Confederação Nacional dos Trabalhadores Metalúrgicos

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Crise tira emprego de brasileiros no exterior


Redução de 30% nas remessas de dólares reflete perda de renda

 

Fernando Nakagawa, BRASÍLIA

 

O noticiário dos últimos dias mostra que, para o Brasil, o pior da crise financeira já pode ter ficado para trás. A economia dá sinais de reação, dólares retornam ao País e muitos começam a pensar no pós-crise. Mas para 4 milhões de brasileiros, a luz no fim do túnel parece distante: são as pessoas que deixaram a família e cruzaram as fronteiras para trabalhar no exterior. Com a crise, o volume de dinheiro que esses trabalhadores enviam para suas famílias no Brasil teve, no primeiro trimestre, a maior queda da história.

 

Segundo dados do Banco Central, o volume de remessas feitas por esses trabalhadores entre janeiro e março de 2009 caiu 31,5% na comparação com o último trimestre de 2008, o maior recuo entre trimestres da série iniciada em 1995. Ao todo, foram enviados US$ 592 milhões, no mais baixo valor para um primeiro trimestre desde 2006. Na comparação com igual período de 2008, a redução foi de 14,6%.

 

A crise, que começou no mercado imobiliário dos EUA, prejudicou brasileiros em todas as partes. Do Japão, as remessas dos dekasseguis caíram para US$ 137,2 milhões entre janeiro e março, valor 37,7% menor na comparação com o fim de 2008 e o pior trimestre desde 2004. Dos EUA, as transferências despencaram 24,8%, para US$ 268,4 milhões, no mais fraco trimestre desde 2003.

 

Os dados oficiais demoraram a mostrar o efeito da crise. Nos últimos meses do ano passado, quando a crise mostrava sua face mais dramática com o fechamento de milhares de postos de trabalho, os números do BC sobre as remessas acabaram sendo inflados com o retorno ao Brasil de muitas famílias que perderam o emprego. A volta forçada para casa incluiu as últimas transferências desses desempregados, que enviavam tudo o que haviam economizado no exterior. Agora, após mais de seis meses do agravamento da crise, as tendências começam a ficar mais claras.

 

“Em outubro e novembro, o movimento foi caótico com o anúncio de muitas demissões. Em dezembro, houve uma certa estabilização. Mas desde janeiro, a coisa voltou a piorar e o volume de transferências já caiu cerca de 30%”, diz Laércio da Silva, diretor da Minas Transfer, pequena empresa de remessas em Londres.

 

Ele explica que os brasileiros que vivem na capital britânica costumavam enviar dinheiro às famílias até três ou quatro vezes por mês, conforme o pagamento semanal era recebido. “Agora, normalmente o dinheiro só é enviado uma vez por mês para pagar as contas básicas da família e as dívidas. O dinheiro que eles enviavam para fazer poupança no Brasil praticamente desapareceu”. Silva atende principalmente brasileiras que fazem faxina em casas e escritórios e brasileiros que vivem da entrega de documentos, encomendas e comida pronta.

 

“Quem trabalha com faxina viu a demanda cair porque muitos ingleses perderam o emprego e eles passaram a reduzir essa despesa. Se uma pessoa fazia até quatro faxinas por dia, agora faz no máximo uma, duas”, diz. Já para os entregadores, a crise derrubou o número de encomendas. Curiosamente, um dos principais serviços dos chamados ?couriers? brasileiros era, antes da crise, levar contratos imobiliários de um lado para o outro da cidade.

 

No Brasil, mas com um pé nos EUA, Governador Valadares (MG) vive uma realidade distinta dos demais municípios brasileiros. Estimativas não oficiais citam que até 50 mil habitantes deixaram a região para trabalhar no exterior, o que corresponde a cerca de um quinto da população da cidade.

 

“Na semana passada, saí pela cidade e é visível como diminuiu o fluxo de pessoas nas ruas e, infelizmente, já temos várias lojas com placa de ?aluga-se? ou ?passa-se o ponto?. E há menos de um ano era difícil conseguir um lugar para abrir uma loja no centro da cidade”, diz o presidente da Associação Comercial de Governador Valadares, Edmilson Soares dos Santos.

 

Levantamento informal da Associação Comercial mostra que famílias que têm integrantes no exterior têm recebido, em média, US$ 400 mensais.

 

No auge do bom momento da economia americana, em 2005 e 2006, o valor rondava US$ 1.000 por mês. “Essa realidade dura tem feito muita gente voltar. O problema é que a economia da cidade, que sempre foi muito dependente desses dólares, ainda não está preparada para andar sozinha”, diz Edmilson.

 

O drama causado pela crise na vida de Valadares não parou por aí. Em meados de 2008, o governador Aécio Neves e dezenas de autoridades locais fizeram festa para receber o anúncio do plano de instalação de um empreendimento de R$ 5 bilhões da Aracruz que prometia abrir 10 mil postos de trabalho e dar um novo rumo à região. Mas aí veio a crise e a Aracruz perdeu bilhões de reais em derivativos financeiros com a alta do dólar. Resultado: o projeto foi congelado e não há qualquer previsão de quando os planos podem ser retomados.