Folha SP
Ata do Copom afirma que existe uma ´elevada probabilidade´ de a taxa Selic cair ´para o patamar de um dígito´
Uma semana antes da reunião, Dilma se reuniu com Mantega e Tombini, mas governo nega interferência
SHEILA D’AMORIM
DE BRASÍLIA
O Banco Central indicou, de modo claro e muito pouco usual, que vai continuar a reduzir a taxa de juros no Brasil até chegar a um patamar abaixo de 10% ao ano.
Em um movimento raro na história do regime de metas de inflação brasileiro, iniciado em 1999, os diretores que integram o Copom (Comitê de Política Monetária) praticamente se comprometem a reduzir a taxa Selic -referência para todas as operações de crédito da economia.
Com argumento de que “a desaceleração da economia brasileira no segundo semestre do ano passado foi maior do que se antecipava” e de que não há uma solução definitiva para crise financeira na Europa, “o Copom atribui elevada probabilidade à concretização de um cenário que contempla a taxa Selic se deslocando para o patamar de um dígito”.
Na semana passada, o BC diminuiu a Selic para 10,5%. A expectativa do setor financeiro era a de que, a partir daí, o espaço para novas quedas estava diminuindo.
Essa foi a sinalização que o mesmo BC havia dado no dia 22 de dezembro, quando divulgou o último relatório trimestral de inflação de 2011. O recado do BC no relatório surpreendeu o mercado e fez os juros futuros subirem.
Por isso, no início de 2012, a expectativa era que o BC reforçasse o discurso de que os cortes seriam menores.
INDEPENDÊNCIA
A ata divulgada ontem veio na direção oposta e, mais uma vez, gerou dúvidas sobre uma suposta falta de autonomia do BC -que estaria buscando uma retomada mais forte da economia, como deseja a presidente Dilma Rousseff, em vez de preocupar-se em manter a inflação sob controle.
Uma semana antes da reunião do Copom deste mês, a presidente interrompeu as férias do ministro Guido Mantega (Fazenda) para discutir sobre os rumos da economia. O presidente do BC, Alexandre Tombini, também participou do encontro.
A equipe econômica rebate ingerência política da presidente na decisão do BC.
Segundo a Folha apurou, nos bastidores do governo, a mudança de postura do BC se justifica porque os dados da economia à época da elaboração do relatório de inflação -que previa uma redução mais lenta dos juros- não estavam claros quanto agora.
O documento, divulgado no final do mês, usou dados com data até 9 de dezembro.
Avalia-se que, de lá para cá, o desempenho da economia ficou “mais claro” e abaixo do esperado.
Os dados referentes ao crescimento oficial do Brasil no período ainda não foram divulgados. Além disso, houve melhora nas perspectivas para inflação. Em 2011, a taxa fechou no limite da meta, de 6,5%, mas nesse ano todas as estimativas são menores.
Os defensores da decisão do BC argumentam também que pesaram o comprometimento dentro do governo com um ajuste fiscal forte neste ano e a indefinição em relação à crise internacional.