TENDÊNCIAS/DEBATES
Cabe à presidente decidir se vai atender ao mercado e manter os altos ganhos dos especuladores ou se vai dar aumento digno para o mínimo
Sofia, a trágica heroína do escritor William Styron presa pelos nazistas, precisou escolher qual de seus dois filhos iria viver e qual seria sacrificado. Em situação menos dramática, a presidente Dilma terá que escolher se negocia com as centrais um salário mínimo maior que R$ 545 ou se atende ao mercado e à sua equipe econômica, que prefere conter gastos e aumentar juros.
As centrais defendiam R$ 580, enquanto o Dieese calcula o mínimo “necessário” em R$ 2.227,53.
Mas entendemos que é grave a situação fiscal do país e consideramos aceitável, então, um reajuste para R$ 560, ainda que a diferença seja sob a forma de antecipação. E queremos também a correção da tabela do Imposto de Renda.
Um dos méritos do governo Lula foi a política de recomposição do poder de compra do trabalhador e a extraordinária distribuição de renda, que permitiu diminuir a pobreza, aquecer o mercado e manter a economia estável.
O reajuste do mínimo e das aposentadorias, aliado ao crédito consignado -também proposto pelas centrais, em 2004- e às ações durante a crise permitiram mostrar ao mundo que havia um comando diferente na economia, com apoio dos trabalhadores.
Muitas daquelas medidas -como a redução do IPI e a taxação de produtos importados, como aço- foram propostas pelas centrais ao presidente, algumas com oposição da equipe econômica.
O ministro Guido Mantega informou para a presidente que o mínimo de R$ 545 honra o acordo com as centrais. Divergimos. O acordo não era indexatório. Ele previa, com base em fórmula que poderia ser alterada, aumento real, além da recomposição inflacionária.
O acordo dispunha que o mínimo seria reajustado todo ano com base no índice da inflação e no ganho real garantido pelo valor do PIB de dois anos antes. Insisto: não tinha um indexador, mas, sim, a intenção de recompor o valor pela inflação e manter curva de ascensão (com base no crescimento do PIB).
Ora, se em 2009 o PIB foi negativo, parece-nos óbvio que teríamos que ajustar o acordo, preservando a intenção. A presidente Dilma afirmou em novembro que assim entendia e que iria discutir conosco o mecanismo para a recomposição.
A equipe econômica é contrária, como sempre foi. No passado, o árbitro dessas divergências foi o presidente. A decisão final teria agora de ser da presidente, também…
De onde viriam os recursos? Na votação do Orçamento da União, eu exigi, em nome do PDT, que fossem reservados para essa eventualidade. Caso não sejam suficientes, precisamos buscar onde cortar.
Tenho uma sugestão: o governo paga R$ 190 bilhões anuais de juros por sua dívida pública de R$ 1,5 trilhão, por conta da maior taxa de juros do mundo, que o BC acaba de aumentar para 11,25% ao ano. Diz que faz isso para controlar a inflação, mas é para garantir o ganho dos investidores e especuladores.
Cada ponto a mais na taxa de juros significa R$ 15 bilhões de juros!
Ora, baixe-se a taxa de juros em um ponto e está resolvida a questão de quem pagará o aumento.
O argumento de que manter juros altos garante o controle da inflação é apenas parcialmente verdadeiro.
Precisamos manter a inflação dentro da meta, mas, se o centro da meta é de 4,5% e podemos ter 2% de variação, não seria assustador termos inflação de 6,5%.
O problema é o medo dos burocratas, que preferem errar dando uma dose cavalar de remédio para o doente -o que pode, em vez de salvá-lo, matá-lo.
Cabe à presidente Dilma fazer sua escolha: se vai atender ao mercado e manter os altos e injustos ganhos dos especuladores ou se vai dar aumento digno para o salário mínimo e para os aposentados, ajudando a distribuir renda e a erradicar a miséria. O governo deve orientar sua base para votar a emenda dos R$ 560. Nem mais nem menos.
PAULO PEREIRA DA SILVA, o Paulinho, 55, é presidente da Força Sindical e deputado federal (PDT-SP).