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Crise eleva desigualdade no país, diz FGV

Estudo aponta que, desde janeiro, classes AB e C perderam espaço na economia; analista atribui fato à queda do PIB no 4º tri

Especialista diz, no entanto, que amostra é pequena e que não se pode falar em retomada da tendência de expansão da desigualdade

DENISE MENCHEN

DA SUCURSAL DO RIO

A desigualdade social brasileira, em queda desde o início da década, mudou de trajetória com o agravamento dos efeitos da crise econômica global sobre o país, desde outubro passado.

Usado como referência para mensurar a concentração de renda de uma sociedade, o índice de Gini chegou a 0,571 em fevereiro, depois de ter atingido o piso de 0,560 em meados de 2008. O índice varia de zero a 1, sendo que zero representa a distribuição igualitária e 1, a concentração máxima.

Os dados constam do estudo “Crônica da Crise: Ressaca e Resiliência Recentes”, baseado na renda do trabalho medida pela Pesquisa Mensal do Emprego, do IBGE. Divulgada ontem, a publicação mostra que o movimento mais brusco na desigualdade ocorreu em janeiro, quando, segundo o economista Marcelo Neri, da FGV (Fundação Getulio Vargas), “a crise chegou ao brasileiro comum”.

Ele diz que, naquele mês, não foi apenas a classe AB que perdeu participação na estrutura social brasileira, o que vinha ocorrendo desde setembro de 2008. Também a classe C teve sua participação reduzida, em 2,2%. Em contrapartida, as classes D e E, em queda contínua desde fevereiro de 2003, voltaram a ganhar espaço. A participação delas cresceu, respectivamente, 3% e 6,7%, no que o pesquisador chamou de “ressaca de janeiro”.

“A gangorra se inverteu”, afirma Neri, que atribuiu o cenário à queda do PIB no quarto trimestre de 2008. “A queda de 3,6% chegou um pouco defasada à renda do brasileiro”, diz. No estudo, encaixam-se na faixa AB quem tem renda domiciliar total acima de R$ 4.807. Na C, quem tem renda entre R$ 1.115 e R$ 4.807; na D, entre R$ 804 e R$ 1.115; e, na E, quem tem renda de até R$ 804.

Para a professora Lena Lavinas, do Instituto de Economia da UFRJ, o dado não surpreende, já que o que havia promovido a redução da desigualdade no período pré-crise foi a retomada do crescimento econômico, do nível de emprego formal e dos rendimentos médios. “Na medida em que a crise leva à perda de postos de trabalho e à precarização do emprego, é mais do que esperado que a gente assista a uma interrupção na tendência de queda de desigualdade”, diz.

Lavinas ressalta, porém, que a amostra da PME é pequena e que é necessário aguardar dados mais consolidados antes de falar em uma tendência de retomada do crescimento da desigualdade. Marcelo Neri pondera que, em fevereiro, o índice de Gini já recuou em relação a janeiro, mas ainda não voltou aos patamares pré-crise. A classe AB, que no primeiro mês do ano tinha diminuído sua participação em 2,7%, sofreu um ritmo menor de redução, de apenas 0,5%, enquanto a classe C chegou a crescer 0,1%. Por isso, ele considera arriscado fazer previsões sobre o comportamento desses componentes no futuro.

O pesquisador diz, porém, que a crise aumentou de fato o risco de trabalhadores das classes A, B e C caírem para patamar mais baixo. Segundo ele, entre setembro e dezembro, a chance era 2% maior que no cenário anterior à crise. Desde janeiro, passou a ser 12% maior.

Para o setor financeiro e a indústria, a situação é pior. A chance de um trabalhador do setor financeiro deixar as classes A, B e C entre setembro e dezembro era 9% maior do que antes da crise. A partir de janeiro, ficou 13,5% maior. Na indústria, esses índices são de 2,7% e 4,1%, respectivamente.