27 fev 2012
Notícias
DCI
BRASÍLIA – Um pouco antes de o Banco Mundial ter divulgado, na semana passada, ranking que coloca o Brasil como o quarto pior país do mundo para se abrir uma empresa, o presidente da Câmara dos Deputados, Marco Maia (PT-RS), começou a discutir com os líderes partidários a criação de um grupo de trabalho para facilitar o ambiente de negócios na sexta maior economia do planeta.
Como objetivo, esse grupo de trabalho terá a missão de “tratar de oportunidades de negócios e como incentivar o empreendedorismo alterando a legislação”, afirma o parlamentar petista em entrevista exclusiva ao jornal DCI, realizada durante audiência concedida ao superintendente do jornal, Antonio Carlos Rios Corral.
“Precisamos desburocratizar o Brasil”, acrescentou o presidente da Câmara dos Deputados.
Metalúrgico que se destacou no movimento sindical do Rio Grande do Sul, Marco Maia apontou que uma comissão foi criada na Casa para discutir, entre outros pontos, a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), considerada ultrapassada pelas entidades empresariais. Maia afirmou ainda que o atual crescimento econômico permite atualizar essa legislação.
“É óbvio que toda vez que conseguimos alcançar um novo patamar, isso permite que haja a flexibilização de algumas proteções que estavam relacionadas às condições de vida anterior”, afirmou.
Maia está em seu terceiro mandato. Em 1984, elegeu-se dirigente do Sindicato dos Metalúrgicos de Canoas.
Em 2001, assumiu a Secretaria de Administração e Recursos Humanos do Rio Grande do Sul. Em 2003, presidiu a Empresa de Trens Urbanos de Porto Alegre S.A. (Trensurb). Foi, ainda, diretor da Regional Sul da Associação Nacional dos Transportes Públicos (ANTP). Em 2009, foi eleito vice-presidente da Câmara. Em 2011, pelo quinto ano consecutivo, foi reconhecido como um dos 100 “Cabeças” do Congresso Nacional pelo Departamento Intersindical de Apoio Parlamentar (DIAP).
DCI: O que o senhor achou do corte de R$ 20 bilhões nas emendas parlamentares?
Marco Maia: Fazem um carnaval em cima do assunto de contingenciamento de recursos do Orçamento, Na verdade, não passa de uma previsão orçamentária. Há uma previsão de quanto vai ser a receita e qual vai ser o gasto. Então o governo só está autorizado a gastar aquilo que está autorizado pelo Congresso, para gastar naquele ano fiscal, no caso específico, no ano de 2012. Mas o governo não pode sair gastando tudo isso no mês de janeiro ou em fevereiro. O governo gasta dentro de uma programação em função daquilo que vai arrecadar, daquilo que vão ser as receitas do governo. No início do ano, ele fica obrigado a contingenciar, a dizer o que será liberado.
DCI: É verdade que cortaram todas as emendas parlamentares?
MM: Vocês imaginam se cortaram todas as emendas parlamentares, se isso fosse verdade, o governo podia esquecer de votar qualquer coisa aqui no Congresso. Então, não é verdade. O governo está fazendo o que faz todo o ano.
DCI: Mas tem de liberar até junho?
MM: Não necessariamente. Esse é outro problema que temos na execução orçamentária, que acontece nos estados e em nível nacional de que você acaba executando de um orçamento para o outro. Então, o Orçamento de 2012, vamos, na verdade, executar e pagar em 2013, 2014, 2015. O Orçamento de 2013, vamos pagar em 2014, 2015, 2016.
DCI: Essa questão do contingenciamento não afeta a relação com o Executivo?
MM: Não afeta e não tem impacto com a relação com o Legislativo. Pois aquilo que foi aprovado e emendado pelo Legislativo, eu não tenho dúvida de que, na medida do possível, será cumprido pelo governo. Este ano, nós introduzimos um novo mecanismo no Orçamento Geral da União, que chamamos de emendas participativas. Foi uma proposta do deputado Arlindo Chinaglia [PT-SP] – que teve a minha concordância -,que reserva no Orçamento algo em torno de R$ 2,5 milhões para que os municípios menores de até 50 mil habitantes fizessem audiências públicas e definissem quais eram as suas prioridades. DCI: A pressão dos parlamentares para a liberação dessas emendas deve aumentar neste ano de eleições municipais?
