Confederação Nacional dos Trabalhadores Metalúrgicos

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A Crise Econômica do Século XXI

Panorama Geral

Há uma máxima popular que diz: quando o débito é pequeno, a preocupação é do devedor, mas quando o débito é muito grande, a preocupação passa a ser do credor. Suponha que você seja proprietário de uma empresa fornecedora de insumos ou matéria-prima para uma empresa muito maior que a sua e as duplicatas que você emitiu contra esse seu cliente não estão sendo pagas, isto é, você passa a não receber por aquilo que vendeu. Você, como credor, começa a se preocupar e suspeitar que seu cliente está com problemas de caixa ou, pior ainda, insolvente. Se ele, que é grande, não está pagando porque pode estar quebrado, o que será de sua empresa, menor? Sem dúvida, irá quebrar antes. Se isso ocorrer, você deixará de honrar compromissos com seus fornecedores, estes, por sua vez, com os deles e assim por diante. Está colocada a crise. Quando isso acontece em determinado setor ou segmento produtivo, as coisas param por aí. Não há grandes solavancos na economia por causa disso. Você e outros vão amargar certos prejuízos, vão despedir parte dos funcionários que, para a taxa de desemprego da economia, será irrelevante, ou seja, não fará muita diferença e a história se encerra por aí. Em outras palavras, não houve, a partir desse episódio, uma crise sistêmica, que colocasse em risco toda a economia. Tanto é verdade que empresas iniciam e encerram suas atividades todos os dias em todo o mundo e a vida continua.

Entretanto, os fatos que assistimos nesses dias não se restringem a segmentos isolados da economia, mas, sim, ao sistema econômico como um todo, e está abalando o capitalismo com o qual estamos habituados a conviver nos últimos 50 ou 60 anos. Não significa seu fim e qualquer afirmação nesse sentido seria falsa e pretensiosa, mesmo porque, não há alternativas à disposição. O que se pode aventar, a partir desses eventos, é que a organização e funcionamento do mercado financeiro deverão ser alterados. Esse sistema extremamente desregulamentado de hoje cederá espaço para um modelo mais regulamentado, mais vigiado e mais fiscalizado, uma vez que o excesso de liberdade acabou criando uma situação de descontrole que, por sua vez, levou o sistema ao colapso. Mas só teremos certeza dessas modificações e regulamentações ao final de toda a tragédia, quando as coisas voltarem ao normal.

Não nos esqueçamos que essa não é a primeira grande crise. Em 1929, após a conhecida “quebra” da Bolsa de Valores de Nova York, o mundo enfrentou uma terrível recessão, com queda de renda e altas taxas de desemprego. A recuperação só veio ao final da década de 1930, infelizmente, com a eclosão da Segunda Grande Guerra Mundial. Claro que hoje a saída será diferente, mas o capitalismo, pela sua própria natureza, esta sujeito a crises, a ciclos, nos quais a atividade econômica é mais ou menos intensa.

O sistema capitalista se caracteriza por uma dinâmica cujo objetivo é o lucro. É isso que lhe dá vida. Produzir, vender e lucrar, é por aí que as coisas seguem. Um instrumento fundamental para que essa lógica se perpetue é o crédito. Talvez seja mais fácil concebermos um sistema capitalista sem dinheiro do que sem crédito. O crédito é o motor que move todas as engrenagens e está presente em todos os segmentos: são empresas recebendo e dando crédito a outras empresas; empresas concedendo crédito a seus clientes; banco financiando operações das empresas; bancos concedendo empréstimos a outros bancos; consumidores contraindo financiamento em bancos; o setor público concedendo e contraindo crédito junto ao setor privado, enfim, o crédito é parte da natureza das relações comerciais e financeiras. É importante lembrar, também, que todas essas operações não estão restritas a fronteiras nacionais; elas criam redes de intercâmbio e relações financeiras e econômicas entre os países de todo o mundo. Envolvido e envolvendo tudo isso está o sistema financeiro que, pela sua integração, podemos entendê-lo como mundial.

