Economia cresce 6,8% de julho a setembro, melhores meses do ano, pouco antes de a crise global afetar país com força
Investimentos e consumo das famílias puxam a expansão vigorosa no 3º trimestre, mas, desde outubro, cenário mudou
FERNANDO CANZIAN
ENVIADO ESPECIAL AO RIO
PEDRO SOARES
DA SUCURSAL DO RIO
O melhor já ficou para trás. É isso o que os números do PIB (Produto Interno Bruto) do terceiro trimestre de 2008 sugeriram ontem ao apontar um crescimento de 1,8% em relação ao segundo trimestre deste ano e de 6,8% sobre igual período do ano passado.
Foram os melhores resultados de 2008. E os mais virtuosos, apoiados numa taxa recorde de investimentos (alta de 19,7%, a maior da série) e no consumo das famílias (7,3%, apoiada no aumento de 10,6% na massa salarial). Daqui para a frente, porém, a direção deve ser a inversa, de desaceleração.
O quase consenso entre economistas e consultorias é que a crise global imporá retração do PIB no último trimestre do ano em relação ao terceiro trimestre. As previsões variam de uma queda de 0,3% a queda de 1%.
Se isso for confirmado, e o PIB continuar se desacelerando ao longo do primeiro trimestre de 2009, o Brasil estará tecnicamente em recessão, com dois trimestres consecutivos de crescimento negativo.
O bom ano de 2008, no entanto, já está garantido. Mesmo que a economia não avance nada no último trimestre ante o mesmo período de 2007 (o que é impossível), o Brasil cresceria 4,8% neste ano. O IBGE também revisou o resultado do PIB de 2007, de 5,4% para 5,7%.
Para repetir o bom desempenho de 2007, o Brasil teria de crescer só 3,7% no último trimestre sobre o mesmo período de 2007, o que é possível. Mas isso já representaria uma forte desaceleração em relação aos 6,8% do terceiro trimestre.
O crescimento entre julho e setembro praticamente não foi afetado pela crise global (cujos efeitos no Brasil começaram a aparecer só em outubro) e se acelerou na maioria dos setores. “O crescimento se espalhou por toda a economia, principalmente nas áreas mais importantes, como investimentos e construção civil, indústria e consumo das famílias”, disse Rebeca Palis, gerente de Contas Nacionais do IBGE.
Em relação ao mesmo trimestre de 2007, a agropecuária cresceu 6,4%; a indústria, 7,1%; os serviços, 5,9%. Enquanto as exportações tiveram um crescimento muito modesto, de 2%, as importações continuaram quentes para atender à demanda interna: a alta foi de 22,8% no período.
Rebeca afirmou ser “lógico” esperar uma desaceleração por conta da crise. Mas disse que o IBGE não faz previsões. “Vamos ter de esperar os dados do último trimestre para ver o que aconteceu.” Eles serão divulgados em 10 de março.
Para Leonardo Carvalho, do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), órgão ligado ao Ministério do Planejamento, o resultado foi surpreendente: todos os setores subiram além da expectativa.
Mas tal realidade ficou para trás. Ele estima uma desaceleração no quatro trimestre, como reflexo do corte de produção de alguns setores, da queda da confiança de consumidores e empresários e da restrição do crédito. O economista prevê retração do PIB na comparação com o terceiro trimestre.
“A julgar pelo crescimento do investimento, o país caminhava para taxas de crescimento quase chinesas nos próximos anos, mas foi atropelado pela crise”, afirmou.
A expectativa de desaceleração deve interromper uma trajetória de 19 trimestres seguidos de aumento na chamada FBCF (Formação Bruta de Capital Fixo, ou investimento). O consumo das famílias (que responde por 60% do PIB), que cresce a 20 trimestres, também deve perder força.
Ronaldo Souza, do Iedi (Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial), concorda: “Vivíamos um dos melhores momentos da história, mas a economia vai sofrer um revés. Já em outubro, acusou rapidamente o golpe da crise”.