MM: É natural não somente a pressão dos parlamentares, como a pressão dos prefeitos e vereadores… Por outro lado, é um ano curto para estarmos colocando as contratações desses projetos que têm origem no Orçamento deste ano.
DCI: De modo geral, o que o senhor achou do corte de R$ 55 bilhões?
MM: Demonstra a preocupação do governo em ter certo cuidado com o Orçamento, para não liberar de forma atabalhoada. Demonstra também a preocupação com o ajuste fiscal e com a crise econômica financeira mundial. A crise na Europa ainda não foi superada. Essa instabilidade e essa desconfiança que há no mercado econômico mundial refletem aqui no Brasil e cria incertezas. Então, cortar despesas previstas no Orçamento é uma tentativa de demonstrar que o Brasil está equilibrado, que tem responsabilidade com suas contas públicas, que temos capacidade de pagar nossas dívidas, que vamos produzir um superávit primário que nos dá tranquilidade e estabilidade econômica e financeira. Eu sou um otimista com a situação política e econômica do Brasil. O País vai manter nos próximos anos essa lógica do crescimento, de desenvolvimento, de distribuição de renda que tem sido o motor da nossa economia. Eu li uma reportagem em um jornal do meu estado que, de um lado, me chamou atenção e, de outro, me deixou emocionado. A reportagem dizia que os empresários gaúchos estão buscando contratar a mão de obra dos haitianos. Nós já temos mais de 400 haitianos trabalhando no Rio Grande. E os empresários estão com dificuldade de encontrar mão de obra, pois o trabalhador começa em um dia, no outro ele já consegue algo melhor e sai. Nós já estamos começando a vivenciar uma situação de pleno emprego no Brasil com falta de mão de obra em várias áreas, não somente de nível superior, mas de nível técnico, nas camadas mais populares. Teremos de começar a nos preocupar com a imigração.
DCI: Há poucos dias o Banco Mundial divulgou um relatório sobre o ambiente de negócios no mundo o mostrou que o Brasil é o quarto pior mercado para abrir uma empresa de um ranking de 180 países. Para abrir uma empresa, são necessários 119 dias, aponta o levantamento. O que o Congresso e a Câmara estão fazendo para mudar essa realidade?
MM:Acho que nós ainda vivenciamos um período de muito controle sobre a atividade privada e sobre as iniciativas dos empreendedores do País. Temos uma tendência muito grande ao controle exagerado nas atividades empresariais ou públicas como um todo. Eu acredito que poderemos fazer um belo debate no sentido de desburocratizar e, ao mesmo tempo, incentivar as iniciativas empresariais no nosso País. Até porque essa é uma tendência que vai estar colocada pelo próprio crescimento, esse aquecimento da nossa economia vai levar ao boom de iniciativas de empreendedorismo, de novos negócios. Eu propus uma conversa com os líderes para que a gente constitua nesse semestre um grupo de trabalho na Câmara dos Deputados para tratar das oportunidades de negócios e como incentivar o empreendedorismo alterando a legislação, mas ainda é uma proposta incipiente, que nós devemos trabalhar nos próximos dias com os nossos líderes para tentar colocar em prática. Seria uma comissão especial para tratar desse tema. Embora algumas coisas já tenham sido feitas. No ano passado, votamos o Plano Brasil Maior, que é um conjunto de medidas de incentivo à indústria; votamos o SuperSimples, que altera a lei das micro e pequenas empresas, e isso trouxe alterações na forma de pagamento dos impostos e simplificou as regras para as empresas estarem no Simples. Outro exemplo: o fato de nova legislação ter permitido que as empresas enquadradas no Simples utilizem esse regime de tributação possam exportar o mesmo valor e no mesmo patamar que vendem para dentro do País. Então, já há iniciativas e medidas tomadas na Câmara que dialogam com essa nova realidade do Brasil. O SuperSimples e o Empreendedor Individual, por exemplo, foram propostas do Parlamento. Nós precisamos desburocratizar a existência e a criação de novos empreendimentos no Brasil.
DCI: O grande gargalo, na visão dos empresários, é o excesso de burocracia, especialmente na área trabalhista. O senhor, que vem do movimento sindical, acredita que o Parlamento atual, que tem muitos líderes nessa área, concordaria em discutir esse tema?
