Confederação Nacional dos Trabalhadores Metalúrgicos

IndustriALL

As Redes Sindicais Internacionais

A idéia de criar Redes Sindicais Internacionais, para fazer avançar a defesa dos direitos dos trabalhadores, não é nova. Há alguns anos, filiados no Sindicato dos metalúrgicos da Alemanha – o IG Metall – que eram trabalhadoras e trabalhadores do consórcio Volkswagen em Wolfsburg, reconheceram como era importante a construção e o desenvolvimento da cooperação e do diálogo com todas as plantas da VW no mundo, para defesa dos seus interesses a nível mundial. Para isso, utilizaram os valiosos e longos contatos que já tinham em todos os países.

Consequência disso foi a criação do Grupo de trabalho Intersoli, no ano de 1982, sediado na Representação local do IG Metall em Wolfsburg, bem em frente da VW, seguido depois em 1990 pela criação do Conselho de Empresa Europeu da VW e, em 1998, pela criação do Conselho Mundial dos Trabalhadores do Consórcio VW. Podemos dizer que as Redes Sindicais nasceram, portanto aqui.

No final deste processo, que surgiu sobretudo ao nível das várias plantas da VW e foi sempre acompanhado pelo Sindicato, foi sentida a necessidade de formar então o que se apelidou de Rede Sindical “Alemã-Ibero-Americana”, cuja Ata de fundação foi assinada no dia 26 de Janeiro de 2005 por oito Representantes Sindicais – entre eles a CNM/CUT do Brasil – em Buenos Aires. Com isso começou a escrever-se um novo capítulo da História sindical internacional.

Os objetivos então perseguidos eram:

  • A intensificação e o aprofundamento dos conhecimentos recíprocos sobre as características culturais, econômicas e sociais de cada um dos países envolvidos,
  • A intensificação da troca de informações sobre o andamento e evolução em cada um dos países, entre outras coisas, através da construção de uma Rede de Informações através da Internet;
  • A promoção da transferência de conhecimentos e do Saber entre os Sindicatos, se possível através de medidas de formação em comum;
  • A realização de encontros anuais, alternadamente em cada um dos países, bem como de Conferências entre os Sindicatos envolvidos, para assim se trocarem experiências e se desenvolverem em comum os objetivos sindicais;

Estes objetivos de então, pouco ou nada diferem dos que hoje são perseguidos por outras Redes, entretanto existentes.

Hoje, sabemos mais e melhor sobre as dependências recíprocas e sobre os conflitos existentes. Experimentamos cada vez de uma nova forma, como é difícil colocar as questões internacionais e sobretudo um comportamento solidário – muito mais em épocas de crise – por cima dos interesses nacionais e locais. Por isso é que as Redes Sindicais são um meio adequado para se fazer trabalho sindical internacional, para, dessa forma, possibilitar a Globalização dos Direitos dos Trabalhadores.

O exemplo do Brasil

No decorrer do tempo, mais de mil empresas alemãs escolheram o Brasil como local para fazerem seus excelentes negócios. Elas sentiram-se atraídas pelas matérias-primas aqui existentes, pela força de trabalho dos Brasileiros, pelo imenso mercado latino-americano e também pelas bem mais propícias leis laborais do país. Um grande número dessas empresas faz parte do nosso setor de atividade sindical: o setor metalúrgico.

Mas nós também sabemos que a existência de inúmeros Sindicatos, a falta do livre Direito de acesso sindical à empresa, associado à falta de organização no local de trabalho e ao negativo papel da Justiça do trabalho, levaram muitas dessas empresas a instalar aqui no Brasil as suas filiais. Até hoje, e apenas com muito poucas exceções, continuamos a sentir a falta do diálogo social e do respeito dos empresários pelos trabalhadores e pelos seus Sindicatos.

Por isso se torna cada vez mais importante a Solidariedade entre os companheiros e as companheiras a nível internacional, para influenciar o progresso dos direitos e a defesa dos interesses recíprocos, juntos das matrizes, bem como a resolução dos problemas do dia a dia de e em cada uma das empresas. O que fizermos pelos outros, resultará também em benefício para nós mesmos.

Com base nisto e com base no trabalho feito a nível local, regional, nacional e internacional, surgiram nos últimos anos algumas Redes Sindicais importantes. Entre elas contamos a ThyssenKrupp, ZF, Daimler, Mahle, Bosch, VW, GM, Rheinmetall, Siemens, Schäffler, Continental, ArcelorMittal e ainda muitas outras.

Essas Redes ajudam-nos, sobretudo na

a)    Discussão de Temas, cujos interesses são comuns, e no desenvolvimento de Posições e Estratégias sobre tais temas

b)    Preparação e implementação de atividades e de ações comuns (bilaterais, regionais ou internacionais),

c)    Troca de Informações,

d)    Apoio recíproco, em caso de situações problemáticas (Negociações coletivas difíceis, Greves, em caso de comportamentos anti-sindicais por parte das diretorias de empresas, etc.)

e)    Desenvolvimento de Órgãos de Consulta e de Negociação dos representantes dos trabalhadores e Sindicatos, face às Diretorias e Administrações a nível nacional, regional e internacional (sobretudo quando não existem outras estruturas, tais como Representação de trabalhadores, Conselhos de Empresa, etc.).

