cruzes -, quase 750 mil trabalhadores, a maioria em empresas de autopeças.
O coordenador de relações sindicais do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), José Silvestre de Oliveira, lembra que, apesar da desaceleração da atividade neste ano, os reajustes salariais do primeiro semestre foram maiores do que no mesmo período do ano passado. Levantamento feito pelo Dieese em 340 acordos e convenções de diversas categorias apurou reajuste médio entre janeiro e julho de 1,54%, contra 1,08% no primeiro semestre de 2013.
“As expectativas para este ano são ruins, especialmente em relação ao setor metalúrgico, com as férias coletivas, mas os reajustes não se comportam necessariamente como o PIB”, diz Oliveira.
Procurado, o Sinfavea, sindicato que representa as montadoras, preferiu não se manifestar. O Sindipeças, que reúne as empresas de autopeças, não retornou o pedido de entrevista.