A gênese da crise que ora se espalha por todos os países é financeira, com ninho no mercado imobiliário e localizada nos Estados Unidos da América. Na incansável busca do lucro, de sua valorização, o capital meteu os pés pelas mãos. Emprestou-se dinheiro, concedeu-se crédito a quem não possuía condições de pagar. O volume de crédito foi tanto que a preocupação passou a ser do credor, não do devedor. E com razão, pois os credores quebraram. Aos devedores restou a devolução do imóvel adquirido. Mas, o que fazer com esses imóveis se, agora, já não há compradores e seus preços estão bem menores que os pagos quando foram adquiridos? Bem, o “mico” ficou com os bancos que, pela legislação norte-americana, podem emprestar cerca de 12 vezes os seus depósitos. É o que se costuma chamar de alavancagem bancária. Para cada US$ 1,00 depositado, o banco pode emprestar US$ 12,00. De onde ele tira esses US$ 11,00? De nenhum lugar, é uma moeda fictícia, é o crédito. Se todos pagam direitinho, a pirâmide continua em pé e crescendo, mas, se não pagam, ela desaba.

E desabou de forma espetacular, com grandes bancos ao redor do mundo, localizados em economias tidas como sólidas – Europa, Estados Unidos, Canadá, Japão – indo à falência, isto é, não tendo recursos para fazer frente às suas obrigações junto a seus correntistas e/ou clientes com aplicações financeiras. Ocorre que o sistema financeiro é o desaguadouro de toda a riqueza que é gerada no setor produtivo. Essa riqueza que chega ao sistema financeiro é multiplicada muitas vezes, gerando créditos e dívidas tanto privadas quanto públicas, utilizando sofisticadas engenharias financeiras que geram “produtos financeiros” comercializados no mercado: swap cambial; contrato a termo; contrato futuro; commercial paper; hedges; derivativos etc. Esses novos termos estão, cada vez mais, se popularizando.

Neste contexto, em que o comando do processo de valorização do capital está no mercado financeiro e não na esfera da produção, o conceito de riqueza torna-se extremamente relativo. Por exemplo, quem adquiriu R$ 15.000,00 de ações da Vale (antiga Vale do Rio Doce – empresa mineradora e exportadora) há quatro anos atrás, assistiu sua incrível valorização, que chegou ao ápice em maio de 2008, valendo cerca de R$ 100.000,00. Ganho aproximado de 550%. Hoje, esses R$ 100.000,00 murcharam para R$ 48.000,00. Em outras palavras, R$ 52.000,00 desapareceram. Quem possuía tais ações ficou mais pobre. Seu ativo (as ações) vale bem menos que há sete meses. A Vale deixou de produzir, de exportar sua produção? Não, em princípio, tudo está normal. Ou seja, não houve essa brutal oscilação no “mundo real”, mas no mundo fictício das finanças as mudanças foram devastadoras. O mesmo pode-se dizer sobre o dólar norte-americano e o ouro, que trilharam caminhos inversos ao das ações, antes desvalorizados, agora, com preços elevados. Ganhou quem tinha dólar e/ou ouro, perdeu quem apostou em ações. O mesmo ocorre com o petróleo que, há pouco mais de três meses, teve o barril cotado a US$ 150,00. Hoje, com a simples ameaça de crise, está custando a metade. O mundo não está consumindo mais ou menos petróleo que há alguns meses atrás. No entanto, seu preço sofre expressiva oscilação. Quem apostou na subida do preço do petróleo no mercado futuro, perdeu, quem apostou em sua baixa, ganhou. Ou seja, é pura especulação.

O que explica tudo isso é a conexão que os mercados de bens reais, de mercadorias e as finanças, estabelecem entre si. E, dada a lógica do capitalismo, não poderia ser diferente. Pensemos em um organismo, o nosso, por exemplo: é possível morrer de um corte ou uma unha encravada? Sim. Se a evolução desses ferimentos for na direção de uma infecção, todo o organismo (o sistema) irá perceber e sentir. O primeiro sintoma, além da dor localizada, é a febre, que se espalha por todo o corpo. Se não atacarmos o problema imediatamente ele deixará de ser local e todo o organismo poderá sucumbir. Bem, por comparação, trata-se de uma crise sistêmica, que pode levar o organismo ao colapso. Um relatório médico poderia, ao final, mencionar que a causa da morte foi o “colapso múltiplo de órgãos”. Voltando à economia, é fato que a contaminação dos subprime (títulos de alto risco, derivados de hipotecas imobiliárias, comercializados no mercado financeiro norte-americano) foi extremamente rápida. De repente, todo mundo entrou em crise e algumas economias já estão à beira da recessão.

