02 jul 2009
Notícias
Cibelle Bouças, Vanessa Jurgenfeld e Sérgio Bueno, de São Paulo, Florianópolis e Porto Alegre
Os acordos efetuados entre sindicatos e empresas a partir de dezembro inibiram parcialmente o avanço das demissões provocadas pelo agravamento da crise, na avaliação dos dirigentes sindicais que negociaram os compromissos.
Empresas ligadas à cadeia automotiva, incentivadas pelo consumo decorrente da redução de impostos, normalizaram a produção e recentemente iniciaram um processo de recontratação de profissionais dispensados no fim do ano passado. Já indústrias exportadoras não conseguiram manter o nível de produção e voltaram a demitir depois do fim dos acordos de redução de jornada ou de suspensão temporária dos contratos de trabalho, fechados entre novembro e fevereiro.
No ABC, o Sindicato dos Metalúrgicos fez acordo com 45 empresas para redução de jornada, férias coletivas, licença remunerada ou suspensão temporária do contrato (o chamado lay-off), envolvendo em torno de 14 mil trabalhadores. Desse total, nove empresas já suspenderam a redução de jornada, a maioria do setor de autopeças. As montadoras (Volkswagen, Ford, Mercedes-Benz e Scania) optaram por férias coletivas na região, sendo que as duas últimas abriram um programa de demissão voluntária (PDV) para 400 e 1,2 mil trabalhadores, respectivamente, mas eles ainda não foram concluídos.
Em São Paulo e Mogi das Cruzes, segundo o Sindicato dos Metalúrgicos da região, foram fechados cerca de 40 acordos com empresas de autopeças, dos quais dez depois de abril. Ao todo, esses acordos garantiram estabilidade a 25 mil trabalhadores, diz o presidente da entidade, Miguel Torres. “A redução do IPI, a melhora na oferta de linhas de crédito e da inflação permitiram uma recuperação nas vendas e a manutenção do emprego quando o prazo dos acordos acabou”, afirma o sindicalista.
Para os dirigentes sindicais, sem os acordos, as demissões no setor industrial teriam sido ainda maiores. No acumulado do ano, o setor fechou 146 mil vagas, mas em abril e maio o saldo já foi levemente positivo: 900 empregos foram recuperados na indústria nesses dois meses. Os acordos, explicam, funcionaram mesmo como uma “ponte” para enfrentar o período de maior incerteza da crise.
Em Taubaté (SP), o sindicato dos metalúrgicos optou por negociar banco de horas. “Os acordos foram importantes para manter empregos. A Ford, por exemplo, manteve a linha de motores e agora inicia a fase de instalação de linhas para a produção dos modelos para 2010. Algumas empresas começam a contratar e isso nos dá otimismo para buscar ganhos reais na campanha salarial de setembro”, afirma o presidente do sindicato, Isaac do Carmo. O setor eletroeletrônico, segundo ele, parou de demitir, mas ainda não reagiu.
Em São José dos Campos (SP), os cortes na Embraer são o problema mais grave, diz o presidente do Sindicato dos Metalúrgicos da região, Vivaldo Moreira Araújo. No semestre, as homologações referentes à empresa somaram 3.193 – número que sobe a 5.851 no total das empresas, a maioria fornecedora da fabricante de aviões.
O diretor-técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Clemente Ganz Lucio, observa que exportadores dos setores de mineração, siderurgia, manufaturados e carnes entram em um novo ciclo de demissões, com o fim dos acordos de jornada. “O restabelecimento do comércio internacional será lento e não compensa a algumas empresas manter o quadro de funcionários”, diz. Para Lucio, a demanda no mercado interno não é suficiente para compensar a queda nas exportações e estimular investimentos em novas fábricas e contratações. “Recuperar o nível de emprego de 2008, só em 2010.”
Mesma avaliação faz o economista do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), Rogério César Souza. “Setores exportadores ainda farão ajustes”, diz. Para ele, o grande ajuste foi feito no fim de 2008 e a tendência geral é de recuperação no segundo semestre, já que o número de horas pagas apurado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) tem crescido em alguns setores, permitindo ganhos de produtividade – indício de que a indústria deve voltar a contratar nos próximos meses.
Em setores onde a recuperação da economia é menos clara do que no segmento automotivo, empresas e sindicatos ainda negociam acordos de redução de jornada ou banco de horas, como nos casos da WEG, Schulz e Fundição Tupy.
Em Jaraguá do Sul (SC), a WEG fechou um acordo de redução de salários e jornada em abril e o cancelou em maio. Desde o início de junho, ela recolocou em discussão um ajuste de horas e salários com os funcionários, mas o acordo ainda não foi aprovado. Em comunicado, a empresa informou que “a redução iniciada em abril, aprovada por 72% dos trabalhadores, foi revista em função do aumento da demanda pela alteração temporária do IPI dos eletrodomésticos. No entanto, a demanda na linha de motores industriais, que representa mais de 70% da produção, continua bastante reduzida”.
O presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de Joinville (SC), Genivaldo Ferreira, diz que muitas empresas da região, que utilizaram principalmente as férias coletivas para diminuir a produção, decidiram cortar funcionários depois desse período. Nas contas do sindicato, foram demitidos 2 mil trabalhadores de janeiro a junho, sendo 430 só no mês de junho.
Novos acordos, no entanto, começaram a sair recentemente envolvendo empresas que ainda não tinham feito a redução de jornada e só concedido férias coletivas. Ferreira cita a Schulz, fabricante de compressores, que depois de demitir 150 pessoas em abril e dar férias coletivas, fechou até novembro acordo com o sindicato de redução de 40 dias de jornada, sem redução salarial e que será compensada aos sábados até 2011.
A Fundição Tupy manifestou em junho interesse em reduzir jornada e salário. A proposta é que a jornada seja reduzida em um dia por semana e o salário nominal em 17%, percentual incidente sobre valores acima de R$ 500,00. O ajuste está previsto para começar em 6 de julho, vigorando por três meses e podendo ser renovado, dependendo da conjuntura econômica. Como justificativa para a medida, a empresa informou, em comunicado, que de janeiro a maio deste ano suas vendas caíram 50% sobre 2008 e “não há previsões de que o cenário venha a apresentar melhora no decorrer deste exercício”.
Em Canoas (RS), ocorreram 2,5 mil demissões de outubro a maio, mas agora as empresas já começam a readmitir, informa o presidente do sindicato dos metalúrgicos local, Nelson Luiz da Silva. Segundo ele, a entidade conseguiu fechar acordos de redução de jornada com garantia de emprego e reembolso dos descontos salariais a partir da recuperação do nível de atividade das empresas. “A flexibilização foi positiva para estancar demissões, mesmo que não seja do nosso agrado reduzir salários que já são curtos”, comentou.
O grupo Randon, de Caxias do Sul, iniciou em fevereiro a redução de jornada em um dia por semana com corte salarial equivalente a 50% das horas não trabalhadas. A medida foi aplicada em cinco empresas do conglomerado até abril e depois prorrogada até julho em apenas três. A Randon tem mais de 9 mil funcionários e segundo Maria Tereza Casagrande, gerente administrativa-corporativa do grupo, a flexibilização de jornada evitou cerca de 250 demissões.
A Marcopolo, também de Caxias do Sul, deixou de operar nove dias em fevereiro e março sem descontos nos salários. As horas não trabalhadas serão compensadas nos próximos meses. Segundo o vice-presidente do sindicato dos metalúrgicos da cidade, Leandro Velho, 84 empresas, com cerca de 20 mil funcionários no total, adotaram a flexibilização desde o início do ano e a maior parte dos acordos expira em agosto. Mesmo assim, as rescisões homologadas pela entidade chegaram a 5,3 mil no período, o equivalente a quase 10% da categoria. “Quem não flexibilizou, demitiu”, disse o dirigente.
No Sul Fluminense, região mais afetada pela crise no Rio, a montadora Peugeot-Citröen tentou adiar cortes, concedeu férias coletivas aos 3.300 empregados entre dezembro e janeiro, mas acabou cortando 250 em abril e encerrou o terceiro turno de produção. Em janeiro e março, a montadora já havia deixado 700 funcionários do terceiro turno de produção em casa recebendo 75% do salário. Agora, ela apresenta nível de produção equivalente a 90% da capacidade. A demanda nacional para alguns modelos superou as expectativas e foi necessário aumentar o ritmo nas entregas. (Colaboraram Ana Paula Grabois, do Rio, e César Felício, de Belo Horizonte)
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