O papel da Fitim/IndustriALL

Com o contributo de suas organizações filiadas do Brasil – a CNM/CUT e a CNTM/FS – a Fitim entretanto substituída em 2012 pela IndustriALL-Global-Union (como resultado da fusão das três Confederações mundiais dos trabalhadores da Metalurgia, Química e Têxteis) – elaborou e aprovou em 2009 uma nova forma de sindicalismo mundial, para reforço das formas de atuação a nível local, nacional, regional e mundial, institucionalizando assim as Redes Sindicais.

Horizontalidade – As Redes Sindicais, nacionais, regionais e mundiais – completam e aperfeiçoam, mas não substituem o sistema sindical representativo local, respeitam a verticalidade sindical existente, mas mudam a ótica e o rumo da ação, usando a horizontalidade.

As novas tecnologias – As Redes vivem da moderna tecnologia eletrônica de informação horizontal: o telefone e a internet. Este meio veloz para troca de conhecimentos, documentos e informações, exige, porém, uma sistemática e cuidadosa utilização, uma posição vigilante, crítica e questionadora, pois se trata de um meio acrítico, rápido, impessoal e até perigoso, como o demonstram já alguns casos concretos.

O Papa Inocêncio III, dizia já no séc. XII: “Quod non est in actis, non est in mundo”, o que numa versão moderna, positiva, do séc. XXI significa: “O que está no Google, está no mundo”. Por isso usamos esse meio hoje, também imprescindível e poderoso. No entanto, não podemos esquecer o elo mais forte da Rede, que é o encontro humano, presencial: os encontros regulares dos membros da Rede.

Numa Rede se encontram os trabalhadores de uma empresa/consórcio, de uma ou várias categorias, de vários sindicatos, federações e confederações, de várias centrais, de várias cidades e Estados, para defesa solidária e conjunta de seus interesses comuns.

A transversalidade organizativa da Rede quebra e ultrapassa as fronteiras físicas e sindicais, nacionais e internacionais, solidariza e globaliza a informação e a procura da igualdade dos direitos, cria contra-poder, e procura implementar até o poder repartido.

Para ter poder, ela procura também o seu reconhecimento oficial e a co-participação financeira das empresas/consórcios, já que eles usufruem do papel pacificador da Rede, através da discussão dos conflitos e preparação do terreno, com os RHs, na procura de soluções, na base do diálogo social e se possível da própria co-decisão.

Empresas inteligentes dividem o poder. As outras ditam. A maioria esquece que a divisão do poder não é perda, mas ganho, já que o objetivo não é vencer, mas convencer e solucionar.

As Diretrizes O trabalho de Redes é feito com base em algumas regras essenciais, emitidas pela Fitim. 

  1. Mandato político do Sindicato para criação da Rede
  2. Responsabilidade do Sindicato do País de origem da Multinacional
  3. A rede deve ser órgão sindical independente
  4. Rede deve ser transparente e aberta a todos os Sindicatos interessados
  5. Cada Sindicato decide sobre participação própria e do representante da empresa
  6. Plano de Ação, contendo: Fins, Temas, Estruturas, Formas de comunicação, papel do Coordenador, Encontros, Meios eletrônicos.
  7. Fim da Rede: fortalecer o poder sindical nacional, regional e global.

Como já vimos atrás, a maioria das Redes começou historicamente na Alemanha, com o objetivo de repartir e conceder poderes e direitos de co-gestão, como os lá existentes. Por isso, a maioria delas existe sobretudo em filiais de empresas alemãs. Mas sua eficiência passa infalivelmente pela necessidade de preparação dos que nelas participam.

Por isso corre já um Projeto de formação bilateral Brasil-Alemanha, até com apoio estatal alemão. Essencial é também uma mudança de comportamento, sobretudo dos responsáveis de RH das empresas no Brasil, alguns de tipo altamente ditatorial, salvo honrosas exceções.

Para que as coisas funcionem, a Fitim assume também sua responsabilidade

  1. Garante o cumprimento dos sete princípios, atrás descritos.
  2. Inicia e Modera a elaboração do Plano de Ação.
  3. Proporciona material de orientação e de formação
  4. Atua como Centro de informação.
  5. Nomeia uma pessoa de contato para as empresas centrais
  6. Ajuda no processo de acompanhamento e na elaboração de critérios para o processo de avaliação.
  7. Garante a transparência do processo e a participação de todas as organizações empenhadas.
  8. Organiza, se necessário, o contato com outras Federações Sindicais Globais, representadas na empresa
  9. Se necessário, organiza o Primeiro encontro de todas as partes, para facilitar a elaboração do Plano de Ação
  10. Nomeia, para cada empresa, uma Pessoa de Contato
  11. Organiza a Solidariedade, em caso de Reestruturação ou de Negociações Coletivas

Obrigações As organizações filiadas têm também suas obrigações:

  1. Na constituição de Redes, o Papel Central deverá ser assumido pelos Sindicatos do País de Origem da empresa
  2. O mesmo vale para estabelecer o Contato com a Direção da Empresa
  3. A Inclusão de Representantes da Empresa na Rede é essencial para
  • tornar clara a Finalidade da Rede e
  • para elaborar o Plano de Ação.