Todo o sistema financeiro mundial passou a ter problemas porque bancos norte-americanos emitiram (venderam) papéis financeiros garantidos por esses títulos de alto risco – os subprime – que foram adquiridos por outras instituições financeiras dentro e fora dos Estados Unidos. Os bancos que mais compraram esse tipo de papel ficaram mais expostos ao risco e, no limite, quebraram quando os créditos que lastreavam (garantiam) esses títulos não se concretizaram, ou seja, os mutuários não pagaram suas prestações.

Vamos imaginar, agora, um comerciante que vende grande parte de seus produtos a prazo. Imaginemos, também, para facilitar nosso raciocínio, que as vendas a prazo são realizadas a partir da emissão de Notas Promissórias por parte dos compradores. Assim, o comprador (o cliente) assina as notas, uma para cada vencimento, prometendo pagar, nas datas combinadas, o valor das notas. O comerciante, que precisa de dinheiro, vai ao banco com as tais notas (seus recebíveis) e as negocia, pagando certa taxa de juros. Mas não existe apenas um comerciante fazendo isso, existem milhares, milhões. O sistema bancário, de posse desses papéis, irá negociá-los, tentando multiplicar seus ganhos, criando produtos financeiros estruturados (lastreados) nesses recebíveis. Com isso, os bancos ganham nas duas pontas, quando aceita as Notas Promissórias dos comerciantes e cobra juros e quando emite títulos, (letras de câmbio; Certificado de Depósito Bancário etc) garantidos por essas Notas, e vendem a seus correntistas e investidores.

Se, por acaso, um número expressivo de clientes, que assinaram as Notas Promissórias emitidas pelos comerciantes, não resgatam (pagam) essas Notas, toda a arquitetura (as garantias) da operação vem abaixo e, quem estiver envolvido, e como vimos, os grandes envolvidos são os bancos, que deram dinheiro aos comerciantes e venderam títulos aos seus clientes, prometendo-lhes ganhos financeiros, vão enfrentar graves problemas. Dependendo da extensão e volume das operações, esses bancos se tornarão ilíquidos, ou seja, não poderão honrar os compromissos assumidos. Estão quebrados ou, em termos contábeis, a soma dos ativos mais o patrimônio líquido não cobre seu passivo. Alguns bancos maiores, menos expostos aos riscos dos subprimes ou mais capitalizados, assumem os menores, em operações avalizadas e garantidas pelos bancos centrais ou tesouros nacionais, numa tentativa de evitar a propagação da crise. É esse exatamente o que está ocorrendo nos Estados Unidos e em muitos países europeus.

Essas operações de incorporações e fusões são vitais para que o sistema não se desmantele totalmente. Os bancos operam (emprestam e tomam emprestado dinheiro) entre si. A quebra de um resulta não honrar compromissos com outros e assim sucessivamente: é o “efeito dominó”. Uma pedra caindo derruba todas as outras. O colapso, então, está estabelecido no sistema financeiro. Daí até a contaminação do setor real, o setor produtivo da economia, resta um pequeno passo.

O primeiro contato com a economia real se dá através das Bolsas de Valores, cujos índices começam a despencar pois a cotação (preço) das ações das empresas cai devido ao grande movimento de venda dessas ações. Se todos querem vender ações e poucos querem comprá-las, o preço baixa. Por que isso? Porque em situação de crise aguda, sistêmica como essa, as pessoas entram em pânico e procuram proteção. Saem de uma posição de risco, que são as ações, e aplicam em papéis de renda fixa – geralmente títulos do tesouro- ou, simplesmente, ficam com o dinheiro em caixa, esperando a poeira abaixar. Os bancos, por sua vez, já ameaçados de insolvência e dependendo de ajuda do governo para se estabilizar, reduzem suas ofertas de crédito para o setor produtivo, ocorrendo o que se chama “empoçamento de crédito”. Água (dinheiro) existe, só que não está fluindo, está represada, empoçada. E isso, claro, estrangula o setor produtivo que depende de crédito para capital de giro (compra de matérias primas, pagamento de salários e encargos, compra de energia, pagamento de aluguéis etc.) e investimento. Sem crédito, a economia pára.

