Confederação Nacional dos Trabalhadores Metalúrgicos

Centro de Memória Sindical

Centro de Memória Sindical promove debate sobre organização sindical antes do golpe de 64

Jaélcio Santana

Debate na Força Sindical

“A academia tem um grupo de pesquisadores que realiza estudos sobre o movimento sindical brasileiro e hoje não se fala mais do “ novo sindicalismo” pois as práticas já existiam antes de 1964”, disse o professor Jorge Ferreira, professor da Universidade Federal Fluminense. Ferreira fez uma palestra na Força Sindical sobre “Organização sindical e partidos políticos antes do golpe de 1964”, durante o Ciclo de Debates, promovido pelo Centro de Memória Sindical. O mediador do debate foi o fundador do Centro de Memória Sindical Hugo Perez e o comentarista consultor João Guilherme.

O professor Ferreira destacou a luta do movimento sindical no fim da década de 70 e início dos anos 80, quando Francisco Weffort, ex-secretário-geral do PT, defendia o “novo sindicalismo desqualificando tudo que havia ocorrido antes das greves de São Bernardo”. Ferreira ressaltou que “a palavra novo se contrapõe ao velho. No Oriente velho é sabedoria e no Ocidente é ultrapassado”.

“Naquela época”, declarou Ferreira, “muitos historiadores compraram a expressão como se fosse verdadeira. Weffort dizia que o populismo, com Getúlio Vargas e João Goulart (no período de 1930 a 1964)  manipulava os trabalhadores  e o sindicalismo populista era representado pelo PTB e PCB, ou seja, o velho sindicalismo que não era politizado, era afastado das bases. O novo sindicalismo era contra a CLT, contra a legislação trabalhista feita pelo presidente Vargas e a favor da negociação direta entre trabalhadores e empresários”.

“No entanto, as pesquisas feitas pela academia desmentem essa expressão velho sindicalismo. Só para exemplificar, a eleição de delegados sindicais existia antes de 64”, afirmou Ferreira. Uma página foi virada e o discurso construído para desqualificar o movimento sindical antes de 1964 não convence mais.

Vida sem proteção social
Ferreira fez uma análise sobre como era ser trabalhador nas décadas de 1910 e 1920, quando os operários não tinham nenhuma proteção social. “Todos os que estão aqui hoje já nasceram em um país com legislação trabalhista, como férias e repouso semanal remunerado. Nas décadas de 10 e 20, os trabalhadores tinham horário para entrar no trabalho e não para sair. Os homens trabalhavam 12 horas por dia, as mulheres de 8h às 12 horas e as crianças também trabalhavam e eram espancadas, as mulheres estupradas. Não havia hospital público e os grevistas eram espancados”.

Os benefícios que os trabalhadores têm hoje foram conquistados e podem ser perdidos, não são bens da natureza. Na primeira República os operários reivindicavam leis sociais e a valorização do trabalho e realizavam greve, como os comerciários de Juiz de Fora (MG), em 1910.

Na época surgiram partidos políticos que não foram para a frente. O voto era aberto. Em 1917 houve greve geral em SP e Grande SP. Foram criadas associações mutualistas sustentadas por mensalidades de trabalhadores que ajudavam a pagar funeral, remédios, médicos e acabaram quando o presidente Vargas fez as leis sociais.

Com a Revolução de 1930, Getúlio Vargas assumiu o poder e houve troca de grupos dominantes. O grupo que assumiu o poder adotou um projeto intervencionista e reconheceu os direitos dos trabalhadores. Mas esta ação foi planetária desenvolvida por todos: facistas, comunistas, democratas e liberais. Getúlio criou o Ministério do Trabalho e baixou a lei estabelecendo que toda empresa teria de ter 2/3 de trabalhadores  brasileiros. ”Toda legislação foi feita neste época com exceção do salário mínimo (1938) e do 13º com João Goulart (1962)”, afirmou Ferreira.

O professor destacou a atitude dos empresários que resistiam a cumprir as leis. Getúlio Vargas criou a Justiça do Trabalho, que permitiu o cumprimento das leis. Foi um processo de aprendizado dos trabalhadores e coercitivo para os empresários.

Em 1931 foi criada a lei de sindicalização, através do Decreto 19.770, que regulamentou a vida dos sindicatos de trabalhadores e dos patrões. “Esta lei é duradoura e variável”, disse Ferreira, observando que “ela atravessou duas ditaduras, dois regimes democráticos e duas constituintes. As leis sociais beneficiaram os trabalhadores urbanos e não os rurais”.

Em 1946, o Brasil vivia um regime democrático, com os eleitores identificados com os seus partidos. Eram representantes dos trabalhadores o PTB e o PCB. O então ministro do Trabalho João Goulart ,Jango,  que assumiu o cargo em 1953 mudou a relação do Estado com os trabalhadores. Fazia reunião com sindicalistas, acabou com o atestado ideológico e implantou a gestão tripartite no Conselho da Previdência. Despertou o ódio dos empresários quando mandou fiscais do Ministério do Trabalho nas empresas.O PTB – partido que foi presidido por Jango – era de massa e moderno”, destacou.

Elogios
O consultor João Guilherme elogiou a palestra do professor Jorge Ferreira e destacou as diferenças entre o pré64 e hoje.” A estrutura produtiva era menor e a população urbana só começou a ultrapassar a rural em 1954. A base sindical não atingia dois setores que hoje são significativos e naquela época não eram: setor rural e funcionalismo público. O movimento sindical era majoritariamente masculino”.

“A cúpula sindical refletia a base sindical, a luta era na base. A cúpula representava grandes categorias, mas era baseada na trajetória política partidária dos dirigentes. Para entender o que estava acontecendo tinha de saber qual era o partido político. Tinha o fato de pertencimento, tinha essa vinculação. Havia radicalização grande era a favor ou contra. Hoje nosso movimento se reagrupou num pelotão mais unificado”.

Hugo Peres
O sindicalista Hugo Peres relembrou as ações do movimento sindical desde a década de 70, como a luta pela reposição salarial em 1977, a Conclat, as greves no final da década de 70. “Temos companheiros que começaram a lutar cedo e outros que estão começando agora. Tivemos a atuação do João Guilherme e Sergio Gomes, Serjão da Editora Oboré na construção do Centro de Memória. Hoje os metalúrgicos estão investindo na busca de documentos e considero que a vida sindical de Joaquim dos Santos Andrade, Joaquinzão merece ser estudada”, afirmou ao citar categorias que trabalharam para preservar a memória sindical como ferroviários, gráficos, têxteis.

Livro sobre Goulart
Geraldino dos Santos Silva, secretário de Relações Sindicais da Força Sindical, recomendou a todos a leitura do livro “ João Goulart – Uma Biografia”, escrito pelo professor Jorge Ferreira e indagou aos palestrante se os trabalhadores tivessem manifestado apoio a Jango se o Golpe de 64 teria sido evitado. Ferreira respondeu que Goulart tinha apoio, mas preferiu evitar uma guerra civil no país.

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