Compromissos – Papel similar cabe aos Sindicatos Nacionais e representações locais: 

  1. Os Sindicatos Nacionais deverão informar os Representantes da Empresa sobre o trabalho das Redes Sindicais e aconselhar a sua participação nas mesmas.
  2. A Comunicação entre os Representantes Locais e a sua Central Nacional deverá ser organizada de acordo com a prática corrente em cada País.
  3. Estruturas globais, regionais e outras existentes, podem ser instrumentos importantes na construção das redes sindicais

 A EmpresaA própria empresa deverá assumir um Papel de cooperação:

  1. Negociar com a Direção da Empresa sobre o reconhecimento da Rede
  2. Disso faz parte também o Financiamento da Rede
  3. Nenhum passo deverá ser dado, sem aprovação prévia da Coordenação da Rede e sem incluir isso antes no Plano de Ação.
  4. Os Apoios Financeiros não deverão pôr em perigo a Participação dos Sindicatos e o seu papel de Controle, bem como a independência da própria Rede.

As CondiçõesO funcionamento das Redes assenta sobre algumas condições:

  1. Criar um largo Consenso geral sobre o que a Rede pode e não pode fazer
  2. Ter em conta o Tamanho e os Segmentos da Empresa.
  3. Por tudo isso, poderá ter que ser necessário criar Consciência e Respeito, em todas as partes envolvidas, para
  • Situações diversas
  • Leis nacionais
  • Estruturas organizativas e
  • Tradições específicas
  1.  Isso pode ser conseguido através de um Plano de Ação

Os FinsObjetivo final das Redes é conseguir a aprovação do Acordo Marco Global e a fixação de Direitos universais. Na luta pela aprovação de Acordos-Marco Mundiais, os Sindicatos procuram nada mais do que garantir as 8 Convenções Básicas da OIT, aprovadas por todos os Governos membros, sem um único voto contra.

  1. Acordos Marco Internacionais são um instrumento importante no trabalho das Redes sindicais
  2. Informações fornecidas pela empresa, com base nos AMI, deverão ser compartilhadas com todos os participantes da Rede
  3. Alguns AMI prevêem a constituição de Comissões de Controle. Dessa forma os Sindicatos podem encontrar-se e trocar informações.
  4. Nalguns casos, as Redes podem incluir no Plano de Ação a conquista de um AMI. Mas este não é o único objetivo de uma Rede global. 

O ConteúdoA FITIM formulou Diretrizes claras sobre os conteúdos do AMI.

  1. Para além dos AMI, poderão ser negociados Acordos Globais sobre
  • Proteção no Trabalho e Proteção à Saúde
  • Formação e Reciclagem Profissional
  • Informação e Consulta
  • Outras questões de interesse geral. 
  1. Essas negociações deverão basear-se num
  • Mandato claro e expresso das organizações filiadas e
  • Estar inseridas num processo geral de negociação.
  • Problema central: nem os AMI, nem os Acordos Globais têm força jurídica, que possa obrigar as empresas a cumprir seu conteúdo.

Chances, Problemas e Condições das Redes: 

  • A Rede: Identifica os problemas e os atores locais
  • Troca rápido dados, informações e documentos importantes para ações comuns
  • Supera mais facilmente as divisões sindicais
  • Cria união, compromisso, solidariedade
  • Adquire dinâmica e rapidez própria
  • Fortalece, podendo “perturbar“ o Sindicato
  • Eleva o respeito da multinacional pela Rede.
  • A Linha tênue de contato ou separação entre Rede-Sindicato pode “atrapalhar”.
  • Acompanhamento sindical aberto e constante, formativo e informativo
  • Apoio efetivo da Fitim
  • Coordenação clara e progressista
  • Necessidade de Liberdade de atuação, na base sindical da boa-fé  
  • Assessoria eficiente das entidades sindicais é imprescindível
  • Rede prepara – Sindicato negocia!

A importância política das Redes

Termino, chamando a atenção para a situação político-social, vivida no ano de 2011, no Norte de África, e depois também na Europa. Ela mostrou bem como as Redes sociais ajudaram a derrubar ditaduras de longa data no Norte de África e a reunir multidões, de forma rápida num local, para ações de protesto noutros quadrantes.

Por isso, até Estados poderosos estão em alerta. O próprio Palácio do Planalto está de olho na Internet, como relatou a Folha, dia 22 de Agosto de 2011. O Governo quer “ouvir” os usuários de internet e “acolher e estimular “o diálogo. Gilberto Carvalho, Ministro da Casa Civil, afirmou que “o Governo tem obrigação de ouvir a sociedade, e essas são novas formas de expressão”.  Que nós usamos! E queremos continuar a poder usar!

Por isso, há uma nova abertura para as novas ferramentas de comunicação, como estratégia de luta pelos Direitos. Mas tudo depende apenas de cada um de nós!

Manuel Campos
Coordenador de Redes Sindicais
IndustriALL- IG Metall