O Brasil na Crise

Dois países saíram rapidamente da crise de 1929: o Brasil e a União Soviética. Esta última por razões óbvias: a lógica de sua economia não seguia os padrões capitalistas, portanto, foi pouco afetada. E o Brasil, por volta de 1934, já havia recuperado o padrão de crescimento pré-crise. Isso se deveu às políticas de proteção ao setor cafeeiro que, levada adiante a partir da compra, pelo governo, da produção excedente, juntamente com a desvalorização cambial, protegeu o setor e, como conseqüência, toda a economia, evitando que o desemprego se alastrasse como ocorrera nos Estados Unidos e na Europa.

Bem, hoje nossa economia, felizmente, não depende do café e é muito mais complexa que naquela época. Somos mais integrados, também, a um mundo completamente diferente daquele. Apesar de já importante àquela época, o mercado financeiro global era muito menor que o atual e os instrumentos e as possibilidades de que dispunha, até por razões tecnológicas, eram bem menos diversificados e ágeis que os de hoje em dia. Mas, não nos esqueçamos, éramos e somos um país capitalista que tem intenso intercâmbio comercial, econômico e financeiro com o resto do mundo. Em outras palavras, não somos imunes a crises, pelo contrário, à exceção do episódio de 1929, quando fomos pouco prejudicados, crises mundiais tem nos atingido repetitivamente e de forma profunda. Os quinze anos, compreendidos entre 1980 e 1994, e as crises mexicana, asiática e russa, ocorridas entre 1995 e 1998 atestam a fragilidade da economia brasileira diante das intempéries das finanças mundiais.

Mas o que há de diferente agora? Várias coisas. Sem necessariamente estarem relacionadas em ordem de importância, nossas vantagens ou resistência à crise são:

· Reservas internacionais de cerca de US$ 205 bilhões;

· Sistema financeiro relativamente sólido com bancos pouco alavancados (relação segura entre ativo e empréstimos concedidos);

· Nenhuma exposição de bancos brasileiros aos títulos subprime norte-americanos;

· Setor externo equilibrado com superávits comerciais;

· Dívida externa do setor público, praticamente nula;

· Dívida interna em (com relação ao PIB) declínio;

· Geração de superávits primários pelo setor público;

· Déficit público sendo financiado sem pressões inflacionárias;

· Economia em crescimento;

· Mercado interno aquecido;

· Inflação sob controle;

· Setor produtivo apresentando aumentos de produtividade;

Esse conjunto de indicadores fornece uma perspectiva otimista para a economia brasileira neste cenário conturbado. Dizer que passaremos totalmente incólume pela turbulência é ser excessivamente otimista. Evidente que haverá certo contágio e alguma desaceleração provavelmente aconteça, porém, de maneira e intensidade restritas. Alguns sinais, porém, já foram sentidos e as luzes amarelas já se acenderam.

O primeiro setor a sentir as implicações internas da crise foi o exportador que, de uma hora para outra, viu suas linhas de financiamento tornarem-se escassas e o custo dos ACCs (Adiantamento de Contato de Câmbio) praticamente triplicarem. A medida tomada para sanear o problema foi a redução do percentual dos depósitos (à vista e a prazo) que os bancos devem recolher ao Banco Central, na forma de Depósito Compulsório. Esse expediente aumenta o montante de fundos, em poder dos bancos, para empréstimos e financiamentos. Embora, de início, os bancos deram outro direcionamento a esses recursos – adquiriram papéis do Tesouro Nacional – o governo, em uma segunda tentativa, obrigou-os a direcionar esses recursos para o financiamento de capital de giro para os exportadores.

