Despesa financeira que, em média, era de R$ 8,1 bi por mês entre janeiro e setembro subiu para R$ 9,5 bilhões
Marcelo Rehder
Os gastos da indústria brasileira com pagamento mensal de juros subiram 17,3% no último trimestre de 2008 em relação ao período de janeiro a setembro. As despesas financeiras, que eram de R$ 8,1 bilhões em média por mês, aumentaram para R$ 9,5 bilhões.
Essas despesas chegam a superar outros gastos, como o de salários, sem considerar os encargos que incidem sobre a folha de pagamentos. Na média entre outubro e dezembro, período mais agudo da crise mundial, que fez subir o custo dos financiamentos, os desembolsos para pagamento de juros foram 11% superiores aos gastos com salários (R$ 8,5 bilhões). De janeiro a setembro, a média das despesas financeiras correspondia a 95% dos gastos mensais com salários.
Os dados são de um levantamento da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) ao qual o Estado teve acesso e que deverá ser apresentado hoje em reunião de diretoria da entidade. “Neste momento de crise, com ameaças ao emprego, é inadmissível a indústria gastar mais com juros do que com salários dos trabalhadores”, diz José Ricardo Roriz Coelho, diretor do Departamento de Competitividade e Tecnologia da Fiesp, que coordenou o trabalho.
O levantamento ressalta que as despesas financeiras da indústria foram impulsionas pelo aumento no chamado spread bancário, a diferença entre a taxa de juros cobrada por bancos e financeiras e a que eles pagam para captar recursos.
No último trimestre de 2008, conforme a Fiesp, o setor despendeu R$ 5,5 bilhões em média por mês só para remuneração do spread, ante uma média mensal de R$ 4,4 bilhões entre janeiro e setembro, o que representa um salto de 25%. No custo para captação, a média passou de R$ 3,72 bilhões para R$ 4 bilhões, uma variação de 7,5%.
“Enquanto empresas têm segurado e até reduzido seus preços para manter as vendas e trabalhadores estão perdendo emprego e reduzindo salários, os bancos retém o crédito e aumentam os spreads para manter suas margens de lucro”, afirma Roriz Coelho.
O diretor da Fiesp explica que os resultados do levantamento referem-se à média nacional das empresas do setor. “Não se pode dizer que todas gastam mais com juros do que com salários.” As empresas intensivas em capital, que faturam alto e empregam número reduzido de trabalhadores, por exemplo, estão acima dessa média. Nesse grupo estão incluídos setores de mineração, siderurgia, petroquímica e papel e celulose, entre outros. Por outro lado, as intensivas em mão de obra, que faturam pouco, mas empregam milhares de trabalhadores, como calçadista e têxteis, estão abaixo da média.
Em dezembro, a diferença entre a taxa cobrada nas operações de crédito e a de captação de recursos subiu 16%, para 30,6 pontos porcentuais, ou 4,2 pontos acima da registrada em setembro. Com isso, a participação do spread na taxa de juros de mercado cresceu para 70,8% – a maior registrada desde 2000. No crédito para empresas, o spread atingiu 18,3 pontos porcentuais, com alta de 25% ante os 14,5 pontos em setembro. Para a pessoa física, a alta foi de 17% , para 45 pontos.
Entre os fatores que compõem o spread estão a cunha fiscal formada por impostos e compulsórios, o risco de inadimplência da operação de empréstimo, as despesas administrativas e a margem de lucro das instituições. “Com exceção do lucro, nenhum deles justifica tamanha elevação nos últimos meses”, diz Roriz Coelho. Já o custo do dinheiro financiado, que é determinado pela Selic, recuou de 13,99% para 12,63%, entre os dois períodos.
Ao longo de 2008, os brasileiros pagaram spread médio de 26,6 pontos porcentuais, somado ao custo do juro básico, para contrair empréstimos. A média praticada em outros 42 países pesquisados, que representam mais de 90% do PIB mundial, é de 3 pontos porcentuais. No Brasil ele é, portanto, quase oito vezes maior do que o dos nossos principais concorrentes. Se o País seguisse o padrão internacional de definição de spread em relação a renda per capita, seu valor deveria ser de apenas 5 pontos porcentuais.
Segundo Roriz Coelho, o elevado custo de capital é um dos fatores que mais prejudicam a competitividade brasileira na disputa por novos investimentos produtivos e manutenção dos projetos já aprovados. A disputa fica ainda mais acirrada em momentos críticos como o atual, em que falta crédito no mundo.
“Estamos disputando investimentos com o mundo inteiro”, diz Roriz Coelho. “Se não tem crédito no mundo, e a empresa dispõe de pouco capital próprio, ela vai para um lugar onde precise de menos dinheiro para introduzir e tocar o negócio.”
Outra consequência da alta do spread foi a desaceleração na expansão da oferta de crédito. Para empresas, o crescimento médio, que chegou a atingir 12,7% ao mês no terceiro trimestre de 2008, caiu para 9,3% no último trimestre. Além disso, somado aos demais efeitos da crise, a alta do custo financeiro contribuiu para a redução da atividade econômica. Tanto que o emprego e a produção industrial caíram 0,7% e 7,5%, respectivamente, de setembro para novembro.