MM: Nós temos, primeiramente, de desmistificar a ideia de que temos uma realidade trabalhista perversa que impede o crescimento e desenvolvimento do setor empresarial. Se fizermos um comparativo detalhado com países da Europa ou com o norte dos Estados Unidos e Canadá, vamos ver que a legislação trabalhista lá é muito rígida. É proibida, inclusive, a demissão imotivada. Há salários muito superiores que os salários pagos no Brasil. É uma realidade completamente diferente das condições de vida desses trabalhadores com o Brasil. O País está mudando isso agora e está melhorando muito a qualidade de vida dos seus trabalhadores e está estabelecendo uma condição salarial melhor. É óbvio que toda vez que conseguimos alcançar um novo patamar, isso permite a flexibilização de algumas proteções que estavam relacionadas às condições de vida anterior. É isso que estamos tentando fazer. Eu criei uma câmara de negociação das questões trabalhistas, dentro da Câmara dos Deputados, que já está em funcionamento desde o ano passado e debate todas essas questões trabalhistas. Estão debatendo adequação da Consolidação das Leis do Trabalho à realidade atual, jornada de trabalho, terceirizações, entre outros temas polêmicos. Nós não devemos ter nenhum dogma de que a estrutura brasileira é perversa para a geração de novos empregos e o dogma de que não se deve produzir nenhuma mudança na legislação.
DCI: Quais são as prioridades de votação para este ano, já que é um ano curto por conta das eleições municipais?
MM: É um ano curto, mas é um ano de muito debate aqui no Parlamento. Nós temos o novo Código de Processo Civil, que deve entrar na pauta neste ano. Temos o novo Código Brasileiro de Aeronáutica, que nós queremos discutir também este ano, em março. Temos também a votação do Código Comercial, que está iniciando o debate na Câmara, pois o último é de 1888, é uma iniciativa do deputado Vicente Cândido (PT-SP), isso vai suscitar um belo debate na sociedade brasileira, inclusive, na organização do setor industrial. Nós temos o término da votação do novo Código Florestal, que deve acontecer em 6 ou 7 de março, e depois nós temos muitos temas pontuais, como banda larga nas escolas, novo marco regulatório para a Internet, os royalties do petróleo. Deve estar chegando na Câmara três projetos do Executivo que tratam de mineração, estabelecem os royalties da mineração.
DCI: A tendência do Código Florestal é aprovar a proposta do Senado ou reformular?
MM: A tendência é acatar na grande maioria aquilo que veio do Senado, mas há temas que deverão suscitar debates, inclusive o que trata dos novos projetos para construção de moradias nas cidades é polêmico, tudo que envolve a área urbana é polêmico. A tendência é que se tire tudo que tenha a ver com a área urbana e transfira para um debate posterior e mais aprofundado.
DCI: O Fundo complementar da Previdência dos Servidores Públicos será votado agora?
MM: Nós fizemos um acordo nesta semana de que ele será votado no dia 28 deste mês, talvez concluindo no dia 29, mas eu não posso afirmar que será votado, pois eu já tinha dito ano passado que seria votado na primeira semana de fevereiro. Chegando aqui, os líderes da oposição obstruíram a votação e não houve acordo. O governo também não tinha acordo para votar em sua base. Partidos como o PDT e o PR expressaram de forma muito clara que sentem dificuldades na votação do projeto.
DCI: A questão dos parlamentares quererem participar da indicação de integrantes do Conselho de Ética em razão de serem punidos por decidirem investigar, por exemplo, Fernando Pimentel?
MM: O Conselho de Ética da Presidência da República tem vínculo direto com a presidente, ele está lá para auxiliar a presidente e o Executivo na manutenção da ética nas suas ações em seu trabalho. Então, cabe à presidente Dilma indicar os membros do conselho. Não enxerguei em nenhum momento até agora, nenhuma interferência da presidente no trabalho e nas ações envolvidas pelo Conselho de Ética da Presidência da República. Para mim é uma falsa polêmica, pois tem agora término de mandato e a presidente Dilma, que assumiu o comando do País no ano passado, pode alterar o Conselho da forma como ela bem entender. Não há polêmica e não vejo necessidade de ter interferência do Legislativo.
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