Mas não foi somente os exportadores de produtos industrializados que sofrem com a escassez de crédito. A agricultura, setor importante para a economia brasileira, tanto no que diz respeito às exportações quanto ao mercado interno, vê a escassez de crédito também como ameaça, na medida em que se aproxima a época de plantio da safra 2008-2009. Setor estratégico, a agricultura necessita de crédito abundante, portanto, o repasse de recursos ao setor, principalmente via Banco do Brasil, não pode sofrer solução de continuidade para que área plantada não venha a ser reduzida. Reduções da oferta de alimentos interferem no abastecimento interno, provocando elevação no valor da cesta básica, prejudicando principalmente as camadas de mais baixa renda. O setor externo da economia também será prejudicado, uma vez que as exportações agrícolas constituem parcela importante das receitas comerciais do país. Em um contexto de baixa liquidez internacional, perda de receita em moeda forte pode trazer enormes riscos para o equilíbrio externo.

O mercado de câmbio também assistiu a uma rápida e expressiva valorização do dólar norte-americano (US$), que passou de uma cotação média de R$ 1,60 entre junho e julho (2008), para cerca de R$ 2,20 na primeira quinzena de outubro. Não ultrapassou essa marca devido às fortes intervenções do Banco Central no mercado, evitando uma excessiva valorização da moeda americana, o que vale dizer, uma desvalorização do Real (R$). Essa súbita alta no dólar norte-americano não encontra explicações nos fatos reais, isto é, num eventual desequilíbrio das contas externas. Pelo contrário, não houve saída líquida de recursos do país. O fluxo cambial, até o dia 26 de setembro foi superavitário em US$ 2,75 bilhões. O déficit financeiro de US$ 3,51 bilhões foi amplamente coberto pelo saldo comercial de US$ 6,26 bilhões.

A sobrevalorização do real é uma questão muito discutida e muitos economistas apontam para o perigo eminente de desequilíbrio externo caso a situação não se reverta, isto é, caso o dólar não se valorize diante do real. O que não pode acontecer, no entanto, é uma valorização abrupta de cerca de 38,0% em tão curto espaço de tempo. Esses movimentos dificultam os negócios das empresas e geram um ambiente especulativo nocivo à economia. Se a valorização do dólar, de um lado, torna mais competitivas nossas exportações, de outro, encarece nossas importações, com sérios reflexos na inflação e, portanto, nos salários. De qualquer forma, as intervenções do Banco Central no mercado de câmbio, a ausência de qualquer pressão real no setor externo que justifique essas fortes flutuações e as medidas que os governos europeus, norte-americanos, japoneses e, mais estritamente, o brasileiro, vêm tomando em relação aos acontecimentos, devem, em curto prazo, estabilizar o mercado cambial. Na semana, iniciada no dia 20 de outubro, a moeda norte-americana já registrava um recuo considerável, sendo contada por volta de R$ 2,00.

Outro indicador que aparece ostensivamente na mídia e, também, fonte de preocupação, é o mercado de capitais, representado pela Bolsa de Valores, no Brasil a Bovespa – Bolsa de Valores do Estado de São Paulo. Pois bem, seguindo a tendência internacional, o índice Bovespa tem apresentado violentas flutuações e, até para evitar o travamento total dos negócios, houve interrupções do pregão em várias oportunidades nas últimas semanas. O mercado de ações é extremamente sensível às oscilações da economia e está sujeito a muitas formas de especulação.

As ações representam uma parcela da empresa. Quem detém a posse de ação de alguma empresa, é proprietário de uma fração dessa empresa. As ações possuem um valor patrimonial e um valor de mercado que, na maioria das vezes estão descolados. O valor patrimonial corresponde a algo mais concreto: ao tamanho da empresa; aos lucros e perspectivas de lucro; ao mercado que ela atua; à seriedade de sua administração; à sua solidez econômico-financeira; à sua história ao longo de sua existência etc. O valor de mercado considera tudo isso e vai além. As ações de empresas sólidas (às vezes até de outras não tão sólidas) ganham vida própria no mercado e são objetos de compra e venda como um ativo qualquer. É nesse mercado, na Bolsa de Valores, que as apostas são feitas em torno dessas ações: se algumas delas são muito procuradas, seus preços aumentam. Se outras não são tão procuradas e, pelo contrário, seus proprietários querem vendê-las, seus preços caem. Em situações de crise, as bolsas tornam-se vulneráveis, pois aqueles que temem que suas ações vão se desvalorizar tentam vendê-las o mais rápido possível. Os especuladores, “velhas raposas”, jogam com a situação, apostando nas oscilações para, com isso, obter lucros. Podem provocar um movimento de queda, período em que adquirem as ações para, depois, vender com lucro quando as cotações voltam a subir. Lembrem-se, nem todos perdem com as oscilações da Bolsa. A regra do mercado é implacável: se alguém perde, outro está ganhando. Nesses momentos de crise, além dos perdedores da Bolsa, perde toda a sociedade, uma vez que o comportamento do mercado de capitais acaba influenciando as decisões de investimento no lado real da economia.

O Produto Interno deve, apenas por reflexos do crescimento deste ano (em torno de 5,0%), garantir um aumento de 2,0% em 2009. Esse “efeito arrasto” deve influenciar a economia até o primeiro semestre do próximo ano, uma projeção de crescimento do PIB de cerca de 3,0% não é descabida. Outros economistas, mais otimistas, falam em crescimento entre 3,5% a 4,5%.

O contágio da economia brasileira virá via desaceleração do crescimento das economias centrais mais abaladas pela crise. O desaquecimento dessas economias deverá reduzir a procura pelas exportações brasileiras e, em certos casos, como o das commodities, já está havendo reduções de preços, com prejuízo para a renda e o emprego. Por outro lado, a desvalorização do real deve compensar em parte esse efeito, uma vez que nossos produtos exportados se tornarão mais acessíveis em dólar. Um crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro, em 2009, de 3,5% representará uma vitória sobre a crise.

O Movimento Sindical e a Crise

O Movimento Sindical deve, agora, olhar para frente. Dado que a maioria das categorias profissionais já fechou seus acordos num cenário ainda não contaminado pela crise, é necessário, daqui para frente, um acompanhamento estreito dos acontecimentos.

A possibilidade, mesmo que leve, do aumento das taxas de desemprego não está descartada, uma vez que as projeções de crescimento da economia não confirmam as performances dos dois anos passados. Esse possível recrudescimento do desemprego pode, eventualmente, vir acompanhado por uma estagnação ou mesmo queda dos salários reais, haja vista um provável repique da inflação devido ao repasse da desvalorização cambial para os preços das mercadorias. Ainda não se sabe, porém, o “tamanho” desse repasse.

Considerando-se o conservadorismo da política monetária do governo, não está descartada uma elevação da taxa básica de juros para conter essa possível elevação de preços, a despeito de a causa dessa elevação não ser o aquecimento da demanda mas, sim, a pressão do câmbio sobre os custos industriais.

Não há dúvida, no entanto, que o setor patronal irá utilizar a crise como um dos principais argumentos contra as reivindicações dos trabalhadores. Isso pode ocorrer imediatamente, nas negociações dos acordos da Participação nos Lucros e Resultados (PLR). Daí a necessidade de informações, não só macroeconômicas, como, principalmente, setoriais.

Como temos assistido, diante do desenrolar dos acontecimentos, a maioria dos setores produtivos, representados por suas entidades de classe, vêm cobrando do governo medidas que atenuem os efeitos da crise. Até este ponto estamos de acordo. Porém, é preciso estar atento quanto a benefícios extras que podem tomar carona nas medidas de ajuda do governo. Nesses casos, ou mesmo em outros menos relevantes, é preciso que haja algum compromisso dos segmentos ou empresas favorecidas quanto à manutenção da renda e emprego dos trabalhadores envolvidos. Não se pode permitir que recursos públicos sejam utilizados no socorro de empresas ou setores empresariais sem que, explicitamente, seja assumido um compromisso com os trabalhadores.

De outro lado, o Movimento Sindical, através das Centrais Sindicais, com assento nos fóruns tripartites instituídos pelo governo, não devem adotar posição passiva diante dos acontecimentos. É necessário, neste momento, uma atuação política propositiva, deixando claro para toda a sociedade, que os trabalhadores e suas entidades representativas sabem da gravidade da situação e desejam cooperar para que os impactos da crise sejam de pouca relevância e passageiro.

Colaboração: Airton Gustavo dos Santos – Técnico do Dieese da CNTM

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