Valor Econômico
Arícia Martins e Sergio Lamucci
De São Paulo
O recuo da renda real e o aperto do crédito afetaram o varejo em outubro, mês no qual o setor apresentou recuo de 0,4% no volume de vendas na comparação com setembro, segundo a Pesquisa Mensal do Comércio (PMC) que considera o segmento ampliado e inclui automóveis e material de construção. Na mesma pesquisa, e sempre considerando os dados livres de influências sazonais, seis dos dez setores pesquisados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) tiveram queda de setembro para outubro.
Economistas consultados pelo Valor consideram que outubro foi o piso da desaceleração do varejo, e a perspectiva para os próximos meses é de recuperação, ainda que moderada. A alta expressiva de licenciamentos de veículos em novembro deve ter puxado o crescimento do varejo ampliado no mês passado, ao passo que a redução do imposto sobre eletrodomésticos da linha branca deve dar um impulso extra para a venda desses produtos neste mês. Nesse cenário, o quarto trimestre deve registrar uma leve alta no consumo das famílias dentro do Produto Interno Bruto (PIB), após a retração de 0,1% no trimestre anterior.
Entre os setores, no segmento de veículos, motos, partes e peças as vendas caíram 2,8% em outubro sobre setembro, descontados os efeitos sazonais. Também houve recuo em segmentos não duráveis, que dependem mais da renda, como tecidos, vestuário e calçados e hiper e supermercados. Para a economista Fernanda Consorte, do Santander, o recuo de 0,3% no rendimento real entre outubro de 2010 e igual mês de 2011 pode ter afetado o consumo desses bens.
No segmento de veículos, o ciclo de alta de juros – já invertido – e o aperto do crédito – em processo de reversão – impactaram as vendas em outubro, afirma Fabio Ramos, da Quest Investimentos. Dados da Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave), contudo, mostraram um resultado bem melhor para novembro, quando os licenciamentos de automóveis e comerciais leves foram 5% maiores do que em outubro. O número, dessazonalizado pela LCA, é o maior avanço mensal nessa base de comparação desde agosto de 2010. Esse resultado deve ajudar o indicador do conjunto do varejo.
Números preliminares das vendas de automóveis em dezembro, porém, não mostram o mesmo ímpeto de novembro, observa Paulo Neves, da LCA. A média dos oito primeiros dias úteis ficou 13% menor que no mesmo período do mês anterior, diz Neves, ressaltando que o dado não contém ajuste.
Ramos vê sinais de retomada moderada do comércio nos próximos meses, não apostando numa expansão forte no curto prazo. Segundo ele, as medidas tomadas recentemente pelo governo para estimular o consumo, como o desmonte das medidas de restrição ao crédito, podem ser ofuscadas pelo ambiente internacional negativo. “Diminuir amarras para o crédito não quer dizer que ele vai aumentar. A segurança dos bancos não aumentou e as famílias não têm mais o mesmo ímpeto para contrair empréstimos novos.”
Ramos espera alta de 0,5% nas vendas do varejo em novembro sobre outubro, projeção igual à de Fernanda, do Santander. A economista-chefe da Rosenberg & Associados, Thaís Marzola Zara, também acredita em recuperação do varejo ampliado em novembro, observando que o Índice de Atividade do Comércio da Serasa Experian teve um bom resultado, avançando 1,5% sobre outubro, na série livre de influências sazonais.
Para dezembro, ainda não há estimativas fechadas, mas as perspectivas para as vendas de eletrodomésticos ficaram mais promissoras, devido à redução de Impostos sobre Produtos Industrializados (IPI) para a linha branca. “Ainda que o efeito sobre os preços não seja significativo, há um impacto psicológico”, afirma Thaís.
Um ritmo mais acelerado de crescimento nas vendas, contudo, deve demorar mais alguns meses para se materializar, quando se sentirem sobre a atividade os efeitos defasados da queda dos juros e do desmonte das medidas de restrição ao crédito. Fernanda, do Santander, destaca o impacto favorável que deverá ter sobre a renda o aumento de cerca de 14% do salário mínimo, no início de 2012.
O economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale, traça um quadro mais pessimista, considerando que o agravamento do cenário externo tem um peso expressivo na piora do desempenho do comércio. Para ele, o recuo nas vendas do varejo ampliado entre setembro e outubro indica uma “desaceleração significativa”, mais influenciada pelo cenário externo negativo do que por políticas econômicas contracionistas adotadas no fim de 2010 e início de 2011.
Vale espera um ritmo mais vigoroso de crescimento das vendas somente a partir do segundo semestre de 2012, mas condiciona a retomada a um ambiente mais tranquilizador na Europa. Após os dados de outubro, ele deve revisar ligeiramente para baixo sua projeção de 6,7% para a expansão do varejo em 2011. Neves e Thaís estimam alta de 6,5% para o varejo restrito – como a maior parte dos analistas, não fazem previsões para o ampliado.