Confederação Nacional dos Trabalhadores Metalúrgicos

Política

Esquerda se apropria de data do golpe de 1964

Movimentos sociais convocam grande “barulhaço” contra Bolsonaro em dia que marca o início da ditadura militar, há 56 anos; e ato em defesa de intervenção das Forças Armadas perde força

Por Cristian Klein e Carolina Freitas — Do Rio e São Paulo
Valor Econômico – 31 de março de 2020

Em meio à epidemia do novo coronavírus, movimentos sociais de esquerda pretendem se apropriar hoje de uma data emblemática para a direita representada pelo presidente Jair Bolsonaro e promover panelaços e barulhaços, às 20h30, ainda mais fortes do que aqueles que já vêm sendo realizados pelo país há 13 noites consecutivas. O 31 de março – que marca

O 31 de março – que marca o início da ditadura instaurada a partir de 1964 – já estava sendo reservado por grupos bolsonaristas radicais para protestos em frente a quarteis tendo como pauta a intervenção militar, com o fechamento do Congresso e do Supremo Tribunal Federal (STF). Mas, com o avanço da covid-19 e a decretação de medidas que proíbem atividades públicas, a manifestação perdeu fôlego e viu a oposição aumentar pelas janelas de casas e apartamentos.

O protesto da esquerda é uma resposta à campanha lançada pelo governo federal “O Brasil não pode parar” e às ações de Bolsonaro contra o distanciamento social – medida de prevenção à disseminação do coronavírus. O mote do “barulhaço” ou “panelaço” de hoje é “O Brasil precisa parar Bolsonaro”. Além de fazer barulho, as lideranças sugerem que as pessoas afixem cartazes, placas e faixas nas janelas pedindo seriedade a Bolsonaro para tratar da pandemia. A covid-19 matou 159 pessoas no Brasil e 37 mil no mundo.

“Já que Bolsonaro segue afrontando as recomendações dos órgãos de controle sanitário, vamos manifestar nossa indignação na data que ele mais gosta de celebrar: 31 de março, dia do golpe militar de 1964”, disse ao Valor o presidente nacional do Psol, Juliano Medeiros. O dirigente ressalva que apoia os atos, mas que eles são iniciativa de movimentos sociais.

Lideram a convocatória as frentes Povo Sem Medo e Brasil Popular, a Central Única dos Trabalhadores (CUT), a Força Sindical e a União Nacional dos Estudantes (UNE). “Os trabalhadores não aguentam mais o presidente irresponsável, que está colocando a vida da nação em risco”, afirma o presidente da Força, Miguel Torres.

O presidente da CUT, Sérgio Nobre, endossa: “Que Bolsonaro renuncie. Se não renunciar, que seja impedido.” Num vídeo publicado em suas redes sociais, o teólogo Leonardo Boff conclamou a população a defender a democracia “violada em 1964” e “nos nossos dias”. “O dia 31 de março é dos direitos, da democracia participativa, de todos os brasileiros”, disse.

Pela direita, os atos em frente a quarteis, convocados há duas semanas, foram desestimulados pelo ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva. Em seu lugar, há chamamento para carreatas. Na mesma linha do ministro, dois deputados federais ligados ao Exército, consultados pelo Valor, disseram que as manifestações em quarteis não eram bem-vindas. “O inimigo número 1 que temos é o coronavírus. Tudo que se promove para reunir pessoas vai contra as orientações do Ministério da Saúde. Não julgo oportuno”, afirma General Peternelli (PSL-SP).

Para General Girão (PSL-RN), “o direito à manifestação pertence ao povo”, mas dessa vez deixou de apoiá-la. “Fui contrário apenas a essa última, pelo risco em virtude de aglomeração de pessoas. Não considero o momento oportuno para isso”, diz o parlamentar, que afirma estar “muito bem” depois de se recuperar da covid-19.

Peternelli lembra que os grupos pró-intervenção militar se mobilizam “há anos”, antes das eleições de 2018, mas que as Forças Armadas “atuam dentro da lei”. Girão afirma que não concorda “com radicalizações da situação política” e não vê “espaço para tal”. “O momento do Brasil é outro. A democracia sempre deve ser preservada”, diz. Em sua opinião, os grupos da direita radical não estão empoderados sob a Presidência de Bolsonaro. “Não acredito que estejam fortalecidos e não há pensamentos dessa natureza dentre aqueles com quem convivo”, diz.

Sobre as comemorações tradicionais do 31 de março pela caserna, Peternelli afirma que no momento “o coronavírus transcende os aspectos políticos e partidários”: “Tem maneiras de comemorar sob muitos aspectos. Mas não vejo como oportuno ficarmos aí tirando o foco daquilo que é fundamental, que é o combate ao coronavírus”.

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