Confederação Nacional dos Trabalhadores Metalúrgicos

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Malha ferroviária atinge limite para carga



Com problemas estruturais, mais investimentos podem não implicar aumento significativo do volume transportado

Governo negocia com os atuais arrendatários uma fórmula para incentivar expansão de investimentos na malha ferroviária

HUMBERTO MEDINA

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Privatizadas há pouco mais de uma década, as ferrovias que operam na malha da extinta RFFSA estão chegando perto do seu limite de transporte de carga, na avaliação feita pelo governo e pelos próprios investidores privados no setor.

Em 1997, as ferrovias transportavam 253 milhões de toneladas. Esse número aumentou rapidamente no início dos anos 2000, mas agora o crescimento desacelerou -em 2007 cresceu 6,6% e, em 2008, 2,8%. Ano passado, foram transportados 426,5 milhões de toneladas.

“O salto inicial era previsível. Houve um ganho e agora bateu no limite estrutural”, avalia Bernardo Figueiredo, diretor-geral da ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres). Ou seja, com a atual malha ferroviária e seus problemas estruturais, como traçado inadequado, mais investimentos não significarão aumento significativo do volume transportado.

De 2007 para 2008, os investimentos aumentaram 31% para um aumento de carga transportada inferior a 3%. Agora, para viabilizar o aumento de capacidade, o governo busca acordo com os concessionários privados. “A privatização foi feita olhando a arrecadação e não investimentos em ferrovias”, afirma Figueiredo.

Os investidores privados também avaliam que o limite está próximo. “Nossa avaliação é que 2010 é o limite, com toda a criatividade possível”, disse Rodrigo Vilaça, diretor-executivo da ANTF (Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários).

Para Marcelo Spinelli, diretor de Comercialização de Logística da Vale, o ritmo mais lento no aumento da carga tem que ser visto no contexto da redução da demanda. “2008 foi muito afetado pela crise. A análise [de esgotamento da capacidade de carga] não pode ser tão determinística”, afirma.

Segundo Spinelli, governo e iniciativa privada precisam se antecipar ao aumento de demanda para evitar problemas. “A demanda vai voltar e temos que trabalhar para fazer o investimento em infraestrutura.”

O diretor-geral da ANTT afirma que, no momento da privatização, a RFFSA dava um prejuízo anual de aproximadamente US$ 200 milhões à União e não tinha capacidade de investimentos. “O problema era fiscal. A RFFSA não podia se manter nem evoluir.”

A privatização na verdade foi um aluguel da malha, chamado de “arrendamento”, e aconteceu entre 1992 e 1998. Por ano, a União recebe dos arrendatários cerca de R$ 400 milhões.

Como a prioridade era fazer caixa e livrar a União do prejuízo, o governo federal optou por não incluir nos contratos com os investidores privados cláusulas que obrigassem investimentos em melhorias estruturais ou mesmo ampliação da malha. Se incluídas, essas cláusulas iriam causar perda de valor no arrendamento e no valor pago pela concessão.

Negociações

Como o contrato não prevê investimentos em melhorias estruturais, o governo está negociando com as atuais arrendatárias uma fórmula que torne interessantes os investimentos. Uma das possibilidades é o Estado fazer os investimentos necessários e cobrar um valor maior de arrendamento das empresas. A lógica é que, com melhores condições, as ferrovias podem transportar mais carga e, portanto, podem pagar mais arrendamento.

Outra possibilidade é as empresas privadas fazerem o investimento e descontarem esse valor daquele pago com o arrendamento. Como os valores envolvem bilhões de reais, deverá prevalecer algum tipo de compromisso de parceria que permita maiores ganhos para as empresas (mais carga transportada) e para o governo (mais investimentos feitos).

As empresas sinalizam com outra opção: extensão dos prazos do contrato de concessão, nos mesmos moldes do que foi feito pelo governo do Estado de São Paulo no “Cebolão”, na rodovia Castello Branco. No acerto paulista, as concessionárias que operam a rodovia farão obras com recursos próprios e, em troca, terão seu contrato de concessão alongado.

Obras para expansão da malha enfrentam atraso de execução

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

As obras para aumento da malha ferroviária do país, orçadas em bilhões de reais, enfrentam atrasos na sua execução. Projetos como a Transnordestina, Norte-Sul, Oeste-Leste atrasam por vários motivos ao longo do tempo: falta de recursos, má condição financeira dos empreendedores, demora no licenciamento ambiental e, mais recentemente, crise financeira.

A lentidão no processo de aumento da malha é histórica. Em 1989, o governo concedeu à iniciativa privada a construção de uma ferrovia (Ferronorte) de mais de 5.000 km, ligando Porto Velho (RO) e Santarém (PA) às cidades de Cuiabá (MT) e Uberlândia (MG). A construção começou em 1992 e, até hoje, há apenas 512 km em operação.

A Ferronorte já passou por várias engenharias financeiras, com forte injeção de recursos públicos, via BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) e fundos de pensão. A concessão acabou comprada pela ALL (América Latina Logística), arrendatária da malha da extinta RFFSA.

Semana passada, a ANTT autorizou a ALL a construir mais um trecho, de 262 km, ligando Alto Araguaia (MT) a Rondonópolis (MT). O novo trecho deverá ficar pronto até o final do ano que vem. A concessionária ainda vai avaliar se é ou não viável levar os trilhos até Porto Velho (RO) e Santarém (PA).

A Transnordestina, projeto que tem como objetivo ligar o Sul do Piauí à malha da CFN e, dali, aos portos de Suape (PE) e Pecém (CE), também está atrasada. O empreendedor privado (a siderúrgica CSN, dona da CFN) fez, até agora, obras em 96 km entre Missão Velha (CE) e Salgueiro (PE). No total, a ferrovia deverá ter 1.728 km.

No caso da Transnordestina, a maior parte dos R$ 5,4 bilhões da obra será financiada com recursos públicos. Essas verbas serão provenientes de diversas fontes, isenções fiscais (Finor), fundos constitucionais (FDNE), do BNDES ou direto da União, por meio da Valec (estatal do setor ferroviário). Até o momento, só a CSN investiu aproximadamente R$ 200 milhões.

PAC

Na Norte-Sul, a concessão foi dada à estatal Valec, criada especialmente para isso, em 1987. Inicialmente, a Valec deveria fazer dois trechos: Colinas de Tocantins (TO) até Açailândia (MA), com 461 km, e Porangatu (GO) até Senador Canedo (GO), com 502 km. O trecho intermediário, de 675 km, não foi concedido nessa ocasião.

Hoje, a ferrovia está funcionando em um trecho de 240 km entre Aguiarnópolis (TO) e Colinas do Tocantins (TO). De acordo com o PAC, ela deverá chegar até a cidade paulista de Estrela D´Oeste. Parte da construção foi subconcedida para a Vale. Um leilão de subconcessão deveria ter acontecido no final do ano passado, mas foi adiado por conta da crise financeira internacional.

O governo planeja também outra ferrovia, ligando a linha Norte-Sul (na altura da cidade de Alvorada, em Tocantins) ao porto de Ilhéus (BA). São 1.504 km, orçados em aproximadamente R$ 6 bilhões. A obra está a cargo da estatal Valec, encarregada também da Norte-Sul.

A empresa deverá subconceder trechos à iniciativa privada. O leilão de subconcessão deveria ter acontecido até o final do ano passado, mas também foi adiado